Opinião
Phenix já evitou o desperdício de 10 milhões de refeições em Portugal
Thomas Barthuel, COO da Phenix, uma das principais empresas de combate ao desperdício na Europa, esteve recentemente em Portugal e o Link To Leaders falou com ele sobre os projetos para o nosso país onde está presente há cerca de cinco anos e onde já “salvou” mais de 10 milhões de refeições.
Com soluções que pretendem fazer a diferença no combate ao desperdício alimentar, e não alimentar, a Phenix quer alargar a rede de parceiros em Portugal, para expandir o serviço de conversão de excedentes em doações a IPSSs, chegando a cada vez mais locais e famílias.
O lançamento da aplicação móvel Phenix, em 2019, foi um marco importante no percurso da empresa que agora chega, cada vez mais, a mais pessoas inclusive ao público em geral, que passou a poder comprar os cabazes de excedentes e juntar-se ao combate ao desperdício. Ainda este ano, planeia lançar uma solução, na vertente B2B, relacionada com o controlo de prazos de validade. Até ao final de 2021, a Phenix espera alcançar a marca dos 20 milhões de refeições salvas no mercado português, revelou ao Link To Leaders, Thomas Barthuel, COO da Phenix.
A Phenix foi criada com a missão de combater o desperdício alimentar? Como está a correr essa missão? Dentro dos objetivos traçados?
Na verdade, a Phenix foi criada em França em 2014 e chegou a Portugal no final de 2016, inicialmente, apenas com o serviço de conversão de excedentes de grandes superfícies comerciais, como supermercados, em doações. Em 2019, lançámos a nossa aplicação anti-desperdício alimentar, começando por França e depois, em outubro, com um soft launch em Portugal.
O nosso objetivo principal é e tem sido sempre o combate ao desperdício, alimentar e não alimentar, mas sempre com um maior foco no primeiro. Depois de sete anos de operação a nível internacional e quase cinco em Portugal, estamos a cumprir a nossa missão, com mais de 10 milhões de refeições salvas cá e mais de 125 milhões na globalidade dos países em que estamos presentes: França, Espanha, Portugal, Bélgica e Itália.
“Até ao final do ano, projetamos vir a contabilizar cerca de 18 a 20 milhões de refeições salvas em Portugal (…)”.
Quais as suas expetativas quanto ao projeto Phenix em Portugal?
Em primeiro lugar, queremos ser um aliado dos consumidores e das empresas no combate ao desperdício, oferecendo ferramentas para que possam juntar-se à nossa missão. Só em Portugal, mais de 1 milhão de toneladas de alimentos são desperdiçadas anualmente. Se considerarmos o número de famílias que passam por dificuldades e não têm acesso a comida suficiente, as soluções da Phenix podem fazer realmente a diferença.
Portugal é um país cuja identidade cultural se associa fortemente à comida e é preciso que, a par de se fomentar essa relação tão especial, se promovam também hábitos que ajudem a mitigar o desperdício. Apenas se todos trabalharmos em conjunto – comunidade, tecido empresarial e órgãos governamentais –, poderemos alcançar a meta da União Europeia de reduzir o desperdício alimentar em 50% até 2025.
Neste sentido, temos por objetivo alargar a nossa rede de parceiros em Portugal, para expandir o nosso serviço de conversão de excedentes em doações a IPSSs, chegando a cada vez mais locais e famílias. No que se refere à aplicação anti-desperdício, planeamos duplicar a nossa abrangência no país, expandindo a nossa operação em Lisboa e no Porto, mas também chegando, a curto-prazo, a novas cidades. Até ao final do ano, projetamos vir a contabilizar cerca de 18 a 20 milhões de refeições salvas em Portugal, desde que entrámos no país.
O tecido empresarial português está recetivo ao apoio prestado pela Phenix?
Sim, bastante. Na verdade, quando chegámos a Portugal, em 2016, conseguimos um contrato muito significativo com a Sonae, para gerir o desperdício dos hipermercados Continente, Continente Modelo e Continente Bom Dia, uma parceria que mantemos até hoje. Podemos afirmar que o serviço de conversão de excedentes em doações foi muito bem recebido.
