Entrevista/ “É importante preocuparmo-nos com o processo e não somente com o resultado”

Manuel Pizarro, CEO da Advanced Products Portugal

Com mais de 16 anos de experiência, a Advanced Products Portugal foca-se na gestão da cadeia de frio nos setores farmacêutico, alimentar e saúde. Em entrevista ao Link To Leaders, Manuel Pizarro, CEO da empresa, fala dos desafios inerentes a este trabalho, do papel que a logística desempenha na resposta a eventos de crise e dos projetos para o futuro.

A Advanced Products Portugal está neste momento a concluir um projeto de I&D para lançar uma solução que pode contribuir para o aumento de negócio nas indústrias farmacêutica e alimentar. O foco na inovação tem sido uma constante para a empresa, que desenvolve e comercializa soluções tecnológicas que garantem a cadeia térmica de produtos termossensíveis durante operações de transporte, manuseamento e armazenamento.

Ao Link To Leaders, Manuel Pizarro, CEO da Advanced Products Portugal , revelou que “tencionamos continuar a investir em novos materiais mais sustentáveis, com base de nanopartículas e com melhor performance no seu todo. Temos também apostado cada vez mais em soluções smart, que consistem em incluir sensores de monitorização e rastreabilidade nas operações logísticas”.

Até que ponto e em que moldes veio a pandemia alterar a forma de trabalhar na Advanced Products Portugal (APP)?
Relativamente à colaboração interna, tivemos de ser profissionais eficazes nas nossas alterações. Implementamos ferramentas de alinhamento e coordenação da equipa em estreita ligação com os team leaders de áreas específicas. No que toca à cadeia de abastecimento, tivemos de perceber o posicionamento de cada stakeholder, de modo a acautelar e responder às necessidades dos clientes. Adicionalmente, inventariamos de imediato todo o nosso stock para que conseguíssemos responder atempadamente aos pedidos dos nossos parceiros e às necessidades internas.

“A logística está habituada a reagir a cenários extremos e é uma área que conta com constantes investimentos que permitem responder a situações como estas características”.

Como é que a logística portuguesa está a responder aos tempos de pandemia?
A logística está habituada a reagir a cenários extremos e é uma área que conta com constantes investimentos que permitem responder a situações como estas características. Existe uma série de processos e parceiros que, mediante diversas situações, se adaptam e por vezes conseguem alcançar uma melhoria no negócio. No caso da APP, temos um simulador que permite muito rapidamente comparar diferentes cenários, comparando performances térmicas e ao mesmo tempo assegurar soluções eficazes, incutindo desta forma maior segurança nas decisões tomadas.

Este tipo de inovações pode marcar a diferença em situações como a pandemia, visto que com esta ferramenta podemos antecipar se determinada solução será adequada para uma operação de envio/transporte de um produto. Por outras palavras, permitem tomar decisões mais acertadas, redução dos custos operacionais, etc.

Com o mundo a correr cada vez mais riscos naturais, é crucial ter planos de resposta preparados. Qual o papel que a logística desempenha na recuperação e resposta a eventos desta natureza?
Atualmente, os clientes têm uma preocupação cada vez maior com a sustentabilidade que é percetível nas tomadas de decisão. Se a logística não se adaptar adequadamente, os riscos naturais continuarão a existir e a crescer. É importante preocuparmo-nos com o processo e não somente com o resultado. Por outras palavras, temos de considerar como fazemos chegar os produtos ao cliente e não só fazê-los chegar, qualquer que seja o processo para tal. Só desta forma poderemos avaliar o custo global das decisões que são tomadas.

Cada vez mais existem novas formas de mobilidade e possíveis parcerias que poderão evitar que os serviços se tornem redundantes e as organizações que não procurarem este caminho, correm o risco de ficar completamente ultrapassadas. É exatamente por termos estas preocupações que a APP desenvolveu um ciclo de webinares focado na resposta da logística às situações extremas. A “Reconstrução Logística num Cenário de Pós-Desastre Natural” é o tema da sessão de hoje.

“Cada vez mais, e para estarmos mais bem preparados, precisamos ter a indústria prioritária mais próxima, pois o custo de a ter distante pode ser enorme”.

