Opinião
O que escrever?
Fui adiando a escrita deste artigo, trabalho e mais trabalho, campanha eleitoral e viagens entre Lisboa e Covilhã, tudo bons pretextos para deixar o artigo para o último dia.
Este é o último dia e, neste dia, não há tema algum de liderança, de empreendedorismo, de mudança, de gestão que me ocorra. Neste dia, hoje, confronto-me, confrontamo-nos, com uma catástrofe, com o horror. O que escrever quando o país, o meu país, no meu interior, passa por momentos destes?
Nada, absolutamente nada me parece relevante, face ao que vejo e leio sobre este incêndio.
Sim, há muito a pensar sobre o ocorrido, sobre a prevenção, sobre a gestão florestal, sobre as nossas opções, sobre a gestão da crise, sobre a cobertura jornalística, mas, de alguma forma, quase parece ilegítimo escrever sobre outra coisa que não a manifestação de pesar, de choque, de luto, de disponibilidade.
Mas, se esse é o sentimento natural, imediato, humano, não é menos verdade que esta catástrofe nos obriga a mais do que isso.
O que se passou, da forma como se passou, exige-nos mais do que isso: que procuremos perceber onde falhámos (sim, uso o plural), porque não é possível dizer àquelas populações que não lhes falhámos. Esta busca, que tem de ser serena, oportuna, ponderada, não é demonstração de frieza, mas de respeito.
Devemos a cada uma das vítimas deste horror uma busca empenhada na tentativa da não repetição. É mesmo das coisas mais importantes a fazer. Não para a costumeira responsabilização que quase sempre cai sobre um bode expiatório, mas para que possamos melhorar procedimentos, melhorar estratégias, aprofundar defesas. Se começarmos todos à procura do responsável, acabaremos provavelmente por não melhorar nada.
Deixemos o quem e concentremo-nos no como. Como melhorar?
Não era sobre isto que queria escrever. Queria escrever sobre outro tema qualquer que, por momentos, pudesse criar a ilusão de que tudo segue igual, que nada mudou. Mas alguma coisa teremos de mudar.