Martha Matilda Harper, a percursora do franchising nos EUA
De empregada doméstica, chegou a empresária de sucesso. Em 1891, Martha Matilda Harper tornava-se na primeira empresária a criar um franchising nos Estados Unidos. Sabe de quem falamos?
Martha Matilda Harper é um nome de que, provavelmente, nunca ouviu falar, mas de quem se vai lembrar na próxima vez que for a um cabeleireiro. Porquê? Porque esta mulher desenvolveu a cadeira reclinável para lavar o cabelo, hoje vulgarizada em todos os salões. Mas não só. O Atlas Obscura conta-nos a história desta mulher.
Criadora de uma linha de produtos capilares mais naturais, implementou as massagens no couro cabeludo e abriu o seu primeiro salão em 1888 com 360 dólares, as suas poupanças de uma vida. Uma ano depois, Martha tinha dado oportunidade a centenas de mulheres de terem os seus negócios e arrecadado uma fortuna.
Mas desengane-se quem pensa que o sucesso caiu do céu para Martha. Nasceu em 1857 numa família de poucas posses em Ontário, no Canadá, e foi obrigada pelo pai a deixar a sua casa aos 7 anos, para trabalhar como empregada doméstica a uma grande distância de casa.
De casa em casa, numa vida dura de trabalho mal pago durante 22 anos, Martha acabou por ir trabalhar para casa de um médico alemão que lhe falou das suas ideias revolucionárias sobre os cuidados com o cabelo. Este ensinou-lhe a estimular a circulação no escalpe, através da escovagem vigorosa dos cabelos, bem como a importância de uma boa higiene, o que, na altura, não era tido como certo. Ao aplicar os conhecimentos e um tónico capilar desenvolvido pelo médico, Martha comprovou a sua eficácia. Quando este faleceu, deixou-lhe a fórmula do tónico.
Martha mudou-se para os Estados Unidos, onde continuou como servente, desta vez em Rochester, Nova Iorque, e começou a desenvolver o seu próprio tónico, por achar que os produtos capilares que existiam no mercado, faziam mais mal do que bem, pela elevada quantidade de químicos que possuíam.
Poupou todo o dinheiro que conseguia e, três anos depois de ter chegado aos EUA, deixava o serviço doméstico, para abrir o seu primeiro salão de cabeleireiro, com os 360 dólares. Estava-se em 1888 e Rochester vivia tempos de inovação, estando aberta àqueles que eram considerados um pouco estranhos e que tinham ideias estranhas para a época.
Numa altura em que as mulheres arranjavam o cabelo em casa com criadas de quarto ou cabeleireiros ao domicílio e pouco lavavam o cabelo ou faziam-no com sabões, esta mulher sonhava em abrir um salão de cabeleireiro público para mulheres.
Sabendo que não seria fácil convencer as mulheres a arranjarem o cabelo em público, focou-se na sua localização. Para tal, pediu ajuda à sua última patroa, Luella Roberts, uma influente mulher de Rochester que conhecia o seu champô orgânico e cuidados capilares, para garantir um espaço no local mais proeminente da altura, o Powers Building, e colocou à porta uma grande fotografia de si mesma, com os seus muito longos cabelos soltos.
Mas não conseguia atrair clientes. Sem desistir, delineou uma estratégia de marketing. Na porta a seguir, existia uma escola de música para crianças, em que não existia uma sala de espera. Todos os dias via senhoras de posses financeiras à espera no corredor. Convidou essas senhoras a esperarem no seu salão, onde as aliciou para experimentarem os seus serviços.
Depois de 25 anos a servir senhoras, sabia o que elas detestavam. Assim, desenhou uma cadeira reclinável, para que estas não ficassem com champô nos olhos quando lhes lavava o cabelo, um lavatório com um recorte para estas encostarem a cabeça e estarem mais confortáveis e com água corrente. Todo o seu foco estava no serviço ao cliente, pelo que estas experimentavam e rendiam-se aos seus serviços.
Na altura, foram as sufragistas que mais ajudaram a espalhar a palavra sobre o salão de Martha. A esposa de Alexander Graham Bell trouxe a amiga Grace Coolidge, a futura primeira-dama, que trouxe a conhecida ativista Bertha Honoré Palmer. Era uma verdadeira rede de networking de mulheres.
O primeiro passo no que seria o nascimento do franchising foi dado pela insistência de Bertha Honoré Palmer que queria que Martha abrisse um salão na sua terra natal, Chicago, por altura da feira mundial de 1893. Esta disse-lhe que só aceitava numa condição: 25 mulheres teriam de replicar a sua loja de Chicago.
Com poucos recursos para uma tal expansão do negócio, procurou conselho na sua igreja, a Christian Science Church, que já se encontrava em vários pontos do país. O passo seguinte foi replicar o modelo de operações da sua igreja, mas com os salões de cabeleireiro e dar a oportunidade às mulheres de serem financeiramente independentes. Como não tinham dinheiro para comprar a sua cadeira e lavatório, que nunca chegou a patentear, bem como adquirir os produtos, emprestava-lhes o dinheiro necessário para começarem o negócio.
Martha tornava-se pioneira do empreendedorismo social e do franchising, 60 anos antes daquele que é considerado o pai deste modelo de negócio nos EUA, Ray Kroc, com o McDonald’s.
Dos 25 iniciais, estima-se que tenha chegado aos 500 salões, uma rede de escolas de formação para mulheres que ficou conhecida como o Harper Method e uma fábrica onde produzia os seus produtos orgânicos. E assim nasceu um império.
Outra das suas inovações foram os tratamentos que desenvolveu para homens, que incluíam massagens, o que não existia na época. Os seus salões ofereciam babysitting e estavam abertos à noite, para que as mulheres trabalhadoras também pudessem lá ir.
Martha recusou-se a casar até ter o total controlo do seu império. Casou aos 63 anos com Robert MacBain, de 39 anos. Deixou a liderança em 1932, tendo-lhe sucedido o marido, que deturpou o espírito da fundadora, com a introdução de tratamentos químicos e com o fim do que unia os salões. Martha faleceu em 1950, aos 92 anos. A empresa foi vendida nos anos 70, já uma mera sombra daquilo que tinha sido. O último salão Harper de Rochester fechou em 2005.