Opinião

Plano de Marketing: muito plano, pouco marketing

Pedro Celeste, diretor-geral da PC&A

Tendo acompanhado a leitura de muitos planos de negócio e planos de marketing, verifico ser comum registar algumas debilidades ou dificuldades em fazer destes documentos um elemento crucial do desenvolvimento da estratégia da empresa.

Por exemplo, é muito pouco comum encontrar nos planos de marketing aquela que é visão dos clientes. É como se estivéssemos a produzir um documento entre quatro paredes em que definimos os nossos próprios objetivos, projetamos as metas, baseando-nos em dados do passado para projetar o futuro, onde incluímos uma análise SWOT (muitas vezes forçada e mascarada), como ponto de partida para a definição da estratégia a implementar.

Na verdade, quando omitimos na informação a voz dos clientes e a maneira como estes projetam as suas tendências e olham para os diferentes intérpretes do mercado, estamos a cometer um erro crucial. Não me estou a referir à falta de dados quantitativos do mercado e clientes porque esses existem e estão refletidos em vendas, totais e por segmentos de mercado. A propósito, a segmentação estática, como a geográfica, de género ou faixa etária, está cada vez mais longe de responder às atitudes dos clientes face à compra (independentemente de estarmos perante um mercado B2B ou B2C), havendo a necessidade de caminhar para critérios emocionais ou por benefício. Assim, a grande debilidade assenta na falta de uma dinâmica da vontade do mercado e da forma como estes organizam o seu pensamento, isto é, porque nos preferem ou nos preterem. Recorrendo a uma linguagem do mundo do marketing digital, também não basta criar personas: é preciso descrever o que fazer com elas, que personifique uma comunicação customizada e única.

O mesmo é válido para a análise competitiva. Mais do que descrever quem são os concorrentes (e aqui o campo de visão deve ser alargado) e as respetivas quotas de mercado, o mais importante é compreender como os mesmos são capazes de reagir as contrariedades do mercado e a um contexto externo permanentemente em mudança. E raras são as vezes que se faz esta leitura isolando cada mercado relevante onde a empresa opera. Afinal, o principal concorrente é o que tem quotas de mercado mais próximas da nossa, ou aquele que nos tem tirado mais clientes? Os rankings tornam-se imprecisos e muitas vezes são criadores de utopias que não ajudam a criar mais valor.

A generalidade dos planos de marketing produz um mix que afeta o mass market ou, nos casos mais cuidadosos, um mix adaptado a cada segmento de mercado. Todavia, a empresa preconiza na sua dinâmica operacional a necessidade de definir uma experiência do cliente personalizada, que até pode pressupor a definição de algoritmos que permitem criar uma comunicação específica. Parece que a tática não encaixa na estratégia. O mesmo se diga da tão propalada customer journey, que muitas vezes fica de fora dos planos de marketing, quando ela é a essência de toda a reflexão operacional que decorre dos eixos estratégicos de ação em cada um dos momentos de verdade na interação com clientes.

Se um plano de marketing é um conjunto de pressupostos, ideias e boas intenções sem a respetiva materialização prática coerente e assertiva, então estamos perante um compêndio que pode constituir uma leitura interessante sobre o mercado, mas que não representa uma ferramenta de trabalho. Quantos Planos de Marketing estão guardados em estantes que nunca serviram como ferramenta de trabalho, mas que apenas existem para justificar a sua conceção?

Comentários
Pedro Celeste

Pedro Celeste

Doutorado em Gestão pela Universidade Complutense de Madrid. Diplomado pelo INSEAD, London Business School, Wharton School, University of Virginia, MIT Management Sloan Management School, Harvard Business School, Imperial College of London, Kellogg School of Management de Chicago e IESE Business School. Na Católica Lisbon School of Business & Economics é Diretor Académico dos Executive Master in Management e coordenador do Programa Avançado de Marketing para Executivos, do Programa de Gestão Comercial e Vendas, do Programa de Gestão em Marketing Digital... Ler Mais..

Artigos Relacionados