Entrevista/ “Queremos ligar o que houver de melhor na Europa às necessidades do Brasil”

Zaima Milazzo, presidente do Brain

“Sabemos que Portugal é um celeiro de ideias inovadoras”, afirmou Zaima Milazzo, presidente do Brain, a propósito da opção do Instituto entrar no mercado nacional. Em entrevista ao Link To Leaders falou dos seus planos para Portugal e ainda do seu papel como líder num universo de homens.

O Brain, Instituto de Ciência e Tecnologia (ICT) fundado pelo grupo brasileiro Algar Telecom, abriu recentemente uma filial em Lisboa , naquela que é sua primeira internacionalização, para procurar no ecossistema português soluções inovadoras em setores como o 5G, blockchain e IoT para indústria 4.0, retalho, saúde, agronegócio e smart spaces. O objetivo com a internacionalização é ampliar o relacionamento com o ecossistema local para desenvolver novas oportunidades de negócio e fortalecer a área de Pesquisa & Desenvolvimento (P&D) em tecnologias disruptivas. Além de captar recursos financeiros para a inovação e atrair talentos.

Em entrevista ao Link To Leaders, a presidente do Instituto, explicou as motivações que levaram à escolha de Portugal para internacionalizar o projeto e os planos traçados para o mercado nacional. Revelou também que a Algar Telecom, em parceria com Brain, está a lançar uma corporate venture builder com o objetivo estratégico de consolidar seu investimento no ecossistema de start-ups.

O que levou o Brain a escolher Portugal para abrir uma filial?
A escolha de Portugal tem vários motivos. Entendemos que o país é a melhor porta de entrada para a Europa dentro do nosso segmento, pois conta com um forte hub de inovação, tem potencial de talentos e de investimentos. Além disso, já tínhamos sentido um fit muito forte entre Portugal e o Brain em 2020 quando promovemos o Brain Internacional e tivemos duas start-ups portuguesas selecionadas para o programa.

Além disso, o Grupo Algar tem fortes laços com o país, pois o fundador do grupo, o senhor Alexandrino Garcia é português. Ele foi para o Brasil em busca de uma vida melhor, e agora é a vez de fazermos o caminho inverso e seguir no caminho da inovação. É, portanto, uma “volta às origens” mais de 100 anos depois.

“Queremos conectar o que houver de melhor na Europa com as necessidades do Brasil”.

Qual a estratégia do centro para o mercado português?
A nossa ambição é ser um elo de ligação relevante do ecossistema de inovação europeu. Queremos ligar o que houver de melhor na Europa às necessidades do Brasil. A nossa ideia, neste primeiro momento de atuação em Portugal, é ampliar o relacionamento com o ecossistema de inovação nacional, identificar e desenvolver novas oportunidades de negócio, fortalecer a frente de P&D para explorar tecnologias disruptivas, captar recursos financeiros para a inovação, e atrair talentos, pois sabemos que Portugal é um celeiro de ideias inovadoras. 

Que tipo de parcerias estão a formalizar em Portugal?
A primeira parceria é com o Atlantic Hub, onde estamos com um escritório físico. É um espaço colaborativo escolhido justamente para facilitar as novas conexões no país. O escritório é gerido pela Atlantic Hub, empresa global que auxilia mais de 70 organizações brasileiras no seu processo de internacionalização, tendo Portugal como porta de entrada.

Outra parceria comemorada por todos no Brain é a que fechamos no fim do ano passado com o Instituto de Telecomunicações (IT) de Aveiro e a Universidade Federal de Uberlândia, localizada no Estado de Minas Gerais, no Brasil. Temos um acordo para atuação conjunta em projetos de inovação. Esse trabalho em conjunto procura soluções relacionadas com TIC, Soluções Digitais, 5G, Redes Telecom, Computação Quântica e Inteligência Artificial.

No entanto, podemos adiantar que devem ser anunciadas outras parcerias em breve como, por exemplo, da Multivision, que é uma empresa portuguesa já consolidada e que atua em serviços de consultoria em tecnologias de informação, planeamento e otimização de redes de telecomunicações.
Estamos nesse momento a realizar um POC (Proof of Concept) com a solução METRIC, que foi desenvolvida para apoiar as operações de infraestrutura, planeamento e otimização de redes de acesso móveis promovendo mais qualidade de serviço e melhor experiência do cliente.

