Entrevista/ “Orgulhamo-nos de, até ao momento, não termos reduzido ordenados nem equipas”
“O Governo deverá perceber que os hotéis são locais seguros e que, como é óbvio, são os primeiros interessados em garantir o rigoroso cumprimento das regras de contenção da pandemia. Contudo, há que lembrar que o nosso produto não é `stockável´ e, por isso, o que não vendemos hoje já não é vendável”, defendeu Helena Ferreira, proprietária do Hotel do Sado Business & Nature, em entrevista ao Link To Leaders.
Helena Ferreira, uma das primeiras mulheres a gerir um hotel em Portugal, deixou para trás uma carreira como auditora/consultora e prosseguiu um sonho do seu pai. Começou a trabalhar aos 21 anos na Delloite. Hoje, está à frente do Hotel do Sado Business & Nature que esteve sempre a funcionar desde o início da pandemia, acolhendo vários profissionais que estão na linha da frente do combate à Covid-19: equipas médicas, forças de segurança e profissionais dos mais diversos setores de atividade da economia.
Durante este período, a adoção e o reforço de medidas de higiene e limpeza para garantir a segurança dos hóspedes e funcionários valeram à unidade hoteleira o selo Clean&Safe, atribuído pelo Turismo de Portugal.
Ao Link To Leaders, Helena Ferreira garante que tem concentrado todos os esforços para não baixar os braços aos desafios: “o maior desafio é sem dúvida sermos uma unidade isolada, que não integra cadeias de nome, o que implica a necessidade de estarmos permanentemente a inovar e de termos sempre novidades, para que o mercado nos veja como referência”.
De que forma o Hotel do Sado foi afetado pela pandemia?
Como todos os negócios na área do turismo, o nosso negócio ressentiu-se profundamente, como resultado das limitações de circulação e consequente redução dos mercados de turismo em todo o mundo. A procura reduziu drasticamente. A esta situação concreta, já por si complexa, juntou-se alguma falta de clareza de algumas das medidas que têm sido impostas pelas autoridades competentes.
Estiveram sempre de portas abertas durante o estado de emergência? Como se reinventaram?
Estivemos sempre de portas abertas. Numa fase inicial, optámos por contribuir da melhor forma que podemos, pelo menos para tentar minorar os efeitos da pandemia, ao receber os profissionais de saúde e os profissionais diversos (por exemplo de forças de segurança) que estavam deslocados na região. Esta opção revelou-se decisiva não só no cumprimento do objetivo a que nos propusemos, como na preparação da equipa para o cumprimento das medidas de segurança associadas ao momento que vivemos.
Logo no primeiro impacto, quando a incerteza e o medo imperavam, tivemos de ser rápidos na implementação das novas medidas de higiene e segurança e na formação à equipa, e esta experiência foi impactante e decisiva na forma como pudemos levar a cabo a nossa atividade nos meses seguintes.
“Negociámos com alguns fornecedores a suspensão dos serviços no período de confinamento, mas orgulhamo-nos de, até ao momento, não termos reduzido ordenados nem equipas”.
Nessa fase demitiram, negociaram contrato ou reduziram salários?
Negociámos com alguns fornecedores a suspensão dos serviços no período de confinamento, mas orgulhamo-nos de, até ao momento, não termos reduzido ordenados nem equipas. É um esforço imenso, mas acreditamos profundamente no nosso capital humano!
Nesse contexto, o que assumiu como prioridades em 2020?
Aposta na excelência do serviço de limpeza e desinfeção, por forma a garantir a segurança de quem nos visita e das nossas equipas. O aumento da qualidade e da nossa oferta F&B, com a oferta de novos momentos de gastronomia de assinatura, nomeadamente o brunch de domingo, o que nos permitiu fidelizar clientes e atrair um mercado mais local. E uma aposta na formação das equipas, para melhoria de capacidades e do nível de serviço.
O Turismo está a atravessar um período difícil. Como se gerem – ou como geriu – estes períodos de crise?
É sem dúvida um período difícil, que nos obriga a uma grande capacidade de adaptação. Apostámos no mercado nacional e mercado próximos em termos geográficos, com campanhas associadas não ao preço, mas a uma oferta de qualidade, com serviços complementares que fizessem sentido em cada momento que vivemos. Mesmo ao nível da gastronomia, ajustámos alguma da nossa oferta ao mercado local.
Das medidas apresentadas pelo Governo para minimizar os efeitos da Covid-19, a quais é que recorreu?
Recorremos ao lay-off simplificado e ao apoio à retoma da economia.
Quantos colaboradores passaram para o regime de ‘lay -off’ simplificado?
