António Saraiva: o homem que de aprendiz de serralheiro chegou a líder dos patrões
António Saraiva, que acaba de ser novamente reeleito presidente da CIP – Confederação Empresarial de Portugal, é um nome bem conhecido dos portugueses. No entanto, nem todos conhecem a força e destreza deste homem que, com seis anos, deixou Beja para conquistar Lisboa.
António Saraiva, dono da Metalúrgica Luso-Italiana que fabrica as torneiras Zenite e presidente da CIP – Confederação Empresarial de Portugal, sabe o que é o mundo do trabalho. Não nasceu patrão, nem vem de uma família conhecida. Tudo o que é hoje deve-se a si e ao seu trabalho.
Nasceu em Ervidel, Beja, no seio de uma família humilde, mas o destino levou-o a deixar a aldeia, juntamente com os seus pais, em 1958. Tinha seis anos, quando o seu pai procurou em Lisboa uma vida melhor para si e para a sua família. Para trás ficaram as memórias de uma infância feliz, levando apenas consigo força, persistência e a vontade de conquistar “o mundo”.
O pai deixou a profissão de aprendiz de sapateiro em Beja para ser soldado da GNR em Lisboa, profissão que deixou cinco anos depois para singrar como eletricista, chegando a estabelecer-se por conta própria 14 anos depois, com uma loja de reparação de eletrodomésticos. Até aos onze anos, António Saraiva viveu com os pais num quarto alugado, pois o que ganhava na GNR não dava para mais.
Depois de concluir a Escola Primária, frequentou o antigo ensino industrial, já que não tinha posses financeiras para frequentar o Liceu, onde as propinas eram muito elevadas.
Aos 17 anos, e depois de terminar o curso da escola industrial, começou a sua vida profissional como aprendiz de serralheiro mecânico na Lisnave, em Cacilhas. Começou na Doca 13, a doca de reparação naval, onde começou por trabalhar no estaleiro, mais concretamente no fundo dos tanques dos petroleiros. Por cada meia hora no tanque, os operários tinham outra meia hora cá fora para respirar.
Dois anos mais tarde, foi convidado para a secção de planeamento, onde todo o estaleiro era analisado, passando a ocupar o cargo de planeamento de cargas, serviço que consistia na visualização, com quatro meses de antecedência, das necessidades de mecânicos que iriam ser necessários em função dos navios para reparar.
Permaneceu nessa função até chegar à idade do serviço militar obrigatório, tendo integrado as forças armadas nas Caldas da Rainha, poucos dias antes do 25 de abril.
Depois da revolução, António Saraiva teve a sua primeira experiência associativa, ao ser eleito delegado da sua companhia ao MFA, com 20 de idade.
Em 1982, terminou o serviço militar e regressou à Lisnave, que vivia na época uma situação muito difícil, com salários em atraso.
Foi então que Elisa Damião o convidou para integrar uma lista da UGT para a comissão de trabalhadores da Lisnave. Acabou no cargo de presidente da Comissão, quando Elisa Damião foi chamada para o Secretariado Nacional da UGT e coube-lhe a si negociar o primeiro contrato social que se fez em Portugal.
Casou aos 21 anos, quando frequentava o serviço militar, e aos 22 tornou-se pai de uma menina e, quatro anos mais tarde, de um rapaz.
Naquela altura, António Saraiva trabalhava na Lisnave e estudava à noite, tendo concluído com brilhantismo os preparatórios para a universidade. Como já tinha 25 anos, concorreu ad hoc ao curso de Engenharia Mecânica no Instituto Superior Técnico, onde entrou em 1980, concretizando o sonho de ir para a universidade. Mas acabou por não concluir o curso, sendo, até hoje, o único gestor que chegou a administrador do grupo Mello sem ter uma licenciatura.
Alguns anos depois, recebeu um convite para se tornar diretor comercial da Metalúrgica Luso-Italiana, empresa que produzia as torneiras Zenite e que pertencia ao Grupo Mello, tal como a Lisnave. Em 1992, foi nomeado Administrador da Luso-Italiana que, entretanto, tinha absorvido a Luso-Alemã.
Em 1996, surgiu sobre a mesa a venda da empresa. Havia o interesse de Ludgero Marques, da concorrente Cifial, para a compra da metalúrgica. António Saraiva toma a decisão de uma vida e avança como interessado no negócio. Com o apoio dos anteriores patrões e de alguns clientes, conseguiu reunir o capital para fazer um MBO (Management By Out), tornando-se no único dono da empresa e ficando com uma avultada quantia financeira para pagar ao longo dos anos. O caminho não tem sido fácil e muitas foram as pedras da calçada.
Entretanto, passou a liderar a Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal. E em 2010 torna-se Presidente da CIP – Confederação Empresarial Portuguesa, organização empresarial de cúpula resultante da fusão da AEP – Associação Empresarial de Portugal com a AEP – Associação Industrial Portuguesa.
Alguns poderão dizer que eram outros tempos. Outros pensarão que houve “ajudas” pelo caminho. O certo é que quanto maior é o voo maior é a queda, pelo que, como na vida de António Saraiva, mais vale acreditar que o caminho se faz caminhando e que as pedras da calçada serão muitas, mas que quem não arrisca não vence.