Como a mais jovem investidora do Dragons’ Den fez do falhanço um sucesso

A primeira empresa de Michele Romanow foi um falhanço. A segunda foi bem-sucedida e a terceira, com um ano de atividade, foi avaliada em 2 milhões de dólares (cerca de 1,8 milhões de euros) e adquirida pela Groupon. Conheça a história da mais jovem investidora do programa canadiano Dragons’ Den.

Michele Romanow integrou aos 30 anos o grupo de investidores do programa canadiano Dragons’ Den, tornando-se na sua mais jovem investidora.

Mas não se deixe enganar, Michele Romanow não é nova no mundo do empreendedorismo e sabe o que é falhar desastrosamente e recomeçar com tudo o que se aprendeu na queda. Aliás, Romanow refere-o como o segredo para o sucesso que tem vindo a acumular com as suas start-ups e investimentos.

Michele é filha de Marvin Romanow, ex-CEO da gigante do gás e do petróleo Nexen, e desde cedo se revelou como uma criança difícil que pensava fora da caixa e não aceitava um não sem tentar o sim. Segundo o Canadian Business, no 5º ano fez um referendo entre os colegas sobre a hora a que iam para a cama porque achava que ia demasiado cedo.

Aos 19 anos estudava engenharia civil na Universidade de Queen e como não queria seguir a área profissionalmente  abriu um café com preocupações ambientais no campus da universidade, tendo entrado em competições de angariação de fundos com o seu modelo de negócio. Não venceu a competição, mas ganhou um parceiro para os negócios seguintes. Melnichuk, um colega de engenharia, assistiu ao pitch e desafiou-a no final a juntarem-se e a vencerem a competição no ano seguinte.

Melnichuk, que tinha sido vendedor de porta-a-porta em criança e não temia o risco, apresentou-lhe Ryan Marien, que acreditava ser a pessoa mais inteligente na área da engenharia e da química e que também tinha uma grande “queda” para analisar modelos de negócio.

Estava reunido o trio empreendedor, mas muita água ainda passaria por debaixo da ponte até ao sucesso.

A criação da Evandale Caviar

Michele Romanow, Anatoliy Melnichuk e Ryan Marien decidiram criar a Evandale Caviar – na altura os empreendedores tinham cerca de 20 anos. A ideia era vender caviar para restaurantes de luxo em todo o mundo.

O negócio começou de forma um pouco desorganizada depois de se terem formado. Os três amigos pegaram no carro de Marien e rumaram até à cidade de Evandale, em New Brunswick, onde existia uma das poucas comunidades naturais do esturjão-atlântico, um peixe cujas ovas são muito famosas na gastronomia. Era o primeiro passo para a nova empresa de pesca que iam criar.

Em Evandale existiam cinco pescadores locais, todos reformados, com licença de pesca do estrujão. O desafio era grande, mas conseguiram convencer um deles a ceder-lhes a sua licença por arrendamento. Mas continuavam a precisar de um pescador no ativo. Falaram-lhes de Ted, que seria a pessoa certa.

Romanow esperou 10 horas por Ted, sentada à sua porta. Durante esse tempo conta que: “pensei, eu licenciei-me em engenharia. Fiz um MBA. E agora estou literalmente a perseguir um pescador”. A espera valeu a pena.

Para conseguirem pôr a Evandale Caviar a funcionar, enquanto unidade sustentável de aquacultura do estrujão, o trio viveu num hotel e teve de aprender todo o processo de pesca e de fabrico do caviar. As noites eram dedicadas a telefonar para restaurantes e hotéis de luxo a quem tentavam vender o produto.

Depois da época da pesca, no verão, conseguiram vender a maior parte do produto que tinham antes de chegar outubro de 2008, quando o mundo do retalho de luxo colapsou, tendo as alterações na legislação de exportação dado última machadada no futuro do negócio.

A falência

Com a crise, a atividade tornou-se insustentável e tiveram de fechar a sua primeira empresa, num duro golpe para todos. Segundo a investidora, foram as lições aprendidas com este falhanço que lhes permitiram posteriormente seguir pelo caminho certo e não sair dele.

Decidiram dar um tempo e Romanow juntou-se à Sears Canada, enquanto diretora de estratégia, onde aproveitou o facto de estar na consultoria interna para ler tudo o que encontrasse sobre estudos de mercado.

O trio juntou-se novamente para uma reunião, em que Romanow contou como estava a explodir uma nova área de mercado em que, empresas como a Groupon, estavam a trazer uma forma rentável de ligar as empresas aos consumidores ao lhes oferecerem descontos de aquisição.

Nenhum deles tinha competências tecnológicas, mas tinham visto ali uma oportunidade… caso conseguissem ser rápidos. Sem tempo para um planeamento meticuloso, criaram uma estratégia. “Teríamos um tweet de uma pessoa famosa que encaminhava para nós, o site seria feito em regime de outsourcing no estrangeiro e lançá-lo-íamos numa festa”, contou Romanow.

Desta vez, o negócio materializava-se na área do comércio eletrónico das promoções, a que chamaram Buytopia. Os jovens empreendedores seguiam no bom caminho com as lições aprendidas com a Evandale, até que uma terceira ideia começou a nascer.

Do 0 aos 25 milhões de dólares em 12 meses

A Buytopia foi lançada no National Women’s Show no final de 2010 com imensos percalços. A empresa que tinham contratado para fazer o site não cumpriu o prazo e no dia do lançamento só tinham uma imagem do layout do mesmo, onde colocaram um botão de compra que levava para a plataforma do Paypal. Mesmo assim conseguiram fazer três vendas que lhes renderam 10 mil dólares (cerca de 8900 euros).  Como refere a cofundadora, “er uma resposta real das pessoas ao passarem o seu cartão de crédito é muito mais importante do que reunir dicas de 18 investidores. Se consegue fazer um teste a uma ideia gastando pouco dinheiro, faça-o e deixe que seja o mercado a dizer-lhe se é uma boa ideia”.

