Opinião
A nova Diretiva sobre o dever de due diligence de Direitos Humanos, nas vésperas da guerra
No último dia de paz na Europa – 23 de fevereiro de 2022 – a Comissão Europeia divulgou a proposta da Diretiva que irá impor que um conjunto alargado de empresas que operam na União Europeia (independentemente do país onde tenham a sua sede) implementem procedimentos de diligência devida (due diligence) destinados a prevenir violações de Direitos Humanos não apenas nas suas próprias operações, como na sua cadeia de fornecimento.
Foi já há dois anos que, no contexto do European Green Deal, foi anunciado que, na União Europeia, a responsabilidade das empresas pelo respeito dos Direitos Humanos deixaria de habitar apenas o “mundo da responsabilidade social”, passando a viver também, pelo menos para certas empresas, no “mundo da compliance”. Mas foi apenas no passado dia 23 de fevereiro que a ansiada proposta da oficialmente chamada “Diretiva sobre o dever de diligência devida das empresas em matéria de sustentabilidade” (conhecida, na gíria, como a “Diretiva de due diligence de Direitos Humanos”), foi finalmente aprovada pela Comissão Europeia. Não deixa de ser irónico que a data (tão esperada, por tantos) em que foi dado a conhecer o texto proposto pela Comissão, tenha coincidido com a véspera do dia em todos começámos a assistir, “em direto”, às mais violentas violações de Direitos Humanos ocorridas em território europeu desde o fim da Segunda Guerra Mundial.
O que aconteceu no “mundo empresarial” a partir do já histórico dia 24 de fevereiro de 2022 não apenas dará que pensar aos mais céticos, como nos permite reforçar a crença de que, sendo tantas as empresas disponíveis para pôr a sua responsabilidade acima das suas receitas, pode mesmo ser gigante o poder das empresas enquanto force for good.
É certo que a nova Diretiva sobre a proteção de Direitos Humanos, apenas se aplicará, grosso modo, a empresas com mais de 500 trabalhadores e volume de negócios a nível mundial superior a €150 milhões (bem como, numa segunda fase, a empresas com mais de 250 trabalhadores e de €40 milhões de volume de negócios, que operem em determinados sectores, considerados como “de risco”).
Mas, a instantânea mobilização a que assistimos por parte da generalidade das empresas – independentemente do seu porte, volume de negócios ou localização – foi bem demonstrativa de como estas são capazes de, de forma espontânea e quase em uníssono, fazerem ouvir a sua voz e desencadearem um elevado conjunto de ações destinadas, direta ou indiretamente, a minorar o sofrimento humano de milhões de ucranianos que, subitamente, deixaram de lhes ver reconhecidos os mais básicos direitos humanos, incluindo o próprio direito à vida.
É inegável que a proteção dos Direitos Humanos pelas empresas será, crescentemente, um tema de compliance e que esse caminho está traçado. Mas a solidariedade demostrada pelas empresas para com as vítimas de uma tragédia que não imaginávamos ser possível, a capacidade que demonstraram para tomar, de imediato, decisões difíceis que afetam diretamente os seus resultados financeiros, a forma como procuraram pôr os seus recursos, incluindo de empregabilidade, ao serviço de seres humanos com os quais não tinham qualquer ligação, a par de tantas outras generosas e desinteressadas iniciativas, permite acreditar que, no que toca aos Direitos Humanos, as empresas sentem já ser sua responsabilidade protegê-los. O que é meio caminho andado para que a Diretiva que aí vem seja bem recebida, ou pelo menos bem compreendida, pelos que terão de a cumprir.
No GRACE – Empresas Responsáveis, foi com muito orgulho que participámos nesta mobilização do mundo empresarial, incluindo, naturalmente, na levada a cabo pelo nossos já mais de 200 Associados. E foi com redobrada confiança que constatámos, mais uma vez, o poder do trabalho em rede, a força das parcerias, o valor do ODS 17!
*Em representação da Vieira de Almeida & Associados – Sociedade de Advogados