Opinião

A nova Diretiva vai acabar com o chamado “gender pay gap”?

Margarida Couto, presidente do GRACE*

A diferença salarial entre homens e mulheres é um problema persistente, que continua longe de estar resolvido – ou sequer minimizado – apesar de serem diversos os Governos, como o português, a adotar políticas públicas especialmente vocacionadas para garantir uma paridade salarial que teima em não vingar.

De acordo com o Global Gender Gap Report de 2020 do World Economic Forum, ao ritmo atual, o chamado gender pay gap demorará 257 anos a ser eliminado a nível global, mais 55 anos do que no estudo do ano anterior. E, mesmo na Europa, geografia que mais progressos tem feito, as mulheres terão de esperar até 2086 para auferir o mesmo nível de remuneração dos homens – hoje, recebem em média menos 13% pela realização de trabalho igual, com variações muito significativas entre os países da União.

Além de ser um problema moral, este é sobretudo um gigante problema para a economia – o recente estudo da Moody’s Analytics denominado “Close the Gender Gap to Unlock Productivity Gains” conclui que sua resolução impulsionaria a economia mundial em cerca de 7%, ou seja, mais de 7 “trilhões” de dólares.

Ciente da dura realidade atual e do impacto profundamente negativo da mesma na economia – bem como da centralidade do tema no contexto do framework ESG, crescentemente incontornável para as empresas – a União Europeia decidiu impor alterações legislativas destinadas a acelerar a mudança.

E assim, no dia 30 de março, o Parlamento Europeu aprovou uma exigente Diretiva sobre transparência salarial que impõe às empresas, entre muitas outras, as seguintes medidas:

  • Fim do sigilo salarial – os trabalhadores terão o direito a ser informados sobre as condições salariais dos colegas que se encontrem na mesma categoria.
  • Reporte – as empresas com mais de 100 trabalhadores terão de reportar o seu gender pay gap. A frequência do reporte depende do número de trabalhadores (reporte anual para empresas com mais de 250 trabalhadores).
  • Avaliação salarial – sempre que o gender pay gap for superior a 5%, as empresas terão de levar a cabo uma avaliação salarial conjunta, em colaboração com os representantes dos trabalhadores.
  • Penalidades – as coimas por não cumprimento das regras aplicáveis serão dissuasoras, potencialmente baseadas no volume de negócios da empresa.

A Diretiva terá ainda de ser aprovada pelo Conselho Europeu e os Estados Membros dispõem depois de três anos para a transpor para o direito nacional, sendo assim a sua efetiva aplicação às empresas esperada apenas a partir de 2026.

Irá esta nova Diretiva acabar com o o gender pay gap?

Infelizmente, não há muitas razões para otimismo – em Portugal, muitas das medidas propostas pela Diretiva já existem na lei há mais de quatro anos e, só nos últimos meses, a ACT terá notificado mais de 1.500 empresas que têm uma desigualdade salarial superior a 5%, intimando-as a apresentar um plano de avaliação salarial, com medidas corretivas do desvio.

No GRACE, sentimos que o que falta à maior parte das empresas é sobretudo know-how sobre como desenhar e implementar Planos de Igualdade realistas e eficazes, que conduzam a uma efetiva mudança organizacional – e acreditamos que, sem esta, não há porventura leis que tenham a virtualidade de “fechar o gap”. Por isso, continuaremos a levar a cabo ações, incluindo de formação, que dotem as empresas de ferramentas capazes de fomentar essa mudança, na expetativa de assim contribuir para a resolução de um grave problema, que não afeta apenas as mulheres, mas antes toda a economia!

*em representação da Vieira de Almeida & Associados – Sociedade de Advogados

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Margarida Couto

Margarida Couto

Margarida Couto é licenciada em Direito e pós-graduada em Estudos Europeus, pela Faculdade de Direito da Universidade Católica de Lisboa. Integra a Sociedade de Advogados Vieira de Almeida & Associados (VdA) desde 1988, sendo a sócia que lidera a área de prática de Telecomunicações, Media e Tecnologias da Informação e a área de prática do Terceiro Sector e Economia Social. É a sócia responsável pelo Programa de Pro Bono e de Responsabilidade Social da VdA, presidindo ao Comité Pro Bono... Ler Mais..

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