Auara: a start-up espanhola que leva água potável aos países carenciados
Auara engarrafa e vende água de nascente e, com os lucros, financia projetos em países carenciados.
Em metade do que poderia ser o pátio de um colégio numa cidade de Benin (África), perfura-se um poço. A ideia é que, quando as crianças ali vão buscar água, se sentem também numa das mesas da sala de aula. A responsável para que isto aconteça é a Auara, uma start-up fundada por um arquiteto e um engenheiro industrial de 26 anos. A empresa, nascida em 2015 em Madrid, vende água de uma nascente de León e todos os seus lucros são destinados a projetos de água potável e saneamento em países em vias de desenvolvimento.
Em 2016, lançaram no mercado 250 mil garrafas, desenhadas com base quadrada e “sustentáveis”, assegura o engenheiro Pablo Urbano, um dos sócios. Foram a primeira empresa espanhola com o selo europeu ‘Social Enterprise’. “Engarrafamos água em plástico reciclado, fomos os primeiros na Europa”, explica o responsável citado pelo El País. As garrafas são fabricadas em França, “porque acreditamos que a sua forma de trabalhar o plástico reciclado é melhor para o nosso produto e o seu plástico não tem marcas ou manchas”, acrescenta. Existem outras empresas com o mesmo fim, como, por exemplo, a alemã ‘Viva com água’, nascida no bairro de Sankt Pauli de Hamburgo, ou a australiana ‘Thankyou Water’. Ambas destinam 100% dos seus lucros a projetos relacionados com a água em países subdesenvolvidos.
Alberto Espinosa é outro dos rostos do projeto. Antes de criar a Auara, este arquiteto tinha trabalhado em projetos de cooperação em países em vias de desenvolvimento. “Estava consciente de que a água era o foco de muitos problemas”, afirma, acrescentando que estes “repercutem-se na educação, no sistema sanitário, na higiene e na nutrição… na vida das pessoas a todos os níveis e que com a crise viram os donativos diminuir”. Então, pensaram que a água podia dar origem a um projeto empresarial social, aproveitando a sua formação em engenharia e arquitetura. “Primeiro pusemos o foco na inovação do envasilhamento, mas também nos processos de distribuição, reciclagem e produção de resíduos… tudo está calculado ao milímetro”, conta Urbano. A Auara é uma empresa registada como empresa social; não é uma ONG, nem tão pouco uma fundação, mas trabalha com ambas.
Há três pessoas dedicadas à gestão dos projetos nesta start-up, tendo como responsabilidade avaliar a viabilidade das propostas e de aprovar os pagamentos que resultam da venda das garrafas de água. “Às ONG e fundações exigimos experiência, profissionalização e vocação de permanência e contas claras”, afirma Urbano. Neste momento, trabalham com a Manos Unidas e com a ONG Sauce e, entre os projetos prontos a arrancar, está a construção de latrinas no Camboja.
“O facto de as pessoas com HIV estarem estigmatizadas nestes países e o ser cada vez mais frequente, leva-nos a avançar ali com um projeto de saneamento”, explica o responsável.
Como tudo começou…
Para criarem a empresa em 2015, os dois sócios investiram 15 mil euros de capital. Numa primeira fase, desenharam o site da Auara e passaram a contar com mais um sócio, Luis de Sande, o atual diretor financeiro. Em paralelo, estudaram o desenho da garrafa, os moldes, procuraram locais para começar a produção com as caraterísticas que procuravam e montaram uma estrutura. Também apresentaram o projeto a diversos concursos, tendo recebido o apoio de duas aceleradoras, uma delas especialista em meio-ambiente.
O segundo investimento financeiro veio de familiares e amigos, num total de 51 mil euros. O terceiro foi feito por uma gestora de património “que investe na economia real”, explica Urbano. A 360Cora EAFI investiu 290 mil euros, num “investimento que será devolvido”, esclarece o arquiteto.
A equipa da Auara é comporta por oito pessoas – embora só cinco trabalhem a tempo inteiro – que integram a área de vendas, marketing, administração e logística. “O nosso objetivo para 2017 é que todos estejam contratados”, conta Pablo Urbano, “mas, de momento, tudo o que ganhamos vai para os projetos e, embora poupemos ao máximo, a prioridade é que haja dinheiro para fazer o que temos vindo a fazer… chegar a esses países onde existem problemas com a água”. No primeiro ano, a jovem empresa fechou sem lucros. “Faturamos 20 mil euros brutos, dos quais poderíamos dizer que o lucro foi de 1 a 15%”, assegura Urbano.
As garrafas da empresa chegam aos supermercados do El Corte Inglés de Madrid e Barcelona, onde a garrafa de meio litro é vendida por 0,57 cêntimos. “O plano é chegar este ano ao Levante espanhol, pois aí há muita procura”, afirma. Está nos planos da empresa começar também a vender garrafas de litro e a pôr em marcha uma plataforma de venda online. “O e-commerce é prioritário, queremos que as pessoas não tenham que se deslocar para comprar grandes quantidades de água”, referem os sócios, referindo que “as garrafas chegarão entre as 24 e as 48 horas” após a encomenda. No setor da restauração, chegam ao grupo Larrumba, com quem têm em curso um projeto no Congo. “Cada pessoa que consome uma destas garrafas ou a compra tem acesso à informação de cada projeto através de um código QR na etiqueta, que também está em braille”, explica Antonio Espinosa.
Embora a sua ideia seja continuar a crescer, a estratégia da Auara centra-se, para já, no mercado espanhol. “Queremos assegurar que o processo seja sustentável. E se tivermos que usar demasiado combustível para isso, estamos a desperdiçar esforços, energia, dinheiro e a poluir mais”, refere Pablo Urbano.
A Auara quer fechar 2017 com mais de um milhão de euros de faturação, o que pressupõe vender quase três milhões de garrafas. “Além da loja online, queremos chegar a mais cadeias de distribuição e focarmo-nos nos clientes com grandes volumes de encomendas”, explica Espinosa. Os empreendedores asseguram que todos os lucros que obtenham da venda, “depois de pagos os gastos logísticos, de pessoal e de reservas de capital”, irão ser aplicados em projetos da mesma natureza.