Como caracteriza a capacidade de adaptação da logística portuguesa a este tipo de situações? Estamos preparados?
A situação atual trouxe realidades que nos eram desconhecidas, como a paragem do transporte aéreo. Naturalmente, a adaptação logística teve de ser imediata. Não chegou a existir falta de produto, mas teve que haver uma maior racionalização e capacidade de organização de abastecimentos. Ficou também demonstrado que, devido à globalização, nem sempre temos tudo tão próximo como desejável. Cada vez mais, e para estarmos mais bem preparados, precisamos ter a indústria prioritária mais próxima, pois o custo de a ter distante pode ser enorme.

Conseguimos dar resposta às necessidades essenciais, mas se tivesse sido num espaço temporal maior não teria sido possível, pois poderiam existir grandes ruturas. Vimos indústrias a alterar por completo o seu core e a logística no geral a adaptar-se, mas o custo destas mudanças só vamos conseguir avaliar no futuro. Em alguns casos, estas situações até podem trazer novas oportunidades.

Quais os desafios que se colocam ao transporte de mercadorias, principalmente de alimentos no futuro?O crescimento da população mundial implica que tenhamos a necessidade de criar eficiências de produção e ao mesmo tempo redes comerciais e de abastecimento mais rápidas e flexíveis. Um grande problema no setor alimentar é também o desperdício imenso que existe. No caso da APP, a utilização de vários tipos de sensores de temperatura e de geolocalização nas nossas soluções traz uma maior transparência, cria sistemas mais refinados e em muitos casos, permite uma colaboração entre os players na cadeia de fornecimento de alimentos.

Na realidade existe um crescendo de novas tecnologias que permitem, através das vendas online de fruta e legumes frescos a nível global, maiores eficiências impulsionadas por custos de envio reduzidos e pelo interesse crescente dos clientes. Hoje em dia é cada vez mais fácil para o consumidor rastrear todo o caminho que o seu produto fez, tendo assim acesso a uma panóplia de informações que pesam na sua decisão de compra. Esta “nova” realidade leva a uma maior fidelização do cliente e a cadeia de abastecimento alimentar só conseguirá salvaguardar o interesse de todos se melhorarmos as eficiências logísticas, aumentado desta forma a vida útil dos produtos.

Que balanço faz destes mais de 16 anos de existência?
As mudanças que ocorreram nestes 16 anos foram imensas e a APP tem conseguido adaptar-se às diferentes situações e assim terá de o fazer no futuro para conseguir ter sucesso. A proximidade que a nossa equipa técnica tem com as universidades e centros de investigação foi e está a ser crucial. Cada ano que passa desenvolvemos novas soluções para a cadeia térmica, mas, com a globalidade e excesso de informação disponível, temos noção que a nossa existência só é viável se tivermos uma componente de Investigação & Desenvolvimento muito forte.

Mesmo na situação atípica que vivemos, conseguimos olhar para o futuro sempre com esperança, sabendo que se outras organizações se adaptam, nós também conseguiremos fazê-lo com certeza.

“Para além do mercado nacional, que é o principal, temos um fluxo de clientes regulares na América do Sul e Ásia”.

Que mercados são mais representativos para a APP neste momento?
Para além do mercado nacional, que é o principal, temos um fluxo de clientes regulares na América do Sul e Ásia. Contudo, a pandemia deu-nos algum acesso a mercados mais próximos (Europa) dada a maior facilidade de abastecimento que permite um custo global mais reduzido. Naturalmente, teremos de equacionar o preço no seu todo, contemplando novas oportunidades de emprego, ruturas de abastecimentos, processos de produção e prazos mais rigorosos e cumprimento de obrigações.

Quais são os vossos principais clientes?
Atuamos essencialmente na área farmacêutica e alimentar. Atualmente, são os laboratórios farmacêuticos e as respetivas empresas logísticas. Temos também clientes da distribuição de farmácia e hospitalar, do retalho alimentar e das plataformas online de alimentos e medicamentos.

No último ano onde é que a APP centrou mais a sua atividade: no mercado interno ou externo?
Temos apostado fortemente no mercado global e nos nossos parceiros que fazem exportação. Estas parcerias permitem-nos alcançar novos mercados, mas nunca descuramos o mercado interno, que é ainda o nosso principal mercado. Claro que este ano nos obrigou a canalizar as energias para o mercado nacional, onde o aumento das vendas online e o negócio que daí advém para a APP ajudou-nos a crescer e a consolidar essa aposta.

