Entrevista/ “A nossa ambição é clara: liderar a próxima geração da medicina”

Helena Freitas, Country Lead da Sanofi Portugal

Como será a saúde daqui a dez anos? Na visão de Helena Freitas, Country Lead da Sanofi Portugal, será mais personalizada, mais tecnológica e mais sustentável. E essa transformação já começou – com Portugal a integrar uma estratégia global que combina ciência, IA e propósito para antecipar as necessidades dos doentes.

Com um legado de inovação e um propósito claro — “perseguir os milagres da ciência para melhorar a vida das pessoas” —, a Sanofi está a redefinir o seu papel na indústria farmacêutica. A nível global, quer posicionar-se como a primeira biofarmacêutica impulsionada pela inteligência artificial (IA) em larga escala. Em Portugal investe fortemente em investigação clínica, em parcerias estratégicas e no acesso equitativo a medicamentos inovadores.

Em entrevista ao Link to Leaders, Helena Freitas, Country Lead da Sanofi Portugal, revela como esta transformação se materializa no contexto nacional, fala do impacto da tecnologia e da medicina personalizada na estratégia da empresa, e partilha a sua visão para o futuro da saúde em Portugal.

A Sanofi tem uma longa história ligada à inovação em saúde. Como descreve o momento atual da empresa, tanto a nível global como em Portugal?

A Sanofi é uma companhia multinacional com uma estratégia global que se concretiza localmente, com impacto direto na vida das pessoas. Vivemos atualmente um momento de transformação estratégica, impulsionado pela ciência, pela inovação e por um forte compromisso com a sustentabilidade e o acesso equitativo à saúde. A nossa ambição é clara: liderar a próxima geração da medicina.

Em Portugal, esta visão global ganha forma através da implementação ativa da nossa estratégia, com foco em áreas terapêuticas críticas, nomeadamente da imunologia, e no acesso às mais recentes terapêuticas e vacinas. Trabalhamos lado a lado com o ecossistema nacional de saúde, assumindo um papel responsável e colaborativo, sempre com o doente no centro.

Na Sanofi, somos movidos por um propósito inspirador: perseguimos os milagres da ciência para melhorar a vida das pessoas. Esta missão orienta cada decisão, cada inovação e cada parceria. A empresa passou por uma profunda modernização, colocando a inovação no centro da sua atuação e adotando um modelo operacional ágil e integrado — “One Sanofi” — que nos permite agir com rapidez e consistência.

Hoje, somos uma biofarmacêutica impulsionada por investigação e desenvolvimento e potenciada por inteligência artificial, com o compromisso de gerar impacto real na vida das pessoas e de promover um crescimento sustentado. Esta transformação é alicerçada por uma cultura de alto desempenho e pertença, ancorada em quatro valores que vivemos diariamente e estão intimamente ligados a novas formas de trabalhar: Ambicionar Mais, Atuar para os Doentes, Ser Ousados e Liderar Juntos.

“Na Sanofi, a inovação tecnológica é mais do que uma ferramenta — é um pilar estratégico que atravessa toda a organização”.

Que papel tem a inovação tecnológica (IA, dados, digital health, etc.) na estratégia da Sanofi atualmente?

Na Sanofi, a inovação tecnológica é mais do que uma ferramenta — é um pilar estratégico que atravessa toda a organização. Com a ambição de se tornar a primeira biofarmacêutica verdadeiramente potenciada por IA à escala global e acelerar a entrega de soluções terapêuticas aos doentes, a empresa já conseguiu reduzir em 50% o tempo entre descoberta e comercialização, e melhorar em 20-30% a identificação de alvos terapêuticos em áreas críticas como imunologia e oncologia.

Esta transformação assenta em três pilares estratégicos: Expert AI, que acelera processos de investigação de semanas para horas; Snackable AI, que democratiza o acesso à tecnologia para os nossos colaboradores; e Generative AI, que elimina tarefas sem valor agregado e nos permite focar onde podemos acrescentar valor. Complementarmente, a Sanofi estabeleceu uma colaboração pioneira com a OpenAI e a Formation Bio — a primeira do género na indústria farmacêutica — e investiu em Centros de Excelência em IA.

