Opinião

(Re) Aprender a escrever

Pedro Celeste, diretor-geral da PC&A

Muitos têm debatido sobre o conjunto de profissões que podem estar em causa em função do crescimento da inteligência artificial, sobretudo no campo da educação.

É uma realidade que toda a formação que envolve um conjunto de processos de aprendizagem terá necessariamente de ser reinventada, como forma de poder acompanhar o desenvolvimento tecnológico, ao mesmo tempo que se deve tornar ágil ao ponto de permitir responder, em tempo útil, aos desafios do conhecimento, sem colocar em causa uma estrutura de pensamento rigoroso e bem definido.

Se já é normal que o corretor de texto evita redigir um relatório com erros (tão comuns em mensagens do WhatsApp, por exemplo), agora o desafio que se coloca é o de saber organizar, nesse mesmo relatório, as ideias de forma coerente e consistente.

É precisamente aqui que a inteligência artificial passou a ser um auxiliar precioso, ao propor-nos um arquétipo de pensamento, assente numa estrutura ou índice, com sugestões de texto, em função daquilo que é solicitado. São múltiplos e variados os casos onde esta prática se tornou banal: nas universidades, nas empresas, na política ou no próprio jornalismo.

Assim sendo, o grande desafio que hoje se coloca não se prende com a capacidade de alinhar formas corretas de escrita, porque aquilo que prevalece é a capacidade de saber pedir ou perguntar à inteligência artificial as questões certas, com léxico certo e objetivos concretos. Aliás, este é um dos temas mais relevantes nos cursos que versam sobre a inteligência artificial: saber como “programar” texto, que induza o algoritmo a responder de forma clara, objetiva e, até criativa, aos desejos do redator.

Por outro lado, diz-se que uma imagem vale mais do que mil palavras. E se olharmos para o que ocorre à nossa volta, no que diz respeito à inteligência artificial, nunca esta frase fez tanto sentido.

Hoje, a partir do ChatGPT (texto), podemos evoluir para a imagem (Dall E, Midjourney ou Leonardo), vídeo (Pika ou Synthesia), áudio (Speechify) ou música (AIVA). A grande mais valia de todo este conjunto de soluções é que as podemos utilizar numa conjunção de potencialidades: uma sugestão de texto, que provoca uma narrativa, que gera imagem, a qual se transforma em vídeo, produz discurso, que pode ter musicalidade.

Repare-se que o Google era (e é) uma reserva de conhecimento. A informação está lá, é atual, verdadeira e encontra-se em microssegundos. Passou a ser a nossa biblioteca! Mas agora fomos mais longe, porque temos um assistente bibliotecário que produz a informação que se pretende e a transforma ao nosso gosto. E reúne em si mesmo, 3 grandes vantagens: não é dispendioso, trabalha de forma ininterrupta e nunca amua ou mostra cansaço.

Se este é um caminho que se está a percorrer de forma acelerada, mesmo com ventos contrários, então verificamos que a inteligência artificial vai compreendendo quem somos, o que queremos e rejeitamos, a que impactos somos mais sensíveis e qual a melhor forma de nos envolver, melhorando a cada dia a qualidade da informação providenciada, no tom e léxico que mais se adequa à nossa voz.

Quando tudo circular neste registo, é altura de abrirmos um grande desafio à nossa reflexão e que passa por (re)aprender a ser humano na era dos algoritmos. Para já, o desafio é saber o que escrever para que o algoritmo nos entenda!

Comentários
Pedro Celeste

Pedro Celeste

Doutorado em Gestão pela Universidade Complutense de Madrid. Diplomado pelo INSEAD, London Business School, Wharton School, University of Virginia, MIT Management Sloan Management School, Harvard Business School, Imperial College of London, Kellogg School of Management de Chicago e IESE Business School. Na Católica Lisbon School of Business & Economics é Diretor Académico dos Executive Master in Management e coordenador do Programa Avançado de Marketing para Executivos, do Programa de Gestão Comercial e Vendas, do Programa de Gestão em Marketing Digital... Ler Mais..

Artigos Relacionados