Ex-assessor de Clinton acredita ter a receita para paz mundial: mais start-ups

Steven Koltai trabalhou dois anos para a ex-secretária de Estado americana e candidata democrata à Casa Branca. Durante esse tempo, deu-se conta do potencial que a criação de emprego tem para assegurar a estabilidade política e evitar a violência e os fundamentalismos. Depois de sair da Casa Branca, deu um novo impulso ao Global Entrepreneurship Program.

O desemprego gera mal-estar. Por isso, a paz mundial está estreitamente ligada à taxa de desemprego. Para que a violência cesse, uma receita eficaz pode ser a criação de empresas, tanto start-ups de base tecnológica como sem ela, naqueles países onde os conflitos estão, infelizmente, na ordem do dia: mais empresas, mais postos de trabalho e, portanto, menos conflito social. Pelo menos essa é a receita que está a tentar promover um antigo assessor de Hillary Clinton.

Steven Koltai, filho de húngaros que fugiram do país quando era criança, por altura da invasão soviética de 1956, trabalhou com a ex-candidata democrata durante a sua função no Departamento de Estado.  Foi conselheiro para temas de empreendedorismo entre 2009 e 2011. E tinha experiência: tinha trabalhado nos anos 80 no desenvolvimento da SES, uma das maiores empresas de telecomunicações dos Estados Unidos. Além disso, de 1987 a 1993 foi vice-presidente de Estratégia e Desenvolvimento Corporativo na Warner Bros e também investiu em vários projetos como business angel.

Durante o seu trabalho com Clinton, Koltai viajou por numerosos países e pôde conhecer em primeira mão as iniciativas que as comunidades locais estavam a levar a cabo para fomentar a criação de postos de trabalho, assim como as medidas que o governo dos Estados Unidos tratava de pôr em movimento. Na altura, a administração Obama estava a conceder ajudas a países como a Turquia, Indonésia, Egipto ou Líbano. No total, antes e depois do seu período de permanência em Washington, Koltai visitou mais de trinta países em trabalho.

Com toda essa experiência, o atual objetivo de Koltai é que as suas ideias acerca do empreendedorismo se propaguem por todos os recantos do mundo. Foi neste sentido que fundou a Koltai & Co e acaba de publicar um livro, ‘Peace Through Entrepreneurship: Investing in a Startup Culture for Security and Development’ (‘A paz através do empreendedorismo: investir na cultura ‘start-up’ para a segurança e o desenvolvimento’).

A sua filosofia é clara e concisa: “O desemprego é a origem do mal-estar social que ameaça a segurança dos Estados Unidos. Promover o espírito empreendedor é o remédio”.

Projeto de empreendedorismo para a criação de emprego

Durante o seu trabalho na administração, “cristalizei o que já pensava (motivo porque aceitei o trabalho): há uma ligação muito direta entre empreendedorismo, criação de emprego, estabilidade política e paz”, explica Koltai citado pelo El Diario. Para Koltai, investir recursos na criação de start-ups no Médio Oriente pode ter mais efeito do que a diplomacia e a ação militar.

Desde o 11 de setembro até a terrorismo do Estado Islâmico, a região tem sido uma constante fonte de instabilidade a nível global. Para a reduzir, “creio que o modo como o fazemos hoje em dia é muito ineficaz”, afirma Koltai, pelo que sugere um modelo de procura, criação e oferta de emprego.

O objetivo é criar as oportunidades laborais que necessitam os jovens desempregados que se encontram numa situação desesperada. Com efeito, segundo a Organização Internacional do Trabalho, 45% das pessoas que procuravam emprego em 2013 encontrava-se na Ásia meridional e oriental. Combater esses números serviria também, na opinião de Koltai, para aliviar a crise dos refugiados na Europa.

Quando Koltai fala de start-ups, não se trata de criar uma Silicon Valley no Líbano ou no Egipto. O plano do ex-assessor distingue três tipos de empresas: as ‘no tech’ (agrícolas, por exemplo), as ‘low tech‘ (de baixa tecnologia) e as ‘high tech’ (de alta tecnologia). “Há enormes diferenças”, afirma. De facto, as tecnológicas talvez não sejam as melhores para promover a criação de emprego. “Especialmente em países em desenvolvimento, as ‘start-ups’ ‘no tech’ e ‘low tech’ criam mais trabalho do que as ‘start-ups’ ‘high tech’“, afirma Koltai.

Na prática, o importante é que haja “inovação, que não é o mesmo que tecnologia”, escreve no livro. “A minha definição de espírito empreendedor tem que ver com a disrupção, o alto crescimento, a escalabilidade e a criação séria de empregos”.

Por isso, segundo Koltai, “é muito importante ter diferentes tipos de procedimentos e ferramentas” para ajudar cada tipo de empresa. “Já que a maioria dos países em desenvolvimento estão a criar empresas ‘no tech’ e ‘low tech’, é um erro focar-se somente nos tipos de programas que tradicionalmente são para ‘high tech’“.

E para além de criar estes negócios, devem-se promover outros hábitos que contribuam para alcançar a ansiada paz, como promover o comércio local. “Os comerciantes, os donos de lojas e os pequenos empresários e empresárias são muito importantes para o crescimento económico”, defende o especialista.

Estratégia “6+6 ecossistema empreendedor”

A estratégia que Koltai desenhou chama-se “6+6 ecossistema empreendedor” e procura realizar seis ações (identificar, treinar, ligar, financiar, possibilitar políticas públicas e dar reconhecimento), nas quais devem ser implicados outros tantos atores: fundações, universidades, investidores, governos, empresas e ONGs. Para as concretizar, Tolkai inspira-se no Global Entrepreneurship Program, uma iniciativa que o mesmo ajudou a criar quando estava em Washington (foi apresentada em abril de 2010) e que agora quer promover depois da sua independência.

“Esse era o meu propósito quando escrevi o livro”, explica, “porque o que todos os altos cargos fazem é escrever discursos sobre como o espírito empreendedor é importante, e a minha opinião é que isso não é suficiente”. Por isso, procura que se envolvam não só os governos, mas também fundações, organismos e grupos de investidores.

Casos de sucesso: a Singapura da África central

Na hora de apresentar exemplos, Koltai destaca sucessos como o ecossistema de start-ups de Israel ou o caso do Ruanda, que alguns chamam já a Singapura da África Central. Ali, após o genocídio dos anos 90, o presidente Paul Kagame apostou em políticas de promoção das TIC num país de economia muito agrária. As ajudas internacionais e o investimento chinês tiveram um papel fundamental na sua implementação.

Em abril de 2016, o ministro de Informática e Comunicações, Jean Philbert Nsengimana, disse que esperava que ao longo deste ano de 2017 a ligação 4G chegasse a 95 % da população. Entretanto, no mais recente estudo da Transparência Internacional sobre a corrupção que se verifica nos governos, a nação está melhor colocada do que países da União Europeia como Itália, Croácia ou Grécia.

Olhando para o futuro, e apesar do seu passado como assessor de Clinton, Koltai diz ser “muito otimista” quanto à chegada de Trump à presidência dos Estados Unidos. Apesar da “enorme controvérsia” que tem gerado, acredita que a experiência do magnata pode ser decisiva.

“Acredito que todo o mundo está de acordo com o facto de ele ser um empreendedor”, afirma, e espera que, por isso, seja mais consciente “de como é importante o espírito empreendedor para a política externa”. Entretanto, continuará a percorrer o mundo e a trabalhar para que esse sonho de alcançar a paz mundial se torne cada vez mais real.

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