Opinião
As coisas simples
São as melhores. Mais fantásticas. Mágicas. E no entanto nunca as conseguimos elaborar. Parece que ficamos eternamente presos nesse ardil das ideias simples…
Sabemos onde queremos chegar, mas naturalmente o ponto de partida é de tal forma tão parco (para se começar daí a construir e se chegar ao simples) que claro, nos parece e aos outros que é pouco e insuficiente e nunca ninguém nos entende e ao nosso génio incompreendido…
A minha versão é que tudo isso é mentira.
Dizemos que é espartano o que afinal é vago ou até mesmo frouxo.
Ser simples não é isso.
Uma ideia simples, quando ela é bela, vinga sempre. O resto serão subterfúgios de exclamações e defesas e argumentos para tentar justificar o que não dá sequer para perder tempo. E no digital, e em específico na Web 2.0 das redes sociais, os grandes sucessos de hoje, convém lembrar, sempre foram na sua essência grandes ideias – simples ideias.
Hoje em dia a segunda rede social mais utilizada em Portugal, o Instagram, com perto de 2,5M de utilizadores, foi no início uma ideia simples – uma rede social de fotos, tão somente, em formato quadrado com pouco mais de 10 filtros. Enquanto outras se apresentaram com inúmeros filtros e formatos de fotos e complicaram o que de início deveria ser simples, o Instagram prevaleceu. Porque era simples. Mas evoluiu também. Não sem contudo crescer em cima de uma ideia simples que conseguiu suportar a interação. Das fotos ao vídeo, ao Live, às Stories e agora ao eCommerce. Fez sentido. Sobretudo aos utilizadores. Que se acumulam.
O YouTube? Simples. Queres partilhar o teu vídeo com o mundo? É por aqui. Logo após o upload damos-te o link para enviares aos amigos, ainda que a qualidade não esteja a 100%. Para quê esperar pela qualidade máxima e o dia seguinte, como as demais plataformas? Simples, não? De início com limite de megas de upload, depois cada vez mais ampliado. Chegaram os comentários. Os canais. E o direto. E aqui começaram alguns problemas da ideia simples – tropeçou nessa chatice de se querer manter tão igual e simples que esqueceu do mundo a virar mobile e que o Live deveria ser isso mesmo, Mobile Live.
Veio o Facebook, e com essa ideia simples de tornar cada utilizador e o seu smartphone num canal de Tv em direto, a qualquer momento, roubou o “você tuba” do YouTube ao dono, atravessando-se na hegemonia da Google no vídeo e passando a disputá-la.
E o Twitter? Uma ideia simples. Uma rede social que se podia atualizar sem ligação à internet, por recurso a uma (simples) SMS, daí os 140 caracteres. Problema: a ideia simples permaneceu simples demais, até se tornar simplória, banal, sem graça. A simplicidade mágica continua lá, mas não soube evoluir do simples para o atualizado e em linha com a evolução da web, dos utilizadores, dos dispositivos e de como comunicamos. Os defensores dirão que está aí a sua beleza, nessa simplicidade imutável; outros o oposto, migrando para a rede mais próxima.
E poderíamos continuar. LinkedIn, do simples a uma evolução simplesmente bem feita; ao Snapchat o híper-simples evoluindo de forma coesa até se perder, entretanto, no delírio (esperemos temporário).
As ideias que são simples debatem-se sempre com elas mesmas e a sua simplicidade que na génese consegue ser bela por ser… tão simples. Mas importa não nos auto-hipnotizarmos com a nossa ideia e querer fazê-la estagnar com medo de a estragar só porque crescer cria rugas. Se uma ideia como a destas redes acima é poderosa, mesmo simples, ela aguentará o caminho da evolução. Claro que nos lembraremos, no futuro, com nostalgia, de como tudo era tão puro nos nossos primeiros anos de infância, como a empresa era una, horizontal, e da ideia ao organograma tudo tão linear e descomplicado.
É essa a arte das belas ideias. Evoluir e crescer com fulgor e entusiasmo pelo que crescer nos faz ganhar, ao invés de ficarmos estáticos como se tal protegesse a ideia simples do envelhecimento e da morte.
Mas saber crescer sobre uma ideia simples, sem a perder, não é simplesmente aumentar o grão num grão maior ou fazer inchar uma bola num balão. Não é imortalizar o passado para o futuro. É ter bem presente a essência da ideia, do que ela é, do que somos, e perceber depois que em cima dela é preciso conjugar o gerúndio e mudar – mudando.