Os resultados desta estratégia são visíveis em toda a cadeia de valor: desde a aceleração do desenvolvimento de vacinas mRNA, com a redução do tempo de previsão de nanopartículas lipídicas de meses para dias, até à otimização da cadeia produtiva e dos ensaios clínicos. Ao aplicar IA às capacidades de modelação e simulação de última geração, a Sanofi está a redefinir o paradigma da indústria, no entanto esta transformação não substitui o talento humano — amplifica-o. É a convergência entre ciência biológica e tecnologia digital que nos permite cumprir a nossa missão: inovar com propósito e melhorar vidas com impacto real.

Pode partilhar alguns exemplos concretos de soluções inovadoras que estejam a ser desenvolvidas ou aplicadas em Portugal?

As nossas parcerias estratégicas globais em IA (como Formation Bio, OpenAI, Owkin, BioMap, Insilico Medicine, Exscientia) aceleram a descoberta e desenvolvimento de medicamentos, otimizam ensaios clínicos e compreendem dados biológicos complexos. Em Portugal, isso significa acesso mais rápido a medicamentos inovadores tanto para os doentes como para os investigadores.

A nível nacional a nossa inovação traduz-se acima de tudo em inovação clínica e parcerias estratégicas, com foco em áreas terapêuticas críticas como imunologia, doenças raras, vacinas e oncologia. Atualmente, temos 22 ensaios clínicos ativos a decorrer, em colaboração com 87 centros e 254 investigadores, envolvendo 85 doentes em estudos ativos. Nos últimos três anos, a empresa investiu 5,66 milhões de euros em investigação clínica no país.

No campo da investigação básica, renovamos a nossa parceria com o iBET, no âmbito do Centro de Excelência de mRNA, o que posiciona Portugal como um polo relevante na biotecnologia aplicada à saúde. Este projeto, com um investimento acumulado de 7,5 milhões de euros, visa acelerar o desenvolvimento de vacinas de última geração, reforçando a capacidade científica nacional.

Além disso, as competências de última geração, incluindo IA, chegam a todas as filiais do mundo em termos de desenho dos nossos planos de negócio, gestão e otimização de stocks, proporcionando previsões mais precisas e insights mais rápidos e uma alocação estratégica de recursos que se traduz numa entrega mais rápida e eficiente de medicamentos e vacinas inovadores às pessoas que deles necessitam em todo o mundo.

“Acreditamos que o futuro da saúde passa por entregar o tratamento certo, ao doente certo, no momento certo, com base no seu perfil biológico e contexto clínico”.

A medicina personalizada está a ganhar cada vez mais tração. Como é que a Sanofi está a integrar esta abordagem nos seus programas de investigação e desenvolvimento?

A medicina personalizada representa uma das transformações mais promissoras da ciência médica moderna. Acreditamos que o futuro da saúde passa por entregar o tratamento certo, ao doente certo, no momento certo, com base no seu perfil biológico e contexto clínico.

Estamos a integrar esta abordagem de forma transversal, desde a descoberta até à comercialização. Através de plataformas avançadas de inteligência artificial e machine learning, conseguimos identificar biomarcadores específicos, segmentar subpopulações de doentes e desenhar ensaios clínicos mais direcionados e eficazes. Esta capacidade já nos permitiu, por exemplo, reduzir em 50% o tempo de design de vacinas baseadas em mRNA, graças ao modelo CodonBERT, treinado com mais de 10 milhões de sequências genéticas

A nossa estratégia de medicina personalizada é particularmente visível nas áreas de imunologia, oncologia e doenças raras, onde a compreensão profunda do sistema imunitário permite desenvolver terapias altamente específicas. Em 2023, os nossos motores de descoberta baseados em IA identificaram sete novos alvos terapêuticos em apenas um ano — um avanço que, em ciclos tradicionais, levaria vários anos a alcançar.

A medicina personalizada não é apenas uma evolução científica — é uma mudança de paradigma na forma como cuidamos das pessoas.