Outro marco importante foi a entrada em cena da aplicação móvel Phenix, em 2019, que nos permitiu disponibilizar uma nova solução, ao alcance quer de grandes estabelecimentos, quer de comerciantes com uma dimensão mais reduzida, além do público em geral, que passou a poder comprar os cabazes de excedentes e juntar-se ao combate ao desperdício. Inicialmente, foi um pouco desafiante ultrapassar uma certa desconfiança por parte dos parceiros mas, hoje em dia, isso já não se verifica e até são as próprias empresas a contactarem-nos para se juntarem à nossa aplicação.
“Portugal é, neste momento, o mercado com o maior investimento por parte da Phenix e com maior diversidade de recursos para combater o desperdício”.
Quais as soluções da Phenix para combater o desperdício alimentar?
Neste momento, dispomos de duas soluções no mercado português: o serviço de conversão de excedentes alimentares de cadeias de retalho e distribuição, armazéns, produtores, supermercados, entre outros, em doações a IPSSs, dedicado exclusivamente ao segmento B2B; e a aplicação móvel, que pode envolver qualquer espaço comercial que pretenda reduzir o seu desperdício alimentar, ao vender os seus excedentes diários sob a forma de cabazes, com descontos até 70%.
Estamos, igualmente, a desenvolver uma terceira solução, na vertente B2B, relacionada com o controlo de prazos de validade, que planeamos lançar já este ano. Junto com França, Portugal é, neste momento, o mercado com o maior investimento por parte da Phenix e com maior diversidade de recursos para combater o desperdício.
Neste momento, os números globais da Phenix são de 100 mil refeições salvas por dia, 50 toneladas de resíduos evitados e 3500 empresas e parceiros associados. Até onde querem chegar?
Neste momento, já temos uma média de 120 mil refeições salvas por dia, na globalidade dos países em que estamos presentes. Como mencionei, só no mercado português, esperamos alcançar a marca dos 20 milhões de refeições salvas, até ao final do ano, através dos vários serviços que disponibilizamos.
Até agora, e considerando o contexto internacional, já salvámos 125 milhões de refeições desde 2014 e, em Portugal, conseguimos ultrapassar recentemente a marca dos 10 milhões, desde 2016. É claro que estes números têm um impacto enorme no país: mais de 1000 instituições portuguesas beneficiam de doações de excedentes alimentares, mais de 13 mil toneladas de emissões de CO2 já foram evitadas, e foi impedido o desperdício de mais de 5 mil toneladas de alimentos.
“(…) por toda a Europa, as empresas estão a despertar para a problemática do desperdício alimentar”.
Globalmente, como tem sido desenvolvido o trabalho de parceria com as empresas do setor alimentar e do retalho?
Este trabalho tem corrido muito bem. De um modo geral, por toda a Europa, as empresas estão a despertar para a problemática do desperdício alimentar. Conseguimos observar claramente uma tendência, no sentido em que a entrada da Phenix nos diferentes mercados acaba por contribuir imenso para gerar mais atenção por parte do tecido empresarial para este tema.
Em Portugal, precisamente depois da nossa chegada, nomeadamente com o lançamento da aplicação móvel, observámos um aumento significativo do interesse das empresas da indústria alimentar neste tópico e também na procura de soluções para dar resposta ao problema do desperdício. Em termos do segmento do retalho e distribuição alimentar, os nossos serviços passam por realizar uma auditoria inicial aos clientes, aferindo o nível de desperdício; prestar formação contínua na triagem, separação e acondicionamento dos excedentes; e estabelecer a ponte com uma rede de instituições parceiras, para que sejam recetoras dos mesmos.
“Além de França, Portugal e Espanha são os países que lideram, neste momento, o combate ao desperdício”.
Do grupo dos países que estão sob a sua responsabilidade, quais os que estão a cumprir melhor as metas de zero waste?
Além de França, Portugal e Espanha são os países que lideram, neste momento, o combate ao desperdício. No entanto, estou certo de que os restantes países vão alcançar rapidamente os mesmos targets, uma vez que o desperdício alimentar – e o desperdício, no geral –, é um tema em grande destaque atualmente e, quer as pessoas, quer as empresas vão envolver-se e comprometer-se cada vez mais na missão de combatê-lo.
