Opinião
‘Falinhas-mansas’, ‘capatazes’ e outras máscaras
Não é só nos desfiles de Carnaval que as máscaras são precisas. Também nas empresas as caricaturas e os estereótipos nos ajudam a sorrir com o que se passa no nosso dia-a-dia.
Acredito que uma das funções importantes do Carnaval é libertar-nos, para observar o que nos rodeia com a distância e a liberdade de olharmos para caricaturas e não para pessoas concretas. Os traços exagerados dessas representações acabam por ser reveladores e permitem-nos trazer um certo humor às relações, por vezes difíceis, com que temos que viver todos os dias… E isso também é verdade para as nossas relações no trabalho.
Trago-vos, por isso, duas máscaras para o Carnaval deste ano: os ‘falinhas-mansas’ e os ‘capatazes’ das nossas organizações.
Nas empresas, os ‘falinhas-mansas’ são aqueles que procuram convencer os outros, persuadindo-os a fazer o que eles querem, mas sem tomar uma posição muito afirmativa. Os ‘falinhas-mansas’ habituaram-se a levar a água ao seu moinho sem provocar conflitos e, quando podem, não assumem uma posição clara entre dois extremos, ficando algures no meio. Mas são eles que procuram criar pontes entre essas posições, percebendo o que colegas e clientes realmente querem e preocupando-se com o impacto de cada decisão.
Já os ‘capatazes’ não se podiam preocupar menos com os resultados do que fazem. Não porque não se importem com esses resultados, mas por estarem seguros de que as suas decisões são sempre corretas. Onde os ‘falinhas-mansas’ hesitam em decidir, os ‘capatazes’ fazem logo uma escolha. Por acreditarem que só eles sabem como é o mundo real, pensam que a sua missão na vida é mandar os outros fazer o que acham que é correto. Se não gostarem dos resultados, claro que a culpa é de quem executou o plano, porque falhou, certamente, em qualquer coisa…
Os instrumentos de gestão preferidos dos ‘capatazes’ são a cenoura e o chicote. Acreditam que as pessoas correm para apanhar a cenoura que lhe colocam à frente e que a única forma de corrigir os erros é com chicotadas (metafóricas, espera-se). O seu palco preferido é uma reunião de controlo de projeto, com muita gente sentada à volta de uma mesa, à espera de que o ‘capataz’ de serviço pergunte a cada um pela execução das ações que lhe cabiam. Se o que ouve lhe agrada, um elogio lacónico é seguido por um convite para os outros seguirem o bom exemplo. Se, pelo contrário, há uma contrariedade, o ‘capataz’ explica logo que é a última vez que ouve desculpas. Na próxima reunião, é bom que a vítima traga boas notícias, caso contrário mais vale não aparecer.
Se estas máscaras são divertidas em separado, juntas atingem o seu perfeito potencial. Imaginem dois ‘capatazes’ a competir pelos prémios que imaginam estar reservados para o “o mais obstinado”, “o mais exigente” ou “o mais execrável”. Já dois ‘falinhas-mansas’ podem ficar eternidades a tentar vencer o outro pelo cansaço, sem nunca dizerem claramente o que pretendem. Quando um ‘falinhas-mansas’ e um ‘capataz’ têm que trabalhar juntos, duas coisas podem acontecer. É possível que se complementem, como o Dr. Jekyll e o Sr. Hyde, com um a fazer estragos e o outro a tentar repará-los, mas também é frequente que entrem em choque permanente, como fogo e água, até que um deles desista ou se converta.
Qualquer semelhança com a realidade que vive no seu trabalho não é pura coincidência. Lembre-se de sorrir na próxima vez que se cruzar com um ‘falinhas-mansas’ ou com um ‘capataz’ ou quando olhar para si próprio e reconhecer um pouco de uma ou de outra máscara… Mas não se esqueça de que estas máscaras são invisíveis. Por isso, só quando damos por elas na nossa cara, é que podemos decidir tirá-las.