Como se prepara a Sanofi para atrair e reter talento qualificado numa altura em que o setor da saúde e tecnologia está em profunda transformação?

A transformação do setor da saúde é uma oportunidade estratégica para nos afirmarmos como uma companhia de eleição para trabalhar. Hoje, a maioria das pessoas procura mais do que um trabalho, procura uma experiência com propósito e um ambiente de trabalho flexível colaborativo que equilibre a sua vida pessoal e profissional. Desta forma, aliamos desenvolvimento a uma política de empoderamento e responsabilidade onde cada uma das nossas pessoas tem a possibilidade de “Take the Lead” — liderando, a partir da sua função, com coragem, colaboração e foco no impacto.

Vivemos os nossos valores no dia a dia: ambicionar mais, agir com ousadia, colocar os doentes no centro e liderar em conjunto. Investimos no desenvolvimento contínuo (upskilling/reskilling em digital, IA e liderança), em oportunidades de carreira globais e locais, e em experiências de trabalho significativas, com autonomia, reconhecimento e crescimento. Num contexto de grande volatilidade e transformação, a nossa proposta de valor combina inovação, propósito e cultura — fatores decisivos para atrair e reter os melhores.

“A inovação em saúde deve ser avaliada pela sua capacidade de melhorar a qualidade de vida das pessoas, gerar eficiências no sistema de saúde e reduzir a sobrecarga dos serviços (…)”.

Como imagina a saúde em Portugal nos próximos 5-10 anos?

As perspetivas para o setor da saúde em Portugal nos próximos anos apontam para um crescimento moderado, mas sustentado, com foco em três eixos estratégicos: inovação terapêutica, transformação digital e sustentabilidade ambiental e económica. Num contexto marcado por desafios demográficos e financeiros, é essencial adotar uma visão de futuro que valorize a inovação não apenas pelo seu custo imediato, mas pelo seu valor terapêutico a longo prazo. A inovação em saúde deve ser avaliada pela sua capacidade de melhorar a qualidade de vida das pessoas, gerar eficiências no sistema de saúde e reduzir a sobrecarga dos serviços, otimizando recursos humanos e económicos. Para isso, é urgente rever os modelos de avaliação das tecnologias de saúde e reduzir os tempos de acesso a medicamentos inovadores, que continuam acima da média europeia.

A sustentabilidade do próprio sistema de saúde continua a ser um desafio central. Apesar do aumento global da despesa em saúde, a parte dedicada ao medicamento permanece inalterada desde 2010, representando apenas 6,5% do PIB per capita — um valor significativamente abaixo da média europeia. Este subfinanciamento compromete a capacidade de resposta do SNS e limita o acesso equitativo à inovação.

A transformação digital tem avançado de forma transversal no setor da saúde, mas continua a carecer de dados clínicos consistentes, interoperáveis e seguros. A ausência de registos de saúde estruturados e credíveis dificulta a análise em tempo real e a tomada de decisões clínicas e políticas mais eficazes. A criação de bases de dados robustas e a sua integração nos sistemas de saúde são fundamentais para acelerar a inovação e melhorar os resultados em saúde.

Paralelamente, a sustentabilidade ambiental assume um papel cada vez mais relevante. O setor da saúde é responsável por cerca de 4,8% das emissões globais de gases com efeito de estufa, o que exige uma resposta urgente e coordenada. Há uma tendência crescente para integrar práticas sustentáveis na saúde, a Sanofi por exemplo tem apostado em medidas concretas como a redução do uso de plásticos, o ecodesign de embalagens e a otimização logística. Temos também a ambiciosa meta de atingir a neutralidade carbónica até 2030 e estamos a colaborar com as autoridades portuguesas com vista a avançar para um novo modelo de aquisições públicas mais sustentável, que inclua previsões mais rigorosas, redução de devoluções e eliminação de materiais desnecessários.

A Sanofi tem assumido um papel ativo na promoção de soluções inovadoras e sustentáveis, e mantendo total disponibilidade para colaborar com os seus parceiros e autoridades. O objetivo é claro: construir um futuro mais saudável, sustentável e equitativo para todos.

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