O quadro legislativo internacional é favorável a um projeto como o vosso?
Em França, absolutamente. Em Portugal, diria que sim e que está a evoluir para um quadro legislativo ainda mais benéfico. Assistimos, neste momento, a debates neste sentido e antecipamos que, em breve, surja nova legislação em Portugal (inspirada na lei francesa) para garantir que não haja tanto desperdício alimentar. Quanto aos restantes países, acredito que a situação também vai evoluir de forma positiva.
Qual tem sido a recetividade das pessoas e instituições, ou seja, de quem recebe os alimentos, ao projeto Phenix?
Tem sido, sem dúvida, muito boa. As instituições e famílias que apoiamos através das doações sentem que, com o suporte da Phenix, conseguem ir mais além e dar resposta a necessidades que antes se afiguravam impossíveis. É claro que algumas destas instituições já tinham outros apoios, mas o que faz realmente a diferença na intervenção da Phenix é a qualidade que asseguramos em todos os produtos que são doados, o volume e regularidade constantes das doações, e a relação de proximidade que ajudamos a estabelecer entre os estabelecimentos que realizam as doações e as instituições que as recebem.
Têm o site, uma app… que outras ferramentas planeiam disponibilizar para que mais pessoas possam chegar ao vosso projeto?
Estamos a trabalhar numa solução para o mercado português focada no controlo de prazos de validade, no segmento B2B. Em paralelo, estamos a desenvolver um conjunto de ferramentas integradas e complementares que nos permitirão gerir e evitar o desperdício alimentar das empresas, desde o início até ao fim do processo de produção, transformação, armazenamento e venda dos seus produtos. Também estamos a trabalhar no sentido de digitalizar ao máximo o processo de doações, o que permitirá disponibilizar aos nossos clientes uma plataforma que agrega todo o tipo de dados sobre o seu desperdício, stocks e estratégias para recuperar esses valores de forma eficiente. Esta plataforma já se encontra disponível em França e irá alargar-se aos demais países onde operamos.
“Estamos, neste momento, a desenvolver um projeto-piloto em Hong Kong, em parceria com uma empresa local, e ambicionamos continuar a crescer fora do continente europeu”.
Atualmente, estão presentes em cinco países na Europa. Para que geografias gostariam de internacionalizar o projeto, uma vez que, como dizem, o desperdício alimentar não tem fronteiras?
Estamos, neste momento, a desenvolver um projeto-piloto em Hong Kong, em parceria com uma empresa local, e ambicionamos continuar a crescer fora do continente europeu. No entanto, a prioridade é, para já, reforçar a nossa posição na Europa, entrando em novos mercados todos os anos. Sempre que surgirem oportunidades de expansão para fora do continente, serão avaliadas (como foi o caso de Hong Kong) e, se for oportuno, faremos certamente um investimento nesse sentido.
As empresas do setor alimentar e distribuição, players fundamentais neste processo, já estão suficientemente sensibilizadas para a questão do desperdício alimentar?
Felizmente, os nossos parceiros são muito recetivos, porque todos reconhecem que o desperdício alimentar é um problema que afeta não só o ambiente, mas também a eficiência dos seus negócios. Este esforço de sensibilização e consciencialização é um pilar fundamental do trabalho que desenvolvemos, e não há nada mais eficaz do que demonstrar as vantagens que as soluções disponíveis podem trazer para todas as partes envolvidas. À medida que cada vez mais organizações se envolvem neste processo, este tema do desperdício ganha cada vez mais destaque e adesão por parte do tecido empresarial.
De que formas esperam poder contribuir ainda mais para o zero waste alimentar?
A continuidade da nossa missão passa pela melhoria das ferramentas disponíveis e o desenvolvimento de novos recursos, bem como pelo reforço do trabalho de sensibilização que temos estado a fazer. Por outro lado e acima de tudo, a expansão nos mercados em que já estamos presentes e a entrada em novos mercados são uma parte fundamental da nossa estratégia de crescimento, que será, claro, acompanhada por um investimento crescente por parte da Phenix.