Opinião

Direitos Humanos na cadeia de fornecimento – a caminho de um novo paradigma?

Margarida Couto, presidente do GRACE*

À medida que os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável se tornam cada vez mais uma linguagem comum e um “roadmap” universal para a sustentabilidade dos negócios em todo o mundo, também a responsabilidade das empresas pelo respeito dos Direitos Humanos começa a subir na agenda, nomeadamente dos legisladores, tudo indicando tratar-se de um tema que mais tarde ou mais cedo deixará de pertencer apenas ao “mundo da responsabilidade social”, para entrar no “mundo da compliance”.

Prova disso mesmo é o facto de a Comissão Europeia se encontrar a preparar legislação que impõe que as empresas que operam na União Europeia (independentemente do país onde tenham a sua sede) implementem procedimentos de diligência devida (due diligence) destinados a prevenir violações de Direitos Humanos não apenas nas suas próprias operações diretas, como na sua cadeia de fornecimento direta e indireta, procedimentos esses que deverão abordar os impactos adversos causados, tanto de um ponto de vista social como ambiental.

Embora a proposta da Comissão só deva ser conhecida em junho, tudo indica que a nova legislação, se vier a ser viabilizada, se aplicará a todas as empresas, e não apenas às de maior porte, ainda que com exigências mais pesadas para estas últimas, nomeadamente no que se refere ao dever de divulgação das violações de Direitos Humanos que se tenham verificado.

Depois de a França ter aprovado em 2017 uma lei que impõe às empresas um “dever de vigilância” no que se refere ao respeito pelos Direitos Humanos, também o Governo alemão aprovou no passado dia 3 de março uma polémica proposta de lei, que obriga as empresas alemãs a implementar procedimentos de diligência devida na sua cadeia de fornecimento e que prevê sanções muito pesadas em caso de incumprimento (até 2% do volume de negócios global para empresas que tenham um volume de negócios médio nos últimos 3 anos superior a 400 milhões de euros). Resta saber se o Parlamento Alemão aprovará esta proposta do Governo, não sendo de excluir que a mesma se torne “tema de campanha” nas eleições de setembro, se o processo se arrastar até lá.

Independentemente de se vir a tornar ou não, com maior ou menor rapidez, num tema de compliance, uma coisa parece ser certa: ao implementarem o dever de diligência devida na sua cadeia de fornecimento, as empresas podem detetar riscos e adquirir um conhecimento acrescido das consequências, tantas vezes inesperadas, das suas operações. Isto significa que, à medida que as conclusões dos processos de due diligence são institucionalizadas internamente, a exposição das empresas a potenciais custos reputacionais, jurídicos e financeiros relacionadas com a cada vez mais intolerável violação de Direitos Humanos vai sendo reduzida, traduzindo-se em benefícios de curto, médio e longo prazo.

Exemplos destes benefícios são, entre outros, a atração de investidores, a captação e retenção de talento, além de uma posição comercial privilegiada junto dos consumidores, cada vez mais atentos ao impacto ambiental e social das empresas de que pretendem continuar a ser clientes. Em suma, quanto mais cedo as empresas derem início à implementação de procedimentos de diligência devida em matéria de Direitos Humanos, mais vantagens competitivas adquirirão, e mais ampliarão o seu impacto positivo nas Comunidades em que operam.

Tendo em atenção que os Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos das Nações Unidas (United Nation’s Guiding Principles on Business and Human Rights) constituem, não apenas um excelente quadro de referência, como a maior fonte de inspiração tanto para os legisladores domésticos como para os supranacionais, aqueles Princípios são também um ótimo ponto de partida para as empresas iniciarem a sua jornada de cumprimento estrito dos Direitos Humanos na sua cadeia de valor, antecipando-se à cada vez mais incontornável chegada de exigente legislação nesta matéria!

*Em representação da Vieira de Almeida & Associados – Sociedade de Advogados

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Margarida Couto

Margarida Couto

Margarida Couto é licenciada em Direito e pós-graduada em Estudos Europeus, pela Faculdade de Direito da Universidade Católica de Lisboa. Integra a Sociedade de Advogados Vieira de Almeida & Associados (VdA) desde 1988, sendo a sócia que lidera a área de prática de Telecomunicações, Media e Tecnologias da Informação e a área de prática do Terceiro Sector e Economia Social. É a sócia responsável pelo Programa de Pro Bono e de Responsabilidade Social da VdA, presidindo ao Comité Pro Bono... Ler Mais..

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