Entrevista/ “Numa pequena empresa, todos temos de fazer um pouco de tudo”

Francisco Bento dos Santos, diretor-geral da Quinta do Monte d’Oiro

Francisco Bento dos Santos lidera a Quinta do Monte d’ Oiro desde 2012. Um projecto vitivinícola familiar iniciado há 20 anos pelo pai, o especialista gastronómico José Bento dos Santos. Os seus vinhos somam prémios e já ultrapassaram as fronteiras nacionais.

Que balanço faz dos 20 anos de atividade da Quinta do Monte d´Oiro?
Muito positivo. Foram 20 anos de muita aprendizagem, grandes alterações no mundo em geral e no sector vitivinícola em particular, construímos muita coisa, levámos o nome do país até lugares tão distantes, uma pequena equipa que conquistou tanto. E, contudo, para os “primeiros 200 anos” que a Madame Rotschild dizia serem os mais difíceis, ainda nos falta um percurso tão longo… Mas, sem qualquer dúvida, estamos no bom caminho!

Quais os maiores desafios que encontrou pelo caminho desde que assumiu a direção da empresa?
Apesar de acompanhar o projecto vitivinícola da QMdO desde o início (ao longo destes 20 anos, portanto), até assumir a gerência da empresa trabalhei num grupo empresarial grande, onde havia um departamento de compras, de informática, de recursos humanos, etc. Ora, numa pequena empresa, todos temos de fazer um pouco de tudo e a gestão corrente consome muito tempo. Ter a capacidade de distanciamento para tomar decisões estratégicas é talvez o maior desafio – e que se coloca diariamente.

Se pudesse, o que teria feito de diferente?
Em 20 anos, certamente muita coisa. Mas não me arrependo de nada, porque as más opções são muito pedagógicas e fundamentais para o processo de aprendizagem e evolução. A única convicção é que poderíamos ter um portefólio menor e mais focado, mas cada um dos vinhos que produzimos nasceu por uma determinada razão e conta uma história específica, não é razoável pensar que à época as decisões pudessem ser diferentes.

O que mais aprendeu com o seu pai?
Tudo! Mas, tentando destacar apenas duas lições, diria a famosa frase “o ótimo é inimigo do bom” (Voltaire) e outra que o meu pai sempre me ensinou: “dá tanto trabalho fazer bem feito como mal feito”. Fascinam-me ambas e, sobretudo, conjugá-las. Parecem antagónicas mas complementam-se na perfeição: a excelência aliada ao pragmatismo!

Como têm dado a conhecer os vossos produtos?  
A comunicação é absolutamente fundamental, seja direta (por exemplo, nas redes sociais) ou indireta (através da imprensa, opinion leaders, etc). Mas também apostamos numa distribuição alargada (dentro da nossa pequena produção, claro) para que a própria presença dos vinhos no mercado seja um veículo de divulgação. E, claro, todo o nosso trabalho no terreno, participando em provas, apresentações, jantares vínicos, etc.

Qual a estratégia que têm adotado para colocar a Quinta do Monte d`Oiro no mapa dos grandes vinhos portugueses?
Desde a primeira hora que a nossa estratégia foi elaborar vinhos de altíssimo gabarito, que pudessem ombrear como que de melhor se produz em Portugal e no mundo. Sempre procurámos atingir a excelência, começando logo na vinha a trabalhar para obter as uvas da melhor qualidade, que depois tratamos com todo o cuidado e rigor na adega. Não há um segredo único, é uma soma de inúmeros detalhes que fazem a diferença no final.

Como procuram inovar?
A nossa enóloga (Graça Gonçalves) foi professora universitária e investigadora, tem grande apetência e sensibilidade para a área da inovação e desenvolvimento. Estamos obviamente sempre a aprender e procuramos melhorar os nossos processos internos, seja em termos produtivos puros (viticultura e enologia) seja, por exemplo, na área logística ou comercial.

Quanto faturaram no último ano?
830 mil euros, dados de 2016 porque ainda não apurámos as contas de 2017.

Quanto representa o mercado interno no negócio?
Cerca de 40%.

E países como Angola, Brasil, China, EUA, França, Inglaterra e Luxemburgo?
A exportação, como um todo, assume um peso de 60%, onde se incluem os países referidos (exceto, atualmente, o Reino Unido) mas também o Canadá, Bélgica, Suíça, Holanda, Finlândia, República Checa, Suécia e Taiwan.

Quais os maiores desafios que enfrentaram na internacionalização da marca?
Hoje em dia o panorama já é completamente diferente (embora o país ainda tenha um longo caminho a percorrer), mas a total ausência de imagem de Portugal enquanto produtor de vinhos de mesa era, e no fundo ainda é, uma das maiores dificuldades. Não interessa fazermos o melhor vinho do mundo (mesmo que seja reconhecido como tal) se o mercado não tiver em boa conta os vinhos portugueses de uma maneira geral. Depois, as dificuldades de qualquer pequeno produtor face ao grande player, no fundo uma questão de escala

Que conselhos daria a um jovem produtor de vinho?
Definir bem o conceito que pretende, estudar o mercado/concorrência, não cair na tentação de criar demasiados rótulos, dar pequenos passos mas seguros, não fazer investimentos “faraónicos” logo ao início, aprender a comunicar o seu vinho junto dos vários tipos de público.

Projetos para o futuro…
Este ano, 2017, em que celebramos o 20.º aniversário da nossa 1.ª vindima, plantámos mais nove hectares de vinha. Ainda vão demorar a produzir as primeiras uvas (e mais ainda até ao primeiro vinho chegar ao mercado), mas é um enorme projeto para nós – mais 45% de área plantada – e que não se esgota na plantação. Bem pelo contrário, agora é que tudo começa!

Respostas rápidas:
O maior risco: sair do “conforto” de um emprego/carreira num grupo empresarial para abraçar a 100% um pequeno negócio familiar
O maior erro: só consultar um advogado depois dos problemas aparecerem
A melhor ideia: diversificar mercados e parceiros
A maior lição: nada pode ser dado como garantido ou eterno, tudo pode mudar a qualquer momento
A maior conquista: conciliar o legado fulcral do meu pai com a minha própria visão do negócio

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