Como estão as start-ups a viver a crise? Cinco empreendedores contam a sua experiência.

Como estão as start-ups a lidar com as perturbações que o Covid-19 veio provocar nos seus projetos? Estão a saber ultrapassar as contrariedades do momento? Estão a virar o jogo a seu favor? Falámos com os responsáveis de cinco projetos que nos deram a sua visão dos acontecimentos, bem como os esforços que estão a desenvolver para tentar transformar a crise em oportunidades.

Infinity Book, UP Hill, Climber Hotel, Speak Social e Skoach são as start-ups que aceitaram partilhar com o Link To Leaders as suas estratégias para ultrapassar, da melhor forma possível, o momento conturbado que o ecossistema empreendedor vive perante a pandemia causada pelo coronavírus.

Questionado sobre como está a preparar-se para enfrentar os desafios que a atual situação envolve, Eduardo Freire Rodrigues, CEO da UpHill  – uma start-up que oferece soluções digitais que visam facilitar o acesso dos profissionais de saúde à informação científica mais relevante para a abordagem diagnóstica e terapêutica  – , reconhece que o primeiro desafio  “foi, precisamente, transpor o nosso âmbito de trabalho para esta nova doença. Já o fizemos através da construção de casos clínicos virtuais que permitem aos médicos simular a abordagem a estes doentes, num ambiente seguro e realístico”.

Refere-se ao UpHill Simulate, um software de simulação clínica que apresenta o historial clínico de um doente virtual com um conjunto de sintomas. A partir daqui, o médico pode pedir exames, analisar os resultados, prescrever fármacos, entre outras ações, e assim treinar competências práticas. Por outro lado, e em termos práticos, a start-up adoptou-se ao trabalho remoto, o que, aliás, já fazia anteriormente com alguma regularidade.

Já no caso da Speak Social, uma plataforma que partilha conhecimentos linguísticos e culturais, Mariana Brilhante, cofundadora e CMO, explica que “a rápida capacidade de adaptação e resiliência perante a concretização daquela que é a nossa missão são dois fatores-chave do nosso ADN enquanto empresa social”. Assim, neste momento estão focados, frisou, na criação de uma solução que permita à nossa comunidade manter-se ativa e a interagir através da aprendizagem da língua e descoberta de novas culturas.

Adaptou a sua metodologia para um modelo online em que qualquer pessoa, em qualquer parte do mundo, se pode inscrever para aprender uma língua de forma gratuita e, caso tenha disponibilidade, poder também partilhar a sua própria língua, contribuindo ativamente para o combate à exclusão social. “Queremos garantir que esta pandemia não alimenta ainda mais o isolamento dos grupos mais vulneráveis da nossa sociedade, como idosos, migrantes e refugiados”, concluiu a cofundadora da Speak Social.

Como podem as start-ups ajudar a ultrapassar a crise?
Esta é uma questão de múltiplas respostas. Para o responsável da UpHill, “em tempos de crise, epidemias e outros fenómenos com impacto global, o sentido de urgência que se cria, quase de imediato, exige respostas rápidas”. Neste contexto, refere, “sobressaem as empresas capazes de, por um lado, desenvolver soluções dirigidas às necessidades imediatas e, por outro lado, atualizá-las de acordo com a evolução dessas circunstâncias”.

“(…) existem algumas áreas de negócio que encontram oportunidades de desenvolvimento, caso consigam ultrapassar os constrangimentos económicos”.

Na perspetiva de Eduardo Freire Rodrigues, as “start-ups são por definição empresas ágeis, com uma capacidade de resposta rápida, apesar de, habitualmente, terem recursos humanos limitados. A própria estrutura que caracteriza estas empresas, concede-lhes maior agilidade para ultrapassar barreiras e, por isso, os tempos de crise podem ser uma forma de catapultar as suas soluções”.

Por isso, lembra que, nestas circunstâncias, “existem algumas áreas de negócio que encontram oportunidades de desenvolvimento, caso consigam ultrapassar os constrangimentos económicos. Nomeadamente empresas que conseguem ir ao encontro, de forma direta ou indireta, das necessidades e até receios, como aqueles que, por exemplo, o coronavírus criou”. Refere, a título de exemplo, “serviços como os de entrega de comida ou compras, plataformas digitais de prestação de cuidados de saúde, seguros e ferramentas de colaboração remota, que permitem não só a colaboradores trabalharem a partir de casa, bem como a entidades de processarem e comunicarem dados entre si”.

Também neste ponto, Pedro Lopes, fundador do Infinite Book, faz uma avaliação positiva, afirmando que “um dos principais papéis das start-ups neste momento é mostrar às empresas que são geridas com uma mentalidade mais fechada que é possível trabalhar de casa, que a flexibilidade de horário é possível e aumenta a produtividade, e que existem cada vez mais ferramentas digitais ao nosso dispor para facilitar o trabalho”.

Este jovem empreendedor alude a uma imagem que tem visto a circular no LinkedIn que diz que “o COVID-19 fez mais pela evolução digital das empresas do que os responsáveis de inovação. Acaba por ser verdade e acho muito importante e enriquecedor tentar tirar algo positivo dos tempos de crise. As start-ups vão lá estar acima de tudo para dar o exemplo. De flexibilidade, de poder de adaptação e gestão de crise”, vaticina.

