Entrevista/ “A inovação faz parte do ADN da Imprensa Nacional Casa da Moeda”
A Unidade de Contrastarias e de Fiscalização da Imprensa Nacional Casa da Moeda (INCM) tem um papel fundamental na certificação do setor da ourivesaria nacional, mas tal como muitos outros setores teve de se adaptar à pandemia. Paula Pedro, diretora, explicou ao Link To Leaders a importância da inovação e da modernização para chegar aos clientes.
Garantir a segurança do consumidor e a confiança no setor de ourivesaria através da marca de certificação, promovendo uma aliança entre a tradição e a inovação, é a missão das Contrastarias, os serviços oficiais e técnicos integrados na Imprensa Nacional Casa da Moeda. Legalmente, é a única entidade em Portugal com poderes para conferir aos artigos com metais preciosos a marca de certificação.
Paula Pedro é a nova diretora da Unidade de Contrastarias e de Fiscalização da INCM – Imprensa Nacional Casa da Moeda, e em entrevista ao Link To Leaders,fala da enorme responsabilidade desta atividade, do seu objetivo de levar as Contrastarias portuguesas ao mais elevado patamar de eficiência das operações e de alguns projetos de inovação que pretende oferecer já em 2021 como o Uniquemark, desenvolvido em parceria com a Universidade de Coimbra, e que consiste na criação de uma marca de certificação única, não clonável.
Assumiu recentemente a direção da Contrastarias Nacionais. Quais são os principais desafios que esta atividade secular enfrenta?
O maior desafio de sempre, e que se mantém atual, prende-se com o reforço da visibilidade e do conhecimento da Contrastaria junto do consumidor final. Se alguém quando adquire uma peça de ourivesaria ou de joalharia não estiver ciente da importância e, por conseguinte, do valor da marca de certificação, também não saberá que pode e deve exigir esta garantia de segurança da autenticidade do artefacto de metal precioso que está a comprar, nomeadamente quanto ao seu toque legal e marca de responsabilidade. A proteção do consumidor é, portanto, a nossa missão, mas também o garante da concorrência leal entre os operadores do setor de Ourivesaria. Mas isso só será plenamente conseguido quando a mensagem chegar ao cidadão comum, em geral.
Por outro lado, e agora do ponto de vista das operações, existe o desafio de sermos cada vez mais eficientes, de modo a acompanharmos proativamente as exigências do setor, enquanto parceiros, mas, sobretudo, de estarmos preparados para nos adaptarmos a este novo mundo que traz outras necessidades e torna mais visível a importância de termos um serviço de excelência: uma Contrastaria mais moderna, inovadora e ágil ao serviço dos seus clientes e capaz de contribuir para a valorização da marca de contraste.
De que forma esta atividade foi afetada pela atual situação de pandemia?
Estivemos sempre muito atentos às orientações da DGS, pelo que a atividade da Contrastaria, perante o contexto do momento, cessou durante seis semanas – à exceção dos serviços administrativos -, com todos o impacto que inevitavelmente essa decisão acarretou para a operação e para os clientes. A nossa grande prioridade foi e será sempre a saúde e o bem-estar dos nossos clientes, parceiros e colaboradores e todas as decisões foram tomadas nesse sentido.
Estamos cientes do nosso papel e responsabilidades económicas no setor, mas numa altura sem precedentes como esta, agimos de forma a garantir a segurança de cada um e, com base no que fomos aprendendo sobre a pandemia e nas recomendações da DGS, fomos evoluindo e adaptando os nossos serviços à nova realidade. Fizemo-lo com foco na recuperação económica do setor de ourivesaria e joalharia e sem descuidar os procedimentos de segurança que decorrem deste período tão desafiante que ainda atravessamos.
A promessa que fazemos é de esforço contínuo em melhorar a Contrastaria, com o foco em novas soluções, sem descurar o que tem sido constante ao longo da nossa história e que queremos que se refortaleça: a confiança.
” (…) A Contrastaria fez por inovar o serviço disponibilizado aos clientes, nomeadamente ao facultar um novo sistema de agendamento do atendimento, que permite tirar senhas através do telemóvel ou internet, eliminando os dispositivos que implicavam contato físico”.
Como é que se reorganizou para dar resposta às novas exigências e contexto?