A solução permite a verificação automática de ocorrências, eventos e circunstâncias, e com o processamento/análise dos dados de consumo coletados apoia a equipa no planeamento do uso da rede, otimizando o tempo e os investimentos.

Além de proporcionar uma nova visão de gestão das redes de telecomunicações, os dados de desempenho fluem livremente e a colaboração acontece de forma natural. É um aspeto essencialmente importante para fazer evoluir ainda mais digitalmente a Algar Telecom. Acreditamos também que essa solução tem grande potencial de ser incorporada no portefólio de serviços da Algar Telecom, ajudando o nosso cliente a melhorar a gestão das suas redes privadas com agilidade, segurança e eficácia.

Quais são atualmente os objetivos do Brain? A sua missão mantém-se?
O Brain nasceu da procura e da vontade de encontrar soluções no mercado, e este caminho tem sido muito bem desenvolvido. A nossa missão é “ser a plataforma de geração de negócios inovadores referência do mercado.” Temos profissionais extremamente capacitados e temos crescido de forma exponencial dentro do nosso propósito. A melhor prova disso é a internacionalização. Queremos ampliar os nossos horizontes e também proporcionar a toda sociedade a possibilidade de se desenvolver com as melhores soluções que o mercado pode oferecer.

De forma prática temos alguns pontos chave que posso citar.  Hoje, o Brain quer encontrar no ecossistema de Portugal soluções inovadoras alinhadas com a estratégia de atuação do Brain e do Grupo Algar, com foco nas “avenidas tecnológicas 5G”, blockchain e IoT, e para as verticais de negócios indústria 4.0, retalho, saúde, agronegócio e smart spaces.

Que projetos bem-sucedidos têm saído do Brain e estão a ser aplicados na Algar Telecom?
Desde a sua criação, o Brain já desenvolveu para a Algar Telecom 19 novas soluções inovadoras, que respondem a diferentes segmentos como B2B, MPE (micro e pequenas empresas) e grossistas (fornecedores e ISPs). Além disso, o Centro de Inovação possui programas de intraempreendedorismo para a Algar Telecom, que já garantiram novas patentes para a organização. O Brain também é o responsável pelo relacionamento da empresa com start-ups, a partir dos programas de open innovation. O forte trabalho com inovação garantiu que a Algar Telecom fosse reconhecida por diversos prémios no Brasil como uma das empresas de telecomunicações mais inovadoras do país nos últimos anos.

“(…) queremos ampliar os horizontes conectando ecossistemas de outros países, mas ainda com foco concentrado em Portugal e América Latina”.

Que balanço faz do Brain Open – Edição Internacional e o que podemos esperar nas próximas edições?
O balanço é muito positivo. Na primeira etapa, foram 78 as start-ups analisadas no aspeto da conexão com os desafios do programa e 14 selecionadas para apresentação do Pitch Deck para os executivos do Brain e da Algar Telecom. Após a apresentação, foram escolhidas quatro start-ups, sendo duas delas portuguesas.

Para resolver as necessidades ou dores dos clientes, o Brain sempre atuou com o modelo de parceria para o desenvolvimento de soluções disruptivas, trabalhando em colaboração com diversos agentes externos. A primeira edição do Brain Open teve foco em Israel e tivemos uma experiência muito boa também.

Agora, com o programa concretizado, queremos ampliar os horizontes conectando ecossistemas de outros países, mas ainda com foco concentrado em Portugal e América Latina.

“A Algar Telecom, em parceria com Brain, está a lançar uma corporate venture builder com o objetivo estratégico de consolidar seu investimento no ecossistema de start-ups”.