Esta capacidade de adaptação é igualmente destacada por Rita Ribeiro da Silva, CEO e cofundadora da Skoach, que alude ao movimento Tech4Covid, que juntou voluntários de inúmeras start-ups e outras empresas para criar projetos que ponham soluções ao serviço da comunidade, como alojamento para profissionais de saúde.

“Muitas start-ups reinventaram o seu modelo de negócio para prestar os serviços mais críticos neste momento, como o transporte de bens essenciais entre casas”, explica. No caso da Skoach, por exemplo, a responsável salienta o facto de terem adaptado o seu produto “para permitir que qualquer pessoa, que esteja a trabalhar de casa e a deparar-se com os novos desafios de comunicação e motivação no âmbito desta crise, possa usufruir do Skoach para ganhar resiliência, melhorar a comunicação com a equipa e até adotar hábitos que permitam melhor gestão de tempo”.

Hoje, mais do que nunca, é o momento para apostar em empresas com recursos humanos altamente especializados, não só tecnologicamente, como também a nível científico e humano (…)

A cofundadora da Speak Social lembra, ainda, que as start-ups “constroem-se com equipas empreendedoras, que acreditam naquela que é a sua missão e que procuram colmatar uma lacuna no mercado onde se inserem, através de soluções tecnológicas. Por este motivo, defende que será necessário encontrar e estabelecer sinergias entre os diferentes projetos, para que seja possível o desenvolvimento de soluções inovadoras que respondam às necessidades das comunidades e, consequentemente, contribuam para combater o isolamento social, o declínio económico e o desenvolvimento científico.

Para esta empreendedora, “hoje, mais do que nunca, é o momento para apostar em empresas com recursos humanos altamente especializados, não só tecnologicamente, como também a nível científico e humano, e com grande capacidade de adaptação”.

Tal como a responsável da Skoach, também Mariana Brilhante cita o exemplo do projeto Tech4Covid desenvolvido em Portugal “que reúne hoje mais de 1000 profissionais de diversas áreas de atividade, que se encontram a desenvolver em tempo real soluções minimizar os efeitos de propagação do vírus no seio das comunidades e junto dos profissionais de saúde”.

Também Mário Mouraz, fundador de CEO do Climber Hotel, acredita que esta é uma grande oportunidade para “focar o produto e a atenção da equipa no que é realmente importante”. Refere, por isso, “que é tempo de aproveitarmos para criar a melhor estrutura para atacar uma futura grande oportunidade – equipa forte e unida, produto sólido, vantagem competitiva bem clara – pois sem dúvida que os hotéis irão reabrir em força e nessa altura irão precisar de soluções que os ajudem a maximizar as suas receitas. Além do que depois desta crise alguns dos nossos concorrentes irão morrer e nós iremos aproveitar”.

Projetos em risco? Para já não, mas ….
“Estamos a manter uma estrutura de custos muito leve e, acima de tudo, a moldar o nosso produto para que vá mais de encontro às necessidades atuais, como manter as equipas unidas e produtivas, e otimizar a comunicação à distância”, explicou Rita Ribeiro da Silva, da Skoach, quando questionada sobre as medidas que estão a implementar para enfrentar os desafios que a atual situação inevitavelmente vai provocar.

Não conhecendo a duração desta paragem abrupta da economia, a fundadora refere que “esta crise põe em causa a viabilidade de todos os que não tenham capital para sustentar a atividade durante vários meses, e, nesse sentido, a nossa. Contudo acreditamos que a Skoach terá um papel importante para ajudar as empresas a adaptarem-se a esta nova realidade, tanto pela promoção de novos hábitos de colaboração remota, como ajudando as pessoas diretamente a iniciarem-se no teletrabalho”.

Para enfrentar os novos desafios, Pedro Lopes, explicou que a Infinity Book está a “tentar ao máximo tirar proveito das novas tecnologias, seja internamente com o trabalho remoto, ou para os clientes facilitando a compra online e apostando (ainda mais) nesse canal de venda. Nesta fase mais critica reduzimos as horas de trabalho e as deslocações ao armazém, enviando apenas encomendas duas vezes por semana”. Acredita que a crise não irá pôr em causa a viabilidade do projeto, “mas vai certamente alterar as nossas projeções para este ano”, afirma.

No caso do Climber Hotel, o seu fundador afirma que este “vai ser sem dúvida o “ultimate test”. Depois de várias adversidades, só nos faltava esta. Todos os nossos hotéis clientes (100%) fecharam ou vão fechar o que significa que temos quer ser mais do que nunca, super-eficientes financeiramente”.

Mais otimista, a Speak Social  acredita, independentemente do panorama político, social ou económico, que aquela que considera ser a sua missão – garantir que qualquer pessoa se consiga sentir em casa, independentemente do lugar onde vive – permanecerá e a língua continuará a ser um dos principais fatores de integração social de recém-chegados a uma nova cidade. “A capacidade de adaptação é uma dos fatores-chave do nosso ADN, pelo que encontraremos sempre novas estratégias e soluções para fazer face aos desafios que se forem colocando no nosso percurso”, conclui.

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