Startup Games: O concurso que ajuda o Reino Unido a encontrar os melhores empreendedores

Depois de ter passado por cidades como Sydney e Rio de Janeiro, chegou a Santiago, no Chile, a iniciativa através da qual start-ups competem por dinheiro fictício que lhes pode trazer uma série de investidores.
En 2012, como parte das atividades dos Jogos Olímpicos de Londres, o então primeiro ministro britânico, David Cameron, pediu aos seus assessores que desenvolvessem algum tipo de atividade, através da qual se pudesse mostrar ao mundo o robusto crescimento do ecossistema de start-ups britânico.
O resultado foi chamado Startup Games e tratava-se de uma competição, na qual um grupo de empresas emergentes competia por receber investimentos de uma série de investidores fictícios. A atividade revelou-se um sucesso.
Quatro anos depois, a ideia foi replicada no Rio de Janeiro e o resultado foi ainda melhor. Assim, com a missão de atrair os melhores empreendedores e start-ups do mundo para o Reino Unido, em março passado, o Departamento de Comércio Internacional do governo britânico decidiu replicar a iniciativa em quatro cidades: Sydney, Singapura, Buenos Aires e Santiago.
A capital chilena recebeu a iniciativa a 30 de março. Nesse dia, a residência da embaixadora britânica recebeu 44 empreendedores de empresas como Diagnochip, Kappo e Allride. Juntamente com eles chegaram 25 investidores fictícios, um grupo que incluía especialistas em matéria de inovação, gerentes de empresas, além de um ou outro venture capital real. A premissa era simples: os empreendedores tinham cinco horas para conseguir que os investidores comprassem ações das suas empresas.
Cada investidor tinha em seu poder 1 milhão de libras (1,1 milhões de euros) que podia usar livremente, pagando como mínimo 50 mil libras (59 mil euros) por ação. As transações realizavam-se através de uma aplicação na qual os empreendedores fixavam o preço das suas ações, que iam subindo à medida que havia mais interessados. No final, ganhava a start-up que conseguisse levantar mais capital e valorizar mais alto a sua empresa e, por outro lado, o investidor que conseguisse o maior retorno.
London calling
A jornada iniciou-se às 9h30 da manhã e, depois das apresentações de Andrew Humphries e Sheetal Walsh, dois embaixadores do ecossistema de start-ups britânico, começou a batalha.
Rapidamente, os fundadores de empresas começaram a aproximar-se dos possíveis investidores com os detalhes dos seus projetos, tal como se se tratasse de uma reunião real. Modelos de negócios, rentabilidade, volume de vendas e outras métricas eram explicadas em poucos minutos, com a esperança de receber investimento.
No final, o vencedor da jornada foi a Diagnochip, um dispositivo médico que pode determinar, em poucas horas, a maneira mais correta para tratar as infeções urinárias. A empresa, fundada por Mario Soto e Sara Droguett, foi valorizada em 314 milhões de libras (372 milhões de euros). Como prémio, recebeu uma viagem para Londres, onde poderá participar na London Tech Week. A ideia é que durante uma semana tenha reuniões com a equipa do Global Entrepreneur Programme (GEP), o organismo que procura captar e incentivar os empreendedores a instalar-se no Reino Unido.
Com efeito, tanto Andrew Humphries como Sheetal Walsh são participantes na iniciativa e percorrem o mundo, identificando possíveis empresas que tenham potencial para crescer no Reino Unido. Posto isto, a Diagnochip poderá não ser a única start-up local com passagem para a Europa, já que, ao finalizar a atividade, ambos os dealmakers – conceito com o qual se descreve o seu trabalho de caça-talentos – comentaram que havia várias empresas chilenas que tinham potencial.
The Bakery liga o mundo corporativo com as start-ups
A The Bakery é uma aceleradora de empreendimentos, mas não no sentido tradicional. Não tem um processo de seleção, não entrega dinheiro nem pede equity. De passagem pelo Chile, Andrew Humphries, um dos seus fundadores, explica que esta entidade – apoiada pelo governo britânico – procura ligar o mundo corporativo com as start-ups. “Muitas grandes empresas querem estar incorporadas no mundo das start-ups, mas é um ecossistema estranho para elas, não o compreendem. As start-ups, pelo seu lado, não sabem como falar com as grandes empresas. The Bakery é um ecossistema onde estes dois mundos trabalham juntos: recebemos as necessidades das empresas e procuramos à volta do mundo quais são as start-ups que podem resolver os seus problemas”, explica.
