Opinião
O que não pode falhar em tempos de comunicação de crise
Depois de um ano inteiro a assistir a comunicados e conferências de imprensa sobre a pandemia, todos estamos conscientes de que muitos erros foram cometidos em termos de imagem pelos diversos protagonistas. É sabido que em comunicação de crise, quanto menos pormenores para distrair a atenção dos espectadores, melhor.
Nalguns casos os cenários foram mal pensados roubando protagonismo às autoridades e distraindo os espectadores da mensagem que se pretendia transmitir. Escolher uma sala de um palácio monumental e colocar uns painéis que ocupam menos de um terço da parede, não resulta na transmissão televisiva pois as câmaras não se limitam a transmitir o foco principal. Uma mensagem é mais eficaz quando tudo o que aparece no ecrã é parte integrante do seu conteúdo. Um photocall serve para fundo de fotografias num evento em tempo normal, mas em tempo de crise é apenas um “ruído” na comunicação. Basta um púlpito com uma mensagem curta, mas forte: “Fique em casa. Use máscara. Proteja-se”, como fez o primeiro ministro inglês.
Em Portugal só o Presidente da República escolheu o cenário adequado para anunciar os sucessivos estados de emergência. Escolheu um canto de uma sala do Palácio de Belém, com um púlpito e duas bandeiras à direita deste. Conseguiu transmitir dignidade, autoridade e credibilidade. Em linguagem não verbal a bandeira nacional tem uma forte carga simbólica e une todos os portugueses em torno da batalha que estamos a travar.
Ao longo do último ano, habituámo-nos a ver sucessivas conferências de imprensa diárias, com diversas autoridades do setor da Saúde a informarem-nos da evolução da pandemia.
Aparentemente não seguiram o protocolo de assentamento à mesa que determina que, sendo três pessoas, quem preside senta-se ao centro, dando a direita à pessoa que se segue na hierarquia e a esquerda à que tiver menor precedência. No caso de serem duas pessoas, a mais importante deve ficar à direita do centro, ou seja, à esquerda de quem observa e a menos importante à esquerda, ou seja, à direita para o observador. Não foi o que aconteceu. Para a maioria do público, isto pode ter passado despercebido, mas bastava haver um técnico de protocolo presente para resolver esta questão e dar a cada um o lugar que lhe compete pela função que exerce.
Mais grave do que as precedências trocadas foi a mensagem que o vestuário de uma protagonista, uma técnica que todos os dias trocava de roupa, transmitiu, dando azo a que nas redes socais essas roupas e a coleção de bijuteria que exibiu ao longo de quase um ano, tenham sido muito criticadas.
Em termos políticos, ser é parecer. Teria sido bom que um consultor de Imagem ou Comunicação tivesse advertido a técnica de saúde para incoerência dos trajes garridos e das bijuterias originais que exibia todos os dias, quando anunciava o número de óbitos e de internamentos no nosso país. Sendo aparentemente uma técnica competente, esta competência era afetada na opinião pública pela imagem de futilidade que transmitia de forma não verbal. Para a comunicação de crise devia ter sido aconselhada a vestir roupa clássica, de cores sóbrias apenas aligeiradas por algum pormenor colorido. Houve quem comentasse que nunca conseguia ouvir as primeiras palavras dela, tão fascinado ficava com aquela escolha de roupa e acessórios para anunciar factos dramáticos.
Em comunicação de crise a imagem das autoridades que dão a cara tem de ter uma imagem muito sóbria e, por isso, os homens costumam ter mais facilidade em serem porta vozes em tempo de crise. Um fato escuro com gravata discreta não distrai ninguém da mensagem que se quer passar. Mas não basta ser homem nem ser competente para ser um bom porta-voz.
Creio que todos se lembram de um técnico da Saúde que nos veio dar conselhos para o confinamento natalício, com uns bigodes de gato, voz afetada e linguagem rebuscada, que foi alvo de chacota geral. É certo que todos fixamos a sugestão da “troca de prendas no alpendre” e da “consoada ao almoço ou ao lanche”. Mas pouca gente segui os seus conselhos de prudência e a operação “Salvar o Natal” traduziu-se no aumento exponencial de número de infetados e de mortes por Covid.
Uma regra básica da comunicação é que menos é mais. Se queremos que a nossa mensagem, aquilo que comunicamos dentro e fora do local onde trabalhamos, gere entendimento e cooperação, devemos eliminar todos os obstáculos a uma comunicação eficaz. Mesmo estando calados, estamos a transmitir mensagens que podem anular aquilo que, de facto, queremos transmitir.