Relatório revela falhas na aplicação dos direitos humanos em Portugal

Um relatório da Plataforma de Direitos Humanos pretende alertar “para a fragilidade dos compromissos políticos perante o crescimento do populismo e da desinformação”.
As discrepâncias entre a legislação e a realidade e as falhas estruturais em relação ao cumprimento dos Direitos Humanos em Portugal são destacadas num relatório da Plataforma de Direitos Humanos (PDH).
O relatório “Entre o Compromisso e a Realidade — Direitos Humanos em Portugal” “é um apelo objetivo à ação e à responsabilidade coletiva. É tempo de deixar de falar de direitos humanos como um ideal e começar a tratá-los como política pública efetiva e quotidiana”, indica a direção da plataforma num comunicado.
Abordando áreas como a migração, igualdade de género, direitos das mulheres, das pessoas com deficiência e das pessoas LGBTI+, bem como o direito “à alimentação e nutrição adequadas”, o estudo pretende alertar “para a fragilidade dos compromissos políticos perante o crescimento do populismo e da desinformação” e “reforça a urgência de uma narrativa pública coerente, assente em políticas sustentáveis e integradoras”.
Aponta também recomendações “para enfrentar bloqueios legislativos, administrativos e sociais que continuam a afetar milhares de pessoas”, ou seja, “para uma democracia mais justa, inclusiva e eficaz“, refere a PDH, presidida por uma representante da Amnistia Internacional Portugal.
Em relação às pessoas migrantes e aos requerentes de asilo, o relatório identifica “entraves legais e administrativos persistentes (…), com destaque para as falhas no reagrupamento familiar e na emissão de documentos essenciais”.
Recomenda, a propósito, que seja tornada “obrigatória a consulta a pessoas refugiadas na formulação de políticas públicas que lhes digam respeito, garantindo a sua participação ativa nos processos de decisão”.
O “acesso rápido” ao número de identificação de Segurança Social (NISS) e ao número de identificação fiscal (NIF), que considera “fundamentais para a integração social e profissional”, e o reforço da assistência jurídica são também defendidos no estudo, que sublinha “a importância de aumentar o financiamento destinado à integração e acolhimento e propõe a adoção de um modelo de acolhimento descentralizado, com forte envolvimento das organizações não-governamentais, mais próximo das realidades locais e das necessidades específicas das pessoas migrantes e refugiadas”.
“As pessoas LGBTI+ continuam a enfrentar invisibilidade e discriminação, nomeadamente no acesso aos cuidados de saúde”, considera a PDH, que recomenda o reconhecimento legal das identidades não binárias e defende a criação de uma lei-quadro antidiscriminação, propondo “o reforço de campanhas de sensibilização e programas de formação dirigidos a profissionais dos setores da saúde, educação e justiça, de modo a combater preconceitos e garantir um atendimento digno e informado”.
No caso das mulheres, indica-se continuarem a existir “falhas significativas na resposta aos direitos das mulheres, como no acesso à saúde sexual e reprodutiva, na igualdade de género e na luta contra a violência de género”, referindo-se obstáculos no acesso à interrupção voluntária da gravidez e “barreiras no acesso ao apoio judiciário, à integração social e na progressão das suas carreiras, com desigualdades salariais persistentes”.
A plataforma diz ser “urgente implementar programas de prevenção primária no âmbito das infeções sexualmente transmissíveis, assédio e violência sexual”, considerando “essencial promover reformas legislativas e operacionais para garantir uma igualdade de género efetiva”.
“Falhas graves” foram também encontradas nas acessibilidades físicas e comunicacionais das pessoas com deficiência, cuja autonomia e autodeterminação “continuam a ser subvalorizadas”, segundo o comunicado, que assinala “a necessidade de uma mudança estrutural” para garantir “o respeito pelos direitos humanos, pela dignidade e pela plena inclusão destas pessoas na sociedade”.
A PDH reconhece o Direito Humano à Alimentação e Nutrição Adequadas, “como um elemento central para a saúde, a justiça social e a dignidade humana”, defendendo que seja integrado “de forma explícita na Constituição, garantindo o seu reconhecimento legal e proteção plena”.
Sugere neste caso “a criação de um plano estratégico nacional para erradicar a insegurança alimentar, que afeta milhares de pessoas em Portugal, muitas das quais fora dos critérios tradicionais de pobreza”, defendendo o apoio à agricultura familiar e apelando à promoção da literacia alimentar.
Integram a plataforma, além da AI Portugal, a 4Change — Cooperativa Cultural de Solidariedade Social, Academia Cidadã, Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, Conselho Português para os Refugiados, ARRISCA — Associação Regional de Reabilitação e Integração Sociocultural dos Açores, Omnis Factum, FENACERCI, Graal — Associação de caráter social e cultural, ILGA Portugal e QUERCUS — Associação de Conservação da Natureza, entre outras organizações.