Humphries conta que o seu governo definiu que, para que o ecossistema empreendedor se desenvolva, é fundamental a participação das empresas. Por isso, criaram uma série de incentivos fiscais para as empresas que invistam em start-ups. “Como resultado, há montão de dinheiro disponível que, de outra maneira, talvez não teria sido investido nestas empresas. Porque, tal como no Chile, o típico investidor britânico tem medo dos investimentos de venture capital“, diz.
Quando questionado sobre o que pensa do ecossistema empreendedor do Chile, Humphries revela que “conheci alguns investidores e em geral estão muito entusiasmados com as oportunidades que o ecossistema chileno oferece. Mas também vejo que a maioria dos investidores chilenos são bastante avessos ao risco, são mais tradicionais e consideram as start-ups como uma alternativa complicada para fazer dinheiro”.
“E a minha visão é que para que o sistema de start-ups realmente cresça no Chile, não se pode confiar só no financiamento governamental. A StartUp Chile é uma iniciativa incrível, é conhecida mundialmente, mas é muito importante também perceber que, além das venture capital, são necessários investidores corporativos e desenvolvimento de I&D em conjunto com as start-ups, porque daí resultam muitos benefícios. Não falo só de dinheiro, mas sobre apoio e mentoria”, acrescenta.
Mãe, esposa, fundadora de start-ups, investidora de venture capital e cabeça de uma organização de beneficência, Sheetal Walsh é uma das 22 dealmakers que o governo britânico tem espalhados à volta do mundo e que trabalham na atração de talento empreendedor para o Reino Unido.
Esta canadiana de 44 anos iniciou a sua carreira em princípios da década de 2000, criando a estratégia de venture capital da Microsoft nos Estados Unidos. Em 2003, mudou-se para Londres, para expandir o negócio para a Europa, Médio Oriente e África, e três anos depois decidiu tornar-se independente.
Primeiro fundou a Innovative Social Ventures, uma empresa que ajudava start-ups a escalar globalmente e que, em troca, lhes pedia que fizessem “algo” que tivesse um impacto positivo. Em paralelo criou a Metacert, uma empresa de proteção de dados para telemóveis e mais tarde fundou a Shanti Life, um empreendimento social que ajuda populações pobres na Índia com microcréditos. “Há três anos, decidi vender a minha casa em Londres e tornar-me investidora. Ser empreendedor pode ser muito extenuante, tem coisas muito boas, mas também muito más. Por isso, quis entender a outra perspetiva, a do investidor”, comenta durante uma curta visita a Santiago.
Consciente de que é uma privilegiada, ao poder compatibilizar o seu papel de mãe com a enorme gama de projetos que lidera, Walsh está também empenhada em que as mulheres sejam capazes de colaborar mais entre elas no mundo dos negócios. “Vejo os homens de negócios a ajudarem-se entre eles, vejo-os juntos a tomar uma cerveja e a discutir temas, mas as mulheres não fazem isso, geralmente não andam juntas e se apoiam. E isso é um grande desafio, gostaria de ver mais mulheres a trabalhar com outras mulheres”, diz.
“Chile é líder no empreendimento social, mas é complicado para essas start-ups conseguir rentabilidade. Creio que, mesmo num empreendimento social, há que estar focado em como escalar e fazer dinheiro. Porque sem isso não há ferramentas para continuar. As pessoas podem sempre gerar dinheiro e trabalhos; e, por outro lado, sempre há pessoas dispostas a dar dinheiro para a caridade. Mas o empreendimento social é essencial, porque é uma ponte entre os dois”, explica a canadiana.
“Tal como vimos no Chile, estão a destacar-se os projetos relacionados com a produção de alimentos, o que creio que é muito importante, porque nos afeta a todos. Também está o que se relaciona com os cuidados da saúde, como a produção de dispositivos médicos por exemplo; os empreendimentos relacionados com o meio ambiente; e, se pensarmos no digital, creio firmemente que a educação está a marcar o ritmo”, conclui.