Opinião

Velocidade e volume

Carlos Rocha, administrador do Banco de Cabo Verde

No ano passado comprei um portátil com um processador Intel Core i5, o que satisfaz as minhas necessidades enquanto utilizador. Mas quem não ficou muito convencido foi o meu filho, pertencente à geração conectada, pois para ele eu deveria ter comprado um Core i7, por ter maior velocidade de processamento.  Para quem não está familiarizado, o processador Core i5 está entre o Core i3 e o Core i7, portanto com uma velocidade razoável.

Sem surpresas, a nossa época passou a ser dominada pela velocidade e, se antes dizíamos que tempo é dinheiro, se calhar hoje corro o risco de dizer que velocidade é dinheiro.

Efetivamente, a velocidade com que as ideias, as tecnologias, os paradigmas, os fenómenos e as modas mudam, é espantoso, sem qualquer precedente na história da humanidade. Vejamos alguns exemplos, que ilustram como as alterações tecnológicas estruturais acontecem numa velocidade sem precedentes, fazendo com que hardware, software, pessoas e organizações fiquem rapidamente ultrapassados.

Não temos ainda a verdadeira dimensão do impacto dessa velocidade na vida das empresas e das pessoas. Por exemplo, vejamos o que se passa com a duração de vida das empresas, uma constatação trazida pelo Presidente da Telefónica espanhola, José María Álvarez-Pallete. Ele recorda que 52% das empresas que, no ano 2000 faziam parte do índice Standard & Poor’s, já desapareceram e que a evolução da tecnologia vai ditar o fim de milhares de empresas nos próximos anos. A duração da vida média de uma empresa passou de 61 anos em 1995 para apenas 17 anos hoje. Ele considera que as empresas tradicionais não estão preparadas para a disrupção tecnológica que está a alterar a realidade laboral e empresarial.

A outra dimensão que chamamos para essa analise é o volume. A quantidade de informação disponível hoje, ao alcance quer de uma criança que saiba pesquisar num tablet, quer do mais qualificado dos profissionais, também não tem comparação na história, graças à evolução tecnológica.

O autor já citado considera que o volume de dados vai multiplicar-se por onze nos próximos anos, assumindo-se como um dos recursos mais valiosos da economia, assim que se democratizar a tecnologia 5G, que deverá multiplicar por cem a atual velocidade da internet. E, mais uma vez, temos o binómio volume/velocidade a ditar as transformações disruptivas.

Falando em termos de negócios, esse binómio volume/velocidade traz vantagens para as empresas, quando pensamos em mercados locais pequenos e na necessidade de alcançar novos consumidores e de unificação de mercados. Se não vejamos: segundo Pallete, o telefone fixo levou 75 anos a atingir os 100 milhões de utilizadores; o telemóvel levou 16 anos; o Facebook 4 anos e 6 meses; e a aplicação Pokemon Go levou apenas 23 dias.

E como é que essas duas dimensões afetam a vida das organizações? Estas são geridas por pessoas (nalguns casos com apoio de algoritmos) e as operações são efetuadas também por pessoas (em alguns casos por robôs ou por algoritmos), que devem perceber a realidade que os rodeia. Até aqui nada de novo. O que passa a ser mais relevante é a introdução dessas duas dimensões no processo de liderança das organizações e de execução das operações: velocidade e volume.

A ausência dessas duas dimensões pode levar a que tenhamos pessoas a desempenharem as suas tarefas com base em premissas, pressupostos, dados, informações e quadro mental já totalmente ultrapassados, tanto ao nível temporal como tecnológico. Significa que basearão toda a sua atuação numa realidade que já estará ultrapassada, devido à velocidade das mudanças.

Mas isso, infelizmente, é a realidade em muitas organizações: lideres e colaboradores com um mindset que não evoluiu ou que evoluiu com uma velocidade inferior ao que deveria. Continuam presos ao passado, não incorporaram a dimensão velocidade no seu processo cognitivo e evolutivo: velocidade de mudanças, velocidade de circulação da informação, velocidade com que as empresas nascem e morrem, velocidade com que se contrata e despede, velocidade com que se compra e vende, velocidade traduzida na viralização de conteúdos.

Quanto à dimensão volume, esta está intimamente ligado à velocidade. Também neste quesito alguns líderes e colaboradores acabam por exercer o seu papel não levando em conta o volume e adequação da informação. Dada a quantidade de informação hoje disponível, é necessário desenvolver capacidades “especiais”, para poder selecionar a informação mais adequada à sua decisão.

Enquanto isso, decida, mas decida rápido.

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Carlos Rocha

Carlos Rocha

Carlos Rocha é economista e atualmente é vogal do Conselho de Finanças Públicas de Cabo Verde e ex-presidente do Fundo de Garantia de Depósitos de Cabo Verde. Foi administrador do Banco de Cabo Verde, onde desempenhou anteriormente diversos cargos de liderança. Entre outras funções, foi administrador executivo da CI - Agência de Promoção de Investimento. Doutorado em Economia Monetária e Estabilização macroeconómica e política monetária em Cabo Verde, pelo Instituto Superior de Economia e Gestão – Lisboa, é mestre em... Ler Mais..

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