Que iniciativas preveem o lançar nos próximos meses?
A Algar Telecom, em parceria com Brain, está a lançar uma corporate venture builder com o objetivo estratégico de consolidar seu investimento no ecossistema de start-ups. A intenção é fortalecer a evolução digital da empresa, acelerar seu go to market, potencializar a geração de novos negócios e alavancar soluções digitais, voltadas, principalmente, para os segmentos de micro e pequenas empresas e consumidores finais.
Além disso, ao apoiar o crescimento das start-ups, o modelo proporciona a criação de valor futuro para a organização com a distribuição de dividendos no momento de venda total ou parcial da participação dos sócios ou investidores (“Exit”). Este movimento pode ser potencializado pela conexão com o ecossistema de inovação em Portugal.

“O problema da sub-representação feminina no setor tecnológico é profundo e complexo”.

O setor tecnológico continua a ser maioritariamente masculino, embora a tendência aponte para uma maior presença feminina a todos os níveis e para uma maior multiculturalidade. O que é preciso fazer para atrair mais mulheres para este mundo?
Essa é uma questão que me intriga muito desde que me tornei uma liderança feminina inserida nesse contexto tão desigual. E a resposta para isso é que há preconceitos e crenças limitantes que tiram das mulheres desde cedo o sonho de seguir com carreiras em ciências exatas.

O problema da sub-representação feminina no setor tecnológico é profundo e complexo. Para solucioná-lo, são necessárias ações em inúmeras frentes, com políticas formais e compromissos na busca pela inclusão tomados pelas empresas e por todos os atores do ecossistema de inovação.

Precisamos de batalhar por uma mudança cultural que começa desde a infância, na criação dos nossos filhos, por iniciativas que estimulem o acesso das mulheres em cursos universitários de exatas; por eliminar a discriminação de género na hora da contratação e definição de promoções; por programas de mentoria e capacitação voltados especificamente para o público feminino; pela equidade de aportes em start-ups fundadas por mulheres; e por condições que permitam que, uma vez inseridas, elas tenham condições favoráveis para que permaneçam e cresçam, o que inclui um ambiente de trabalho apropriado, que as valorize e apoie, principalmente na maternidade.

Felizmente, no Brain, o problema da desigualdade de género que vemos no mundo externo não se tem repetido. Com uma líder mulher, foi natural que alcançássemos uma liderança com equidade no sexo feminino (50%) e 44% no quadro geral. No entanto, ainda temos muito para avançar em outros aspetos da diversidade – e é por isso que já testamos, inclusive, uma ferramenta de recrutamento às cegas no programa de estágio, modelo que deve amadurecer para outros tipos de contratações.
Para evoluir ainda mais nesse caminho, contamos também com o suporte do programa Algar Sem Barreiras, iniciativa do Grupo Algar que procura promover a inclusão em cinco frentes: género, étnia, LGBTI+, gerações e PCD.

Tem mais de 20 anos no setor de telecomunicações, desde a área comercial, como consultora de clientes corporativos, até a direção de uma unidade de negócios de media, na Algar Telecom. De que forma a sua experiência profissional a ajudou a ser a mulher que é hoje?
Considero-me uma profissional multidisciplinar. A minha trajetória de carreira permitiu que eu navegasse em diversas áreas e ajudou-me com o hard skill que possuo hoje. Além disto, a minha principal característica é ser anti-frágil. Eu apreendo com as adversidades externas e com as mudanças de rotas e tento potencializar o futuro através dessa aprendizagem.

Como perspetiva o futuro do Brain e o que podemos esperar de novidades?
Após quatro anos desde a sua criação e mais de duas mil pessoas capacitadas em metodologias ágeis, a proposta agora é utilizar a experiência prática do Brain para apoiar empresas e profissionais que queiram transformar-se por meio das temáticas de inovação, agilidade, liderança do futuro e novas tecnologias.

Posso citar nesta perspetiva três frentes como alavancas de crescimento para o mercado: educação profissional; consultoria para médias e grandes empresas em programas de inovação e desenvolvimento de novos negócios; e lab para cocriação, com aplicação de metodologias de inovação como o Design Thinking e prototipação para clientes estratégicos que precisem de ambientes de experimentação.

 Respostas rápidas:
O maior risco:
Não conseguir balancear minha vida profissional e pessoal.
O maior erro: Prometer aquilo que não podia cumprir.
A maior lição: Saber ser empática em todas situações.
A maior conquista: Na vida pessoal meus filhos maravilhosos, na profissional a criação do Brain.

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