Ao reabrir a atividade, a Contrastaria fez por inovar o serviço disponibilizado aos clientes, nomeadamente ao facultar um novo sistema de agendamento do atendimento, que permite tirar senhas através do telemóvel ou internet, eliminando os dispositivos que implicavam contato físico. Paralelamente, assegurámos um período alargado de atendimento durante algumas semanas, de modo a estabilizar os níveis de serviço da Contrastaria.
Uma das medidas de apoio financeiro ao setor da Ourivesaria, e que traduzem paralelamente um esforço de agilização e de desmaterialização de processos que assegurámos neste novo contexto, foi a concessão de uma solução de crédito a grande parte dos clientes da Contrastaria, com a possibilidade adicional de efetuarem o pagamento através de uma referência multibanco, já após o levantamento da obra, com maior comodidade e segurança, permitindo reduzir os tempos de atendimento presencial.
Por outro lado, encontra-se em curso um projeto para operacionalização de um novo serviço de transporte de alta segurança que permitirá a recolha e entrega de obra junto dos clientes, evitando a necessidade de se deslocarem à Contrastaria. Este serviço será direcionado, numa primeira fase, aos clientes do distrito de Braga, mas prevemos a sua extensão gradual a todo o território nacional.
“(…) embora seja uma atividade com heranças e tradições profundamente enraizadas, a Contrastaria, faz por se reinventar (…)”
Que inovações tecnológicas são implementadas para a modernização do serviço de Contrastaria?
A inovação faz parte do ADN da Imprensa Nacional Casa da Moeda (INCM) e alastra-se naturalmente à Contrastaria. Admitimos, contudo, que ainda possa ser pouco visível, hoje em dia, nesta área de negócio. No entanto, embora seja uma atividade com heranças e tradições profundamente enraizadas, a Contrastaria, faz por se reinventar, por oferecer novos e melhores serviços que garantam aos consumidores finais que os seus direitos são protegidos.
O melhor exemplo disso é o Uniquemark, projeto de inovação desenvolvido em parceria com a Universidade de Coimbra, que pretendemos oferecer em 2021, que consiste na criação de uma marca de certificação única, não clonável, usando técnicas tais como a dispersão aleatória de pó de diamante e um nova técnica de marcação a laser. Mas a grande revolução do sistema Uniquemark está igualmente na possibilidade de validar a autenticidade das marcas recorrendo a um simples smartphone. Entramos assim numa nova era de segurança e rastreabilidade das marcas de contrastaria.
Ainda no âmbito da modernização do serviço prestado pela Contrastaria, não posso deixar de referir a marcação a laser que, nos últimos três anos, tem provado ser uma mais-valia no que diz respeito à marcação das peças mais pequenas e frágeis. Mas a inovação passou também por outros eixos, nomeadamente o de simplificação, de que é exemplo a criação da Marca na Hora, um serviço que disponibilizamos desde 2017 e que oferece ao cliente a possibilidade de adquirir uma marca de responsabilidade previamente aprovada pelas Contrastarias, eliminado o tempo de espera inerente ao processo padrão de aprovação do desenho de uma marca. Dois claros exemplos da importância da modernização num lavor tão tradicional.
Qual o objetivo desta reestruturação das Contrastarias Nacionais com a criação do polo em Gondomar?
Na verdade, há uma delegação da Contrastaria em Gondomar desde 1913, pois este município representa, historicamente, grande parte da expressão nacional das indústrias da ourivesaria e joalharia. A inauguração das novas instalações desta delegação no edifício Goldpark, em Gondomar, mais modernas e seguras, com o triplo dos postos de atendimento e maior capacidade de resposta aos nossos clientes, representa o início de um novo ciclo: um período de transformação processual e tecnológica ainda mais focado em garantir a segurança do consumidor e a confiança no setor de ourivesaria através da marca de certificação, promovendo uma aliança entre a tradição e a inovação.
“É um espaço que, por natureza, pretende promover a inovação e a criatividade, a par de outras sinergias, harmoniosamente situado numa área muito marcada pela tradição”.
Também pretende aproximar as Contrastarias Nacionais do tecido empresarial?
