Opinião
Perspetivas dos executivos nacionais para 2024: Machine Vs Human Intelligence
O Negócios publicou, em janeiro passado, a prospetiva de centenas de líderes portugueses para 2024, sumarizando essa análise da seguinte forma: “Margem e investimento em tecnologia serão prioridades enquanto a situação geopolítica assusta.
Os 173 decisores inquiridos pelo Negócios indicam a melhoria da margem como o caminho. A reorganização interna e o investimento em tecnologia serão as apostas para aumentar a produtividade. A instabilidade política e a evolução económica são os maiores riscos nacionais. A incerteza geopolítica é o grande fator global de incerteza”. A análise foi ainda complementada com uma análise de 13 tópicos em forma de questionário que foi enviado aos participantes.
O objetivo da minha análise que se segue é perceber os tópicos prioritários na agenda dos gestores para 2024. Tentarei também avaliar se a qualidade da análise realizada pela máquina se equipara à análise efetuada pelo humano, nomeadamente jornalistas profissionais com a sua vasta experiência e intuição (algo que as máquinas não possuem, ainda). E conseguirá a máquina identificar algo que escapa à análise humana?
Nos últimos quatro anos (de 2020 a 2023) analisei as contribuições de cada líder com recurso a Topic Modelling (técnica de Inteligência Artificial). Importa clarificar que não se tratam de LLMs (ChatGPT, Bard, Gemini, etc.). Optei por esta técnica por permitir fazer uma análise integrada de todas as contribuições e perceber quais os tópicos em que os executivos se focam da forma mais objetiva possível. A análise baseia-se apenas no verbatim (texto) das antevisões dos líderes.
O Topic Modelling é utilizado no processamento de linguagem natural (NLP) para identificar tópicos presentes numa coleção de documentos (as contribuições de cada líder). Envolve usar algoritmos estatísticos para identificar padrões no uso das palavras em cada contribuição e agrupá-las para identificar os tópicos subjacentes. Adicionalmente, calculei o número ótimo de tópicos através de um método matemático específico.
A vantagem de usar o Topic Modelling é permitir identificar e ordenar os tópicos mais mencionados pelos executivos. A minha análise identificou sete tópicos agrupados em dois grandes temas (ver duas colunas da direita na Tabela 1):
- Incerteza e Instabilidade Económica e Política com 97 menções e
- Desafios Económicos e Empresariais com 71 menções.
O tópico preponderante é a Incerteza e Instabilidade Económica e Geopolítica que é o enfoque principal de 45 executivos e que não constitui surpresa. O segundo tópico mais focado é o Contexto de Incerteza e Oportunidades de Negócio (foco de 22 executivos).
Com este contexto VUCA (volátil, incerto, complexo, e ambíguo) apenas o suporte de uma função de Competitive Intelligence (CI) de topo pode ajudar na navegação destes desafios. A compreensão do que nos trouxe até aqui (retrospectiva/hindsight), o que está a mudar (perspectiva/insight), e o que vem aí (prospectiva/foresight), e mais importante, as suas causas e principais factores é crítica.
A França e o seu tecido empresarial conhecem bem esta ciência (1) e o Estado e as Universidades promovem a sua implementação e prática nas empresas. Em Portugal temos apenas um Programa Executivo dedicado ao CI na Universidade Nova de Lisboa através da sua Information Management School (IMS) em parceria com a SCIP (2) (e que exporta para todo o mundo).
O Crescimento Económico Português e a Inflação e Crescimento (das empresas) são os dois tópicos seguintes que vêm reforçar o meu ponto anterior. A junção deste aos dois primeiros torna o ambiente competitivo ainda mais desafiante. A economia portuguesa apresenta uma tendência adversa ao crescimento dos negócios e está exposta aos choques internacionais. Com um mercado de aproximadamente dez milhões de consumidores, Portugal deveria estar virado para o mercado internacional e antecipar estes choques por estar em contato com a origem dos mesmos.
Este movimento de internacionalização é aparentemente fácil, mas os movimentos protecionistas de vários países (inclusive os PALOPS) tornam estas estratégias deveras complicadas. Está na hora de desenvovler competências nesta área e deixar a tentativa e erro para outras áreas. A profissionalização do desenvolvimento de negócios internacionais é crítica e deveria ser uma trademark dos profissionais e organizações portuguesas. Esta valia juntamente com a nossa caraterística do “desenrascanso” poderia trazer vantagens palpáveis à nossa economia. No entanto é necessário criar centros de excelência e ensinar estas capacidades nas Universidades!
O Serviço e Governação Pública é o quinto tópico ao qual escuso-me de comentar pois além de não ser a minha área de especialidade, é um tema por demais escalpelizado. Resta apenas passar à ação.
A Transição Energética é o sexto tópico, mas temo que seja o tópico “politicamente correto”. Confesso que reconheço a importância do tema, mas sou muito cético em relação à motivação da maior parte das empresas. E reconheço também que temos alguma melhores práticas a nível internacional.
Os Desafios da Inteligência Artificial e Inovação é o último tópico. Para mim, deveria estar no topo da tabela pois é a solução para os problemas mais prementes do contexto de negócios atual.
A Inovação enquanto resposta às mudanças e a AI como fator de aumento da produtividade das organizações. A grande questão é que o aproveitamento da tecnologia depende da formação que é dada aos colaboradores para os sensibilizar para o seu uso responsável (i.e., ético) e seguro (i.e. proteção dos “segredos do negócio”).
A inovação depende do alavancar destas e de outras tecnologias para endereçar as necessidades em permanente mudança. Atenção para o aumento das margens não é sustentável sem uma proposta de valor que as justifique e parece-me que o ponto de rutura está próximo (e.g., muitos americanos estão a voltar ao seu país de origem depois de perceberem que Portugal não era a pechinha que lhes foi vendida). Provavelmente vamos ver uma nova vaga migratória de portugueses em busca de melhores salários que lhes permitam uma melhor qualidade de vida. E mais uma vez só vão emigrar aqueles que podem, ou seja, que têm as competências para vingar noutros países (i.e., capacidade de trabalho, resiliência, empreendedorismo ou capacidades técnicas especializadas). Se juntarmos a este fator, a falta de mão de obra referida por 49,7% dos inquiridos pelo Negócios, a situação poderá vir a degradar-se ainda mais.
A Tabela 1 resume a comparação entre as análises e está ordenada pela frequência com que os tópicos são mencionados pelos executivos (Figura 1).
Concluo esta análise com algumas reflexões para ponderação futura:
- Qual a sua opinião da análise feita pela Máquina em relação à feita pelo Humano?
- Até que ponto é que os humanos conseguiram antever o que aconteceu à presente data?
- Conseguirá uma máquina antever o futuro melhor que a nossa intuição?
Talvez aborde alguns destes temas em futuros artigos. Devo confessar que tenho curiosidade em relação à opinião dos leitores relativamente a estes tópicos. Até já!
Referências
(1) https://www.researchgate.net/publication/370221348_Competitive_Intelligence_Science_Unified_View_Modular_Definition_Instruments_and_Mindset
(2)https://www.scip.org/page/CI-Data-Driven-Decision-Making-Training
Links:
Artigos anteriores com análises semelhantes para melhor compreensão do método e insights que são discutidos nesta análise:
2023 – Decisões estratégicas Intelligence-Driven para 2023;
2022 – Decisões estratégicas Intelligence-Driven (Parte 1);
2021 – Decisões estratégicas Data-Driven;