“Temos en curso uma estratégia de internacionalização através da criação de uma rede de agentes internacionais que nos permita aumentar o peso do mercado externo na nossa atividade”.

Qual o peso do mercado português?
O mercado português corresponde a 80% do nosso negócio. Temos en curso uma estratégia de internacionalização através da criação de uma rede de agentes internacionais que nos permita aumentar o peso do mercado externo na nossa atividade.

Qual é o top 5 de países para onde vendem?
Para além de Portugal, vendemos de forma significativa para a Arábia Saudita, Angola, Brasil, Espanha e Argentina.

Com as limitações de transporte para entrar em determinados países e até com as limitações de CO2, quais os desafios que enfrentam nos próximos meses?
Temos sempre a preocupação de escolher parceiros com óticas de sustentabilidade. Nós próprios vendemos soluções de teor ecológico, o que nos permite afirmar que não antecipamos grandes desafios.

Qual será a vossa estratégia? Quais os planos de investimento ou de internacionalização novos a curto médio prazo?
A nossa estratégia de internacionalização passa sempre por conhecermos amplamente os nossos mercados alvo, pois sem esse conhecimento é importante para nos estabelecer. Consequentemente, teremos de estabelecer parcerias vitais como a que fizemos com a AEP e os seus agentes, para conseguirmos utilizar os seus estudos de mercado, de projetos de sucesso e de potencias compradores.

Para além disso, procuramos potenciar vários eventos de networking, incluindo o ciclo de webinares que organizamos durante este mês de julho. Apesar das feiras se encontrarem adiadas, estamos constantemente a tentar diminuir o distanciamento entre a APP e os nossos parceiros e potenciais clientes. Ainda este ano, estamos a capitalizar a nossa participação em eventos onde estivemos no ano passado como Fruitlogistics em Berlim e Madrid, na Gulfood – Feira no Dubai, e na Pharma Cold Chain Bruxelas.

Temos também em curso o projeto Forward que passa por identificar, formar e colaborar continuamente com agentes internacionais que nos permitam ter sucesso em mercados internacionais. Por fim, procuramos estar sempre ligados às principais associações (como a APLOG, a PortugalFoods, o Health Cluster Portugal e a Cotec) para conseguirmos estarmos sempre atualizados relativamente às melhores práticas do setor.

“No global da sua atividade, a APP faturou, no ano passado, dois milhões de euros. De realçar que 65% das vendas foram obtidas com soluções para a indústria farmacêutica e que a exportação representou 15% desse valor”.

 Qual foi o volume de negócios do último ano e que crescimento perspetiva para este ano?
No global da sua atividade, a APP faturou, no ano passado, dois milhões de euros. De realçar que 65% das vendas foram obtidas com soluções para a indústria farmacêutica e que a exportação representou 15% desse valor. No que toca à distribuição alimentar, o balanço entre vendas internas e exportação já é mais equilibrado, com cerca de 50% para exportação. Mesmo com a situação de pandemia que marca toda a atividade neste ano, procuramos crescer na ordem dos 30%. 

Que projetos tem planeados para o futuro?
Estamos neste momento a concluir um projeto de I&D que nos vai permitir lançar uma solução que pode contribuir para um aumento de negócio nas indústrias farmacêutica e alimentar. Este projeto também nos ajudará a dar um novo impulso e a reforçar o projeto Forward dos agentes internacionais. Estamos a desenvolver novas áreas de negócio, nomeadamente na área de prevenção. Nesta área, estamos a desenvolver novas soluções e a fazê-las chegar aos nossos clientes e parceiros, tendo em conta que estamos no meio dum estado pandémico e já temos bons sinais desta aposta.

O foco na inovação será cada vez maior e um dos principais drivers para o nosso crescimento. Tencionamos continuar a investir em novos materiais mais sustentáveis, com base de nanopartículas e com melhor performance no seu todo. Temos também apostado cada vez mais em soluções smart, que consistem em incluir sensores de monitorização e rastreabilidade nas operações logísticas.

Comentários

Artigos Relacionados