Opinião

Fast Fashion: O custo real da moda atual

Rita Carvalho, consultora de Comunicação e Imagem

A indústria da moda é um dos setores mais influentes no mundo, não apenas em termos de poder financeiro, mas também na forma como molda tendências, crenças, atitudes, comportamentos e a cultura. Em vez das tradicionais coleções apresentadas em cada estação do ano, as marcas de fast fashion lançam no mercado novos produtos todas as semanas, ao mais baixo preço. Mas já pensou quem é que fez as suas roupas? Quanto é que essa pessoa recebeu e como é a sua vida? E se necessita mesmo de tudo o que compra?

Recentemente, vi o documentário “The True Cost” na Netflix, que aborda uma questão atual: “Quem paga o preço das nossas roupas?” De um lado, as marcas e os consumidores exigem artigos de moda ao mais baixo preço; do outro, os trabalhadores explorados que os fabricam em situações extremas exigem melhores condições.

Lembra-se do colapso da fábrica de roupas Rana Plaza em Dhaka, Bangladesh, em 2013, que originou a morte de mais de 1.000 pessoas e 2.500 feridos? Graças à atenção dos media internacionais, esta foi a primeira vez que muitas pessoas tiveram conhecimento deste lado negro da indústria da moda.

O filme realizado por Andrew Morgan é de 2015, mas o dilema mantém-se: necessitamos de uma revolução na área da moda. Para tal, foi criado o movimento Fashion Revolution (2013) em 90 países. O que se pretende é fomentar novos hábitos de consumo mais sustentáveis, que respeitem os recursos, o meio ambiente e a mão de obra, bem como valorizem a criatividade e a distribuição de lucros. Ou seja, a indústria global têxtil deve ser lucrativa, mas não à custa das pessoas e do planeta. Esta não deve visar apenas a maximização do lucro e a vantagem competitiva em relação aos concorrentes.

Neste âmbito, a organização criou a Fashion Revolution Week, envolvendo milhões de consumidores em todo o mundo, que desafiam as grandes marcas a responder a esta pergunta: #whomademyclothes, ou seja, “Quem fez as minhas roupas?”. Com esta questão, a Fashion Revolution pretende gerar o debate a nível global sobre a transparência na cadeia de fornecimento e inspirar as pessoas a pensarem de forma diferente e a terem um impacto positivo na sociedade, tornando-se consumidores mais conscientes. O objetivo é tornar a indústria da moda mais justa, segura e limpa, pois os nossos hábitos de compra e argumentos têm o poder de mudar o sistema, se trabalharmos em conjunto.

Durante uma hora e meia, o documentário funciona como uma chamada de atenção para um problema que poucos conhecem ou de que têm consciência: o verdadeiro impacto do consumo excessivo e da moda descartável na vida das pessoas e do planeta. E acreditem que esta “wake up call” é como um “murro no estômago”, pois não é possível ficar indiferente a este fenómeno.

O verdadeiro impacto da Fast Fashion

# Os baixos preços dos artigos resultam da exploração da mão de obra em países em desenvolvimento, tais como o Bangladesh, a Índia e o Camboja, cujos colaboradores recebem em média dois dólares por dia, trabalhando muitas vezes em situações precárias, de forma a que seja possível comercializar peças de vestuário ao mais baixo preço.

# Cerca de 75 milhões de pessoas trabalham na indústria da moda, 80% das quais são mulheres.

# O uso intensivo de pesticidas e de agentes químicos utilizados na produção de algodão e no tingimento dos tecidos é a causa de muitas doenças nas comunidades, já que é um processo agressivo para o meio ambiente, com impacto no solo e na água.

# O elevado volume de água utilizado no processo têxtil afeta os recursos naturais do planeta, sendo a segunda maior indústria em consumo de água, depois do setor alimentar. Para produzir uma t-shirt são necessários 2.720 litros de água.

# A moda é a segunda indústria mais poluente do mundo, depois do petróleo.

# O consumo de peças de vestuário aumentou 500% nos últimos 20 anos com a comercialização de produtos de baixo preço e cerca de 40% das roupas raramente ou nunca são usadas.

# O fabrico de vestuário é a terceira maior indústria do mundo, a seguir ao setor automóvel e de produtos eletrónicos, tendo gerado uma receita de 3 mil milhões de dólares.

# A moda descartável representa um aumento considerável de desperdícios e nem todos os materiais são biodegradáveis, como o poliéster e o nylon. Uma peça de roupa usada menos do que cinco vezes e deitada fora após um mês produz, em média, mais 400% de emissões de carbono do que um artigo usado 50 vezes durante um ano.

# Nos EUA, 10,5 milhões de toneladas de roupas vão para os aterros todos os anos e 95% das peças poderiam ter sido recicladas.

# A fibra sintética mais usada na indústria têxtil em todo o mundo, o poliéster, requer em média 70 milhões de barris de petróleo todos os anos e leva mais de 200 anos para se decompor nos aterros.

Pode encontrar mais informação no Fashion Revolution White Paper (dezembro de 2015).

O papel dos consumidores e das marcas

Enquanto consumidor, o primeiro passo é envolver-se neste debate e escolher quais as marcas de roupa que pretende suportar com o seu dinheiro. Existem projetos que apoiam as produções locais, fabricam roupa com matérias-primas sustentáveis e proporcionam condições de trabalho dignas. Criadores como Stella McCartney e Ralph Lauren estão a tentar reformular as práticas da indústria, usando tecidos orgânicos ou tecidos feitos de reciclagem de materiais, de modo a reduzir o desperdício de água, energia, tempo e produtos químicos. Por isso, investigue mais sobre as marcas que consome no Fashion Transparency Index de 2017.

Além disso, consuma de forma mais inteligente. Compre apenas o que realmente necessita e aumente a longevidade das suas peças de vestuário e calçado, adquirindo também roupa em segunda mão. Pode, ainda, publicar uma foto nas redes sociais com a etiqueta da sua roupa, fazer tag da marca e colocar a hashtag #whomademyclothes, bem como escrever mensagens às marcas fast fashion, solicitando um maior compromisso e transparência em todo o processo.

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