Com exceção das equipas de receção e manutenção, cerca de 70% das restantes equipas estiveram no regime de lay-off simplificado.
Qual a sua previsão de faturação para este ano?
Este ano, é estimado termos uma redução de 50% em relação à faturação do ano anterior.
“Apesar de termos 66 quartos e salas de reunião e banquetes com capacidade para 300 pessoas, temos uma filosofia muito familiar na gestão do hotel”.
Como se diferenciam de outras unidades hoteleiras no mesmo segmento de mercado?
Nós costumamos dizer que somos um turismo de habitação um pouco maior. Apesar de termos 66 quartos e salas de reunião e banquetes com capacidade para 300 pessoas, temos uma filosofia muito familiar na gestão do hotel. A nossa equipa é o espelho desta filosofia e isso reflete-se na qualidade do atendimento e dos nossos serviços.
A decoração do Hotel também transmite essa mesma filosofia – um espaço “cosy” onde o cliente se sente em casa. Também na área de restauração fizemos uma aposta forte que permitiu uma oferta gastronómica moderna e inovadora, mas que valoriza sempre os sabores tradicionais da nossa região – uma verdadeira experiência única e de enorme qualidade.
Apostámos também num acompanhamento 360 do nosso cliente, com um serviço de welcome desk que, em função das preferências do cliente, sugere as melhores opções de atividades para cada cliente, para usufuir ao máximo a experiência no hotel e na região.
Por outro lado, nos últimos três anos temos levado a cabo fortes investimentos na área do turismo acessível. O hotel foi totalmente remodelado, com oferta de 17 quartos acessíveis e todos os serviços complementares – o que nos posicionou como caso de sucesso e nos valeu a menção ao nível do Turismo de Portugal. Um caminho que já vinha a ser traçado com outras ofertas, nomeadamente o termos sido o primeiro Hotel Allergy Friendly de Portugal, que nos capacita para receber clientes com todo o tipo de alergias – desde as respiratórias às alimentares.
Analisando o panorama da hotelaria nacional e do tecido empresarial, é possível que nem todos os hotéis tenham capacidade para sobreviver a esta crise?
Certamente que existirão muitas unidades com fortes dificuldades. O Governo deverá perceber que os hotéis são locais seguros e que, como é óbvio, são os primeiros interessados em garantir o rigoroso cumprimento das regras de contenção da pandemia. Contudo, há que lembrar que o nosso produto não é “stockável” e, por isso, o que não vendemos hoje já não é vendável.
A diversidade e complexidade de medidas que são impostas todas as semanas, muitas delas de difícil compreensão e implementação pelos hotéis e pelo público em geral, afetam o negócio das poucas unidades hoteleiras e os seus colaboradores que lutam diariamente para se manterem abertos e garantirem os postos de trabalho. Muitas unidades não vão conseguir recuperar desta situação, certamente!
É um mercado que exige investimentos elevados, quer em instalações e equipamentos, quer a nível de recursos humanos. Vamos desejar que haja mais clareza e objetividade na informação passada pelas autoridades competentes, por forma a não prejudicar o esforço e empenho da classe hoteleira e também que a situação recupere rápido e que o mercado esteja sequioso de passear e viajar, para compensar esta fase.
“Creio que o aumento na qualidade da oferta hoteleira tem criado uma diferenciação face às restantes ofertas. No entanto, em situação normal de mercado, existe espaço para todas as opções de oferta e só ajuda à promoção do turismo”.
Como é que o modelo de negócio, em concreto na hotelaria, se tem vindo a alterar, por exemplo, com o surgimento de novas formas de alojamento?
Creio que o aumento na qualidade da oferta hoteleira tem criado uma diferenciação face às restantes ofertas. No entanto, em situação normal de mercado, existe espaço para todas as opções de oferta e só ajuda à promoção do turismo.
Quais os desafios que o setor da hotelaria enfrenta em Portugal?
Continuar o trajeto que estava a fazer no sentido do turismo de qualidade; não se deixar tentar pelo negócio do “preço” em detrimento da procura dos mercados de qualidade que a prazo nos trazem um maior retorno. Foi um caminho iniciado com sucesso e que não podemos deixar cair!
Quais têm sido os seus principais desafios enquanto CEO do Hotel do Sado?
O maior desafio é sem dúvida sermos uma unidade isolada, que não integra cadeias de nome, o que implica a necessidade de estarmos permanentemente a inovar e de termos sempre novidades, para que o mercado nos veja como referência.
Qual acredita ser o papel fundamental de um líder na organização?
A mobilização das equipas no sentido de consolidação de cultura e de valores da organização.