Todo o investimento foi feito pelos fundadores, não por opção mas porque ninguém quis investir. “Se tivesse levado a ideia ao Dragons’ Den não teria investido o meu dinheiro”, confessa Romanow. Assim usaram dinheiro que ainda tinham da empresa do caviar e investiram o seu próprio dinheiro no bootstrap da Buytopia, que acabou por fechar negócio com a Sears. Foi esse negócio que os colocou no mapa e que os levou a contratos com o Cirque du Soleil e com a Staples.

Lentamente foram comprando sites concorrentes que queriam deixar o negócio até se tornarem num dos maiores do país.

Mas era um negócio complexo que envolvia operações de vendas, tecnologia, criação de conteúdo, marketing por e-mail, atendimento ao cliente, financiamento e comércio eletrónico. Nos dois primeiros anos, os sócios não receberam vencimento. Romanow já desligava o telemóvel à noite. Ainda hoje quando se lembra do stress daqueles dias fica nervosa, como se tivesse acabo por ser um trauma. “Todos os dias tinha medo. Está-se sempre a um dia da falência, os mercados estão a mudar muito rapidamente e, a qualquer momento, tudo pode desmoronar e eu serei a pessoa mais trabalhadora de todos os meus amigos que perdi todas as festas de aniversário, negligenciei o meu corpo e destruí os meus relacionamentos pessoais e ficarei aqui sem nada”, confessou a empreendedora.

Naqueles anos turbulentos, Romanow tentou rodear-se de outros empreendedores. Começou a correr com Nicole Verkindt e foram essas corridas que se tornaram em sessões de terapia, em que ambas partilhavam os seus medos mais profundos. “Quando quer acreditar que as coisas com poucas hipóteses de sucesso vão acontecer, deve rodear-se de pessoas que o conseguiram”, aconselha Romanow. “Caso contrário, terá todos os dias à sua volta apenas pessoas racionais, que lhe dirão todos os motivos pelos quais irá falhar e começará a acreditar nelas”, confessou a investidora.

A proximidade entre os sócios fez uma grande diferença. Em vez de separarem as funções de liderança, abordaram juntos as prioridades e trocavam de responsabilidades sempre que um deles não estava a conseguir fazer progressos. Geralmente discordavam, mas a regra era que, se dois votassem de uma maneira, era isso que seria feito e seguiriam em frente. Mais importante ainda foi o facto de se terem ajudado mutuamente no tempo de crise. A experiência deu-lhes uma referência para medir a adversidade. Quando as coisas pareciam sombrias, voltavam a pensar nos primeiros dias da Buytopia e em como já tinham passado por muito pior.

Durante o processo foram sempre tentando criar inovações na área, como o software de programação on-line Cleverfox, que nasceu da experiência da Buytopia com comerciantes que lutavam por detetar e acompanhar os agendamentos dos clientes. Construíram-no e disponibilizaram-no, mas não teve sucesso.

Outra inovação que desenvolveram foi uma app que permitiu que os consumidores ganhassem descontos na loja ao fotografarem e enviarem os recibos de compra dos produtos selecionados por email. Basicamente, esta app permitira ignorar os revendedores e ligar os subscritores da Buytopia diretamente às empresas dos produtos vendidos. A app foi lançada em agosto de 2013 e contou com a adesão imediata compradores. Mas os gigantes dos produtos de consumo têm ciclos de venda muito longos e não estavam interessados em trabalhar com uma start-up.

O trio empreendedor percebeu que, para conseguir fazer vingar o SnapSaves, como batizaram a app, precisavam de ganhar força no mercado norte-americano. Disseminar o acesso à tecnologia sairia caro e precisariam de capital. Decidiram então viajar para Silicon Valley e para Boston, onde teriam reuniões com investidores e potenciais parceiros. Tinham estabelecido termos com três empresas VC quando a Groupon lhes pediu para se encontrarem.

Mas a reunião não correu como tinham pensado. Em vez de um “namoro”, viram-se entre 10 pessoas e um rol infinito de perguntas. Eric Lefkofsky, o cofundador da Groupon, chegou a perguntar-lhes o que fariam quando os retalhistas lhes caíssem em cima por terem acabado com o seu negócio, o que os levou a pensar que este não teria qualquer interesse na empresa. Mas estavam enganados. Depois de terem saído, Lefkofsky deu indicação à equipa para avançarem com a compra da start-up.

Após um ano, os empreendedores viam-se com ofertas de investimento de capital de risco e com uma empresa avaliada em 25 milhões de dólares (cerca de 22 milhões de euros). Durante as negociações , os sócios pediram o dobro da oferta inicial e acabaram por aceitaram serem adquiridos pelo Groupon.

O acordo foi fechado em junho de 2014 e a Groupon relançou a app alguns meses depois nos EUA como Snap by Groupon. Melnichuk e Romanow mudaram-se para Chicago para trabalhar respetivamente como diretores de vendas e de marketing do Snap e cortaram os vínculos ativos com a Buytopia para evitar eventuais conflitos de interesses. Marien continuou em Toronto, onde continua a ser o CEO da Buytopia.

Voltar a empreender

O Snap acabou por não encaixar na cultura norte-americana e foi redirecionado pela Groupon para fazer antes a ligação entre os revendedores e os clientes.

Ambos os ex-fundadores permaneceram na Groupon por um ano e meio, depois do qual saíram para continuarem a sua senda empreendedora, desta vez enquanto dupla na área das fintech.

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