Opinião

Menos impostos, mais salários

Ricardo Monteiro, comentador de política internacional e economia

Tenho quatro filhos e quatro noras, todos licenciados ou mestrados. Dos oito, sete vivem e trabalham no estrangeiro. Os meus cinco netos também. Apenas uma razão fez com que partissem: a procura de uma carreira profissional bem remunerada. Cá não seria possível.

Nenhum deles pensa ou pode regressar. Só a minha filha continua por cá. O meu filho mais novo ganha um salário bruto inferior ao de minha filha, mas leva o mesmo valor para casa. Em Barcelona, onde os impostos são dos mais altos de Espanha, paga menos IRS e contribuições sociais do que ela em Portugal. Os mais velhos, com 41 e 39 anos, têm remunerações líquidas equivalentes ao salário do CEO da CGD em Portugal, o mesmo que foi considerado de tal forma elevado há uns anos que foi parar ao Parlamento e resultou na impossibilidade do nomeado ocupar o posto para que tinha sido contratado. Nenhum deles desempenha, nas suas empresas, um cargo que se compare ao CEO da CGD tanto em importância como em responsabilidade embora ocupem ambos cargos de direção. Mas têm o privilégio de trabalhar em países onde a concorrência por talento, a carga fiscal e a produtividade permitem remunerações substanciais, tanto nos salários brutos como nos salários líquidos.

Os meus filhos e noras são completamente comparáveis à maioria dos jovens portugueses qualificados que procuram o estrangeiro para construir a sua vida. Terão sido aproximadamente 100.000 nos últimos cinco anos. Como cada licenciado custa cerca 100.000 euros ao Estado, cada ano desperdiçam-se 2.000 milhões de euros de gasto público e não se cobram 65 milhões em IRS (se ganhassem o salário médio) e 45 milhões em contribuições para a segurança social.

Que realidade justifica esta fuga maciça?

Portugal tem o 30.º salário médio mais baixo entre os 38 países da OCDE. Com os nossos 32.000 dólares anuais estamos muito mais próximos do México, o último classificado, com 16.500 dólares, do que do primeiro, a Islândia com 79.000 dólares por ano. Obviamente que é para países como os Países Baixos (63.000 dólares) e a Suíça (77.000 dólares) que os nossos jovens emigram.

Portugal tem o 4.º esforço fiscal mais elevado da Europa. O “sacrifício” exigido aos cidadãos pelos recursos que cedem ao Estado só é excedido pelo “sacrifício” exigido a gregos, croatas e franceses. Todos os outros países dão mais folga fiscal aos seus cidadãos. Os holandeses, por exemplo, têm o 4.º esforço fiscal mais baixo da Europa. Não é de admirar que a Holanda tenha substituído o Reino Unido como destino preferido da nossa emigração.

Portugal é também o terceiro país menos produtivo da Europa. Apenas a Grécia e a Eslováquia estão pior que nós. Não há capital em Portugal para investir nas empresas e permitir que o trabalho se revele mais produtivo e, daí, pagar melhores salários. Como o mercado de capitais é mundial, apenas poderíamos atrair mais investimento se o capital fosse melhor remunerado no nosso país. Mas, o facto de cobrarmos o IRC nominal mais alto da Europa, e o quarto em taxa efetiva, faz com que o dinheiro mais facilmente se encaminhe para outros países e não para o nosso.

Resumindo, os salários são baixíssimos, os impostos são altíssimos e a única forma de subir os primeiros de forma estrutural, o investimento em capital, é-nos vedada, uma vez mais, por uma fiscalidade sufocante.

Não será amanhã que poderei ir buscar os meus netos à escola…

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Ricardo Monteiro

Ricardo Monteiro

Ricardo Monteiro é ex-presidente global da Havas Worldwide e ex-chairman global da Havas Worldwide,empresa de marketing e publicidade com presença em mais de 70 países e líder em Portugal. É speaker internacional, comentador de política internacional e economia na CNN e professor convidado da Porto Business School. Foi administrador não-executivo na Sonae MC, e special advisor no jornal Público entre 2018 e 2022. Ricardo Monteiro é casado com Leonor Jesus Correia, pai de quatro filhos e cinco vezes avô. Os... Ler Mais..

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