Opinião
Empreender e inovar: é a agricultura do séc. XXI

Apresento o percurso de um agricultor inovador, a chegar aos 70 anos: fez estudos secundários, conseguiu um trabalho administrativo e, nos tempos livres, lia e praticava agricultura amadora no quintal.
Muito tempo depois, ao reformar-se, decide fazer agricultura a sério, pois era do que gostava. Via muitos problemas na sua aldeia, com os agricultores que contraíam empréstimos e depois não podiam pagar, devido às típicas dificuldades que assolavam a agricultura – os preços do que tinham plantado caíam por excesso de produção, ou baixava a produção por ter chovido pouco… –, mas ele queria escapar a elas.
Fala com alguns agricultores da terra e faz algo diferente: estivera há pouco no Sul, numa zona muito quente, onde um amigo estava a explorar uma plantação de tamareiras, em quantidade; quanto mais quente, mais saborosas eram as tâmaras. Alguns problemas da sua aldeia tinham que ver com o muito calor: e descobre que há plantas que se dão bem com ele. Além disso, sabe que a tamareira não exige terra fértil, nem rega regular ou frequente. Como tinha 2 acres[1] de terreno no quintal, compra 130 pés de tamareira, a 6.000 rupias ($95) cada um, feitos por clonagem. Não era um valor pequeno e, para ele, era um risco.
O investimento e a plantação passam a ser motivo de galhofa dos agricultores tradicionais, que nunca tinham visto tâmaras naquela zona! “São plantas do deserto da Arábia”, diziam.
No 3º ano da plantação, já começa a ver frutos abundantes; e, no 4º, cada árvore dá entre 25 a 30 kgs. E agora, como vendê-los? O fruto é considerado bom alimento, completo e saudável, permitindo sobreviver nos desertos, com boa saúde; e havia importação e consumo de tâmaras. Tem a ideia de fazer uma operação de marketing: instala uma pequena banca à beira da estrada, onde há que afrouxar a marcha, e oferece tâmaras a cada transeunte, para que saboreiem. Parecem gostar, talvez por serem oferecidas… e alguns perguntam onde podem comprar e o preço.
O preço de mercado é de 300 Rupias por kilo. Mais tarde, quando a sua produção aumenta, faz um preço especial de 200 Rps aos outros aldeãos. Não tem mãos a medir e vende tudo e com boa margem.
Adquire mais 25 acres de terreno contíguo e planta mais 300 pés de tâmara, de 6 variedades diferentes, em 4 acres. Desta vez, o preço de cada pé é mais baixo, 3.600 Rps ($58), mas, mesmo assim, um valor importante. Anos depois, cada tamareira dá quase 100 kilos/ano.
Mais tarde, de visita a um primo no estrangeiro, vê que ele produz morangos num terreno bem cuidado e que se vendem bem. De regresso, numa boa área livre do quintal, cultiva morangos e permite que os compradores os colham, de modo a verem como é divertida a agricultura.
Ensina aos que têm interesse nisso, mostrando como ele faz, ajudando-os a saírem das plantações tradicionais, como o arroz, algodão, soja e cana-de-açúcar, e a fazer cálculos do rendimento da terra e do trabalho.
A sua ‘pequena’ exploração é toda orgânica, com portas abertas para quantos a queiram visitar e ouvir explicações sobre o modo de cultivo. Ele e o seu filho já ajudaram mais de 35 agricultores com posses a produzirem tâmaras, mas desejam que também os agricultores mais pobres entrem no negócio, que é bem mais compensador do que os outros.
A inovação incremental – pequenos avanços ou melhorias sobre o que se faz –, vai entrando quando se está no negócio, a empreender. Ao surgirem problemas sérios, económicos por exemplo, e ao pensar em soluções, elas surgem com a intensidade da procura: encontra a tâmara, o morango… No século XXI, mais do que chorar por um magro subsídio, ficando dependente dele, importa pensar e construir por conta própria uma boa solução para durar. Ela existe!
[1] 1 hectare=2,4 acres
* Eugénio Viassa Monteiro, Professor da AESE-Business School e Dirigente da AAPI – Assoc. de Amizade Portugal-India