Opinião

Em tempos um ilustre professor da Faculdade de Direito partilhou com a turma duas lições de sabedoria prática que, pese embora o passar dos anos, ainda hoje ecoam na minha memória e, amiúde, verifico que a sua aplicação na realidade é bem real.

Por um lado, explicou aos alunos que uma das características mais comuns no dia a dia dos negócios seria um certo estigma que determinava que sempre que duas (ou mais) partes estavam sentadas numa sala para fechar um acordo, existia como que uma obrigação moral de efetivamente existir um entendimento. Não era admissível o fracasso de não se chegar a um consenso e inconscientemente as pessoas procuravam, até ao limite, uma plataforma na qual pudessem sair vitoriosas daquela reunião, fechando um qualquer negócio ou acordo, ou no limite não permitindo que a falta de entendimento determinasse a colocação de um ponto final nas negociações.

Esta compulsão, de fechar algo a qualquer custo, levou, porém, a que vários negócios ruinosos fossem feitos, por vezes para ambas as partes, algo que só se veio depois a verificar quando os referidos negócios entraram na sua fase de execução. E serviu este exemplo que o nosso professor nos deu para explicar um pouco acerca da teoria de negociação, a qual postula que sempre que duas partes estão a negociar, existe uma área de entendimento virtual, digamos condições, como se fosse dois meridianos entre os quais cada uma das partes estará disponível para chegar a um acordo.

Num cenário ideal, as partes chegam a um compromisso encontrando-se cada uma delas dentro desses meridianos próprios, os quais podem ser mais ou menos alargados, passando o truque de qualquer boa negociação por entender ou presumir quais são esses limites mútuos (isto porque as pessoas não os revelam assim tão claramente e é preciso saber ler os sinais que vão sendo dados). Tudo o que seja um acordo que apenas satisfaz os limites de uma das partes ou até de nenhuma é ruinoso e só se explicaria pelas razões aludidas anteriormente.

De igual modo existia outra situação que era necessário ter presente, o conformismo face à mudança e uma certa retração moral que todos sentíamos ou sentiríamos quando era necessário deixar um emprego ou cargo. Como o ser humano resiste à mudança, bem ou mal, mesmo quando todos os sinais apontam para essa necessidade, ainda assim é típico persistir numa situação que não nos deixa confortáveis.

Fazer isso tendo por base o sentimento de lealdade, o medo de mudar, o risco do imprevisto ou qualquer outra razão é compreensível, mas está longe de ser a ação mais honesta. Qualquer pessoa que não esteja bem e sinta vontade de mudar estará, ao não o fazer, a mentir a si mesma e à entidade para a qual trabalha ou a quem presta serviços. Há uma relação de confiança entre as partes que deve pressupor também a lisura desta quanto às expetativas mútuas e que sai defraudada quando um trabalhador ou uma entidade empregadora, sabendo que a mudança do status quo é imprescindível, optam por questões diversas – até muito válidas, sem dúvida – por protelar essa decisão, procrastinando e colocando em causa o bom desempenho das funções e da relação.

Nunca é fácil sair de uma negociação a meio. Também é complicado “bater a porta” e deixar o que conhecemos. Mas em ambos os casos, e agradeço ao meu professor por me ter explicado tão bem isso, a nossa honestidade intelectual deve prevalecer e seguramente que, nessas situações, terá a recompensa adequada, por muito que possa parecer difícil o caminho. É a tal “road less taken” que pode fazer a diferença na nossa vida.

Comentários
Nuno Madeira Rodrigues

Nuno Madeira Rodrigues

Nuno Madeira Rodrigues é atualmente coordenador do Departamento de Direito Imobiliário na Pinto Ribeiro Advogados. Anteriormente, foi Country Manager PT Arnold Investments, Chairman da BDJ S.A, Chairman da Lusitano SAD, Administrador do Grupo HBD e Presidente do Conselho de Administração da Lusitano, SAD, e do Conselho Fiscal da Associação Lusófona para as Energias Renováveis. É ainda Vice-Presidente do Conselho Fiscal da Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários, Membro do Conselho Consultivo da Plataforma Sustentar e Presidente da Direção da... Ler Mais..

Artigos Relacionados