Arlan Hamilton: de sem-abrigo a gestora de fundo de investimento

Em 2015, Arlan Hamilton dormia onde conseguisse. Hoje lidera um fundo de investimento de 5 milhões de dólares (cerca de 4,5 milhões de euros), com foco em mulheres promissoras, minorias e em empreendedores LGBT.

Arlan Hamilton sonhava em criar um fundo de investimento que apostasse nas mulheres, nas minorias e nos empreendedores da comunidade LGBT. Mas havia um grande problema, não tinha capital para investir. Aliás, nem capital nem uma cama para dormir.

Esta afromericana não tinha histórico na área do investimento, mas queria investir em empreendedores com pouco ou nenhum sucesso. Tinha deixado o seu emprego como coordenadora de espetáculos musicais para dar vida a este sonho. Começou por viver às custas das suas poupanças, que depressa acabaram e a deixaram sem nada. A ideia surgiu quando se apercebeu que os agentes dos músicos investiam em tecnologia que nunca tinha ouvido falar e decidiu explorar a atividade.

O sonho tornou-se tão forte que quase virou uma obsessão, tendo-a levado a manter-se em bootstrapping até ao extremo. Foi sem-abrigo durante meses, acabando por dormir em sofás, motéis, carros e aeroportos.

Segundo o Inc., Hamilton encontrava-se em Palo Alto, na Califórnia, em setembro de 2015, com uma mochila, um porta-fatos e nenhum lugar para onde ir. Tinha reunido com todos os investidores que tinha identificado e telefonado a todas as pessoas que operavam na área da tecnologia de que se tinha conseguido lembrar. Mas ninguém queria investir no fundo que desejava criar.

A luz ao fundo do túnel

Numa manhã de domingo, quando estava a pensar no que iria fazer a seguir, o telemóvel dá sinal de mensagem com o seguinte texto: “Eu alinho”. A mensagem tinha sido enviada por Susan Kimberlin, uma veterana da área tecnológica que fez nome por si mesma na Salesforce e no Paypal.

Susan estava disponível para apostar em Hamilton e trazer uma maior diversidade ao mundo da tecnologia. O cheque cobria o valor que necessitava para criar a Backstage Capital e pô-la a funcionar.

Hamilton tinha conhecido Susan num seminário organizado pela 500 Startups de duas semanas para investidores em Palo Alto, em São Francisco, que frequentou depois da Y Combinator’s Female Founders Conference, e para o qual comprou um bilhete apenas de ida. Austen, onde residia na época, ficara para trás e a aposta de Hamilton tinha-se tornado maior a cada dia, vendo finalmente agora com Susan a luz ao fundo do túnel.

Sem perder tempo, Hamilton pegou nas suas coisas, contactou as start-ups nas quais há muito queria investir e pôs-se a caminho. Como referiu ao Inc., “depois disso nunca mais tive de ser sem-abrigo”.

A seguir a Susan outros investidores se juntaram a Hamilton, nomeadamente Stewart Butterfield, cofundador e CEO da Slack, o que veio trazer credibilidade e força ao seu sonho.

A partir do momento em recebe aquele primeiro cheque que ajudou-a a criar a Backstage Capital,  Hamilton angaria investimentos dos mais diversos investidores tecnológicos e executivos, entre os quais Marc Andreessen, cofundador da Netscape Communications Corporation e coautor do Mosaic; Chris Sacca e a sua esposa Crystal English, fundadores do Lowercase Capital; David Rose, managing partner da Rose Tech Ventures; Aaron Levie, cofundador e CEO da Box; e Swati Mylavarapu, do Kleiner Perkins Caufield Byers.

Muitos dos que investiram na Backstage Capital, que tinham os seus próprios investimentos, encontraram uma oportunidade de terem acesso a start-ups que de outra forma não teriam.

Como referiu Lars Rasmussen, um business angel e veterano da Google e do Facebook, “ela [Hamilton] tem acesso a empreendedores que os típicos investidores de Silicon Valley não têm”, confessando tratar-se “quase de usar uma injusta vantagem competitiva o conhecer-se a Hamilton e usar os seus contactos numa área que está pouco explorada”.

Hamilton já investiu em nove grupos de fundadores, cujas empresas exploram ideias e mercados que têm sido largamente ignorados por Silicon Valley. Com seu fundo de 5 milhões de dólares (cerca de 4,5 milhões de euros), Hamilton procura captar 1% de participação em empresas em fase inicial que estão a angariar a sua primeira ronda de financiamento.

Chris Sacca referiu ao Inc. que “o foco de Hamilton na diversidade irá abrir o acesso a talento de valor e a grandes mercados que não têm estado no radar dos investidores tradicionais”.  “Ela anda por aí a encontrar empresas que eu nunca na vida teria sabido que existiam”, acrescentou David Rose.

Segmentos pouco apetecíveis mas promissores

O portefólio de Hamilton integra a Text Engine, uma start-up que permite a quem tenha telemóveis com caraterísticas simples tirar informação da internet; a Radial, uma app de streaming de música focada no soca, um estilo musical afro-caribenho; a Tinsel, uma empresa de hardware que faz colares que também podem ser usados como auscultadores, entre outras.

Aniyia Williams, CEO da Tinsel, é um exemplo do tipo de empreendedores em que Hamilton investe. A Tinsel é uma start-up de uma empreendedora afroamericana que estava grávida na altura em que tentava angariar investimento e que todos recusavam.

Mas desengane-se quem pensa que se trata de caridade. O seu foco de investimento é o mesmo de qualquer outro fundo de investimento: gerar lucro, mas apostando em segmentos pouco apetecíveis aos investidores mais tradicionais. Enquanto muitos viam o sucesso na inteligência artificial, Hamilton via-o num segmento quase inexplorado de empreendedores, como escreveu num artigo que publicou no Medium, no âmbito de um seminário para investidores que fez com a 500 Startups, e que se tornou viral.

Hamilton investe habitualmente em rondas de investimento semente entre 25 e 100 mil dólares (entre cerca de 22 e 89 mil euros), apostando adicionalmente no desenvolvimento de trabalho com as start-ups que lhes permita crescer e serem elegíveis para as rondas seguintes de investimento.

A Hamilton juntaram-se, entretanto, outros com a mesma visão de investimento, tendo surgido uma nova vaga de fundos focados em trazer uma maior diversidade a Silicon Valley, através do investimento em mulheres, pessoas de cor e pessoas da comunidade LGBT. A par da Backstage Capital, também a Kapor Capital e a Intel Capital detêm atualmente fundos de diversidade.

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