Opinião

OE2019 não estimula o crescimento económico

António Saraiva, presidente da Confederação Empresarial de Portugal

Há três meses, neste mesmo espaço, sintetizei as grandes linhas das propostas apresentadas pela CIP para o Orçamento do Estado para 2019. Propostas concretas e construtivas, que, sem pretenderem constituir um caderno reivindicativo do patronato, tinham subjacente uma reorientação dos estímulos orçamentais do consumo para o investimento, da procura para a oferta.

Sabíamos já que, entre as exigências externas (das metas europeias) e as pressões políticas internas (da esquerda parlamentar), não haveria margem de manobra, nem vontade política, para uma alteração profunda no rumo da política orçamental.

O Programa de Estabilidade apresentado em abril era já bastante claro quanto à estratégia que seria seguida, dando conta do abandono do objetivo da redução da carga fiscal, depois da execução orçamental de 2017 ter colocado este indicador no seu máximo histórico em Portugal – 34,4% do PIB – e de se perspetivar para este ano uma nova subida.

Era já previsível que a grande prioridade da política orçamental continuaria a ser o estímulo da procura, muito focado na melhoria do rendimento dos funcionários públicos, suportada pela subida das receitas do IRC e do IVA.

Esperava, no entanto, que, do repto lançado ao Governo pelas empresas, fosse retido, no mínimo, o compromisso de não agravamento da tributação que sobre elas recai, bem como sinais consistentes com uma maior atenção às empresas como fonte de desenvolvimento económico e não apenas como geradoras de receita fiscal.

Não foi isso que sucedeu. Para além da dispensa da obrigatoriedade do Pagamento Especial por Conta, que resulta de um compromisso assumido há dois anos pelo Governo, em sede de concertação social, as medidas favoráveis às empresas são poucas e tímidas.

Ouvimos, até, um responsável governamental dizer que a opção do Governo “não foi criar novidades” para as empresas ao nível dos impostos e que o maior reconhecimento que as empresas podem dar à política fiscal é o aumento consistente, todos os anos, da receita de IRC, sem aumentar as taxas (esquecendo o aumento da derrama em 2018!). “Não há melhor notícia para as empresas do que essa”, porque significa que “a economia está a funcionar”.

Esta ideia de que, se tudo está a correr tão bem, não há razões para mudar o rumo da política orçamental, é, na minha opinião, errada.

Em primeiro lugar, porque denota falta de ambição. Não nos podemos satisfazer com taxas de crescimento na ordem dos 2% ao ano.

Em segundo lugar, porque os sinais de abrandamento da atividade económica, de enfraquecimento do dinamismo do mercado do trabalho e de degradação da envolvente externa estão já bem presentes nos resultados económicos mais recentes.

Seria, por isso, necessário contrariar estes sinais e centrar a política orçamental numa visão de médio e longo prazo, reorientando-a para a criação de condições propícias a uma maior competitividade, assente na produtividade das empresas.

Acresce que, numa conjuntura em que as empresas portuguesas têm vindo a enfrentar aumentos incomportáveis no preço da eletricidade, seria de esperar que fossem tomadas medidas fiscais que amortecessem o aumento de custos associados à fatura energética. Incompreensivelmente, a proposta de Orçamento do Estado para 2019 é omissa em relação a esta necessidade.

Mas, mais grave é o facto de, afinal, haver novidades (desfavoráveis) para as empresas: continuamos a assistir a agravamentos fiscais e à criação de novas formas de tributação.

Em particular, destaco, pela negativa, o facto de o Governo pretender aumentar novamente a tributação autónoma sobre os gastos com as viaturas das empresas, tendo o movimento associativo empresarial sido consensual no pedido para que, no mínimo, fosse revertido o aumento introduzido no tempo da troika.

É certo que as empresas continuarão a fazer a economia funcionar. Confio na capacidade e na resiliência que têm demonstrado. Mas não vejo, do lado da política orçamental, o impulso necessário para que a economia não abrande, passada a componente cíclica da atual fase de recuperação.

Não deixarei, por isso, de responsabilizar o Governo pelas consequências da sua inação e das suas escolhas.

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Antonio Saraiva

Antonio Saraiva

António Saraiva nasceu em novembro de 1953 em Ervidel. Diretor da Metalúrgica Luso-Italiana desde 1989 e administrador a partir de 1992, adquiriu a empresa ao Grupo Mello em 1996, sendo atualmente presidente do conselho de administração. Começou a sua carreira na Lisnave, aos 17 anos. Completou o Curso da Escola Industrial e frequentou o Instituto Superior Técnico. Foi membro da Direção da Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos de Afins de Portugal (AIMMAP), de 2001 a 2003, vice-presidente de 2004 a... Ler Mais..

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