Sem dúvida que permitirá e incentivará esta aproximação. A localização estratégica no Goldpark não é um acaso já que este espaço é, na sua essência, um facilitador de contatos entre clientes, criadores e investidores, num ecossistema de partilha de valores e conceitos. É um espaço que, por natureza, pretende promover a inovação e a criatividade, a par de outras sinergias, harmoniosamente situado numa área muito marcada pela tradição.
Além da instalação do novo polo, também foi lançando um website exclusivo para as Contrastarias. Qual o objetivo?
O site da Contrastaria é um meio de aproximação aos clientes e, no fundo também, ao consumidor final que adquire as peças. Surge com base em observações resultantes de um grupo de trabalho criado no seio do Conselho Consultivo de Ourivesaria, por isso preenche necessidades muito específicas do setor.
A Contrastaria não dispunha de um site autónomo. Agora sim. Para além de divulgar a atividade e história da Contrastaria, o site potencia o objetivo de maior dinamismo e assertividade na comunicação com o setor de ourivesaria e joalharia e com a sociedade em geral, para além de desmaterializar alguns processos que antes exigiam uma deslocação aos nossos balcões.
Que serviços existem no site?
Oferece a possibilidade dos operadores económicos acederem a uma área reservada com informação que, anteriormente, teriam de obter presencialmente, o que é uma clara mais-valia em termos de gestão de tempo e também de segurança. E assegura igualmente outros serviços, por exemplo, o acompanhamento online do estado da obra e dos prazos de entrega.
Por outro lado, o site permite, de forma dinâmica, comunicar notícias e eventos relevantes para o setor, numa constante divulgação e valorização da marca de Contraste e da ourivesaria portuguesa, também a nível internacional, pelo que disponibilizamos uma versão do site em língua inglesa. Outro ponto forte é, por exemplo também, o motor de pesquisa das marcas de responsabilidade, uma ferramenta que permite a qualquer utilizador identificar o operador económico responsável pela introdução no mercado do artigo com metal precioso. Mas muitas outras novas funcionalidades estão em desenvolvimento, de forma contínua.
“Há, sem dúvida, uma aposta na internacionalização do setor, possível graças ao crescente reconhecimento internacional da ourivesaria e joalharia portuguesas (…)”
O setor da ourivesaria tem uma longa tradição em Portugal, mas certamente tem novos paradigmas. Quais são os eixos de modernização do setor?
Há, sem dúvida, uma aposta na internacionalização do setor, possível graças ao crescente reconhecimento internacional da ourivesaria e joalharia portuguesas, pela capacidade de aliar a tradição com a inovação no design e fabrico das peças. Esta notoriedade tem levado, nos últimos anos, a um aumento do volume de exportação do setor e a um reforço do seu posicionamento a nível global.
O setor foi afetado pela pandemia?
Não ficou imune ao impacto global de uma pandemia, desde logo pela imediata contração dos mercados, fecho de fronteiras, constrangimentos às viagens e às atividades económicas em geral. Enfim, não houve, praticamente, uma área de negócio que não se tenha ressentido com os desafios impostos pela pandemia. Contudo, e apesar de um menor volume de peças, verificamos um regresso muito significativo dos operadores económicos às Contrastarias. De momento, registamos que 89% dos operadores regressaram quando, em junho, apenas 55% o tinham feito e 77% em julho.
Antes de assumir a direção das Unidade de Contrastarias e de Fiscalização desempenhou outras funções no INCM. Que inovações trouxe aos setores por onde passou?
Na INCM criei e dirigi a Direção de Planeamento e Controlo de Gestão, área igualmente responsável pela evolução e eficácia do Sistema Integrado de Gestão. Neste âmbito em particular, realço o trabalho desenvolvido em equipa por todas as áreas envolvidas, as novas certificações conquistadas neste período, nomeadamente a da CQM (Card Quality Management) da MasterCard no âmbito do controlo de qualidade do processo de fabrico de cartões bancários, a do Sistema de Gestão de Segurança de Informação pela Norma ISO 27001 e a do Sistema de Gestão de Produção Gráfica de Segurança pela Norma ISO 14298.
Mais recentemente assumi, ainda, a Direção de Processos, Risco e Compliance com a missão de promover transversalmente práticas de gestão e operação alinhadas com referenciais e boas práticas reconhecidas internacionalmente e orientadas para a sustentabilidade e melhoria contínua suportada na reengenharia de processos e na filosofia Kaizen, garantindo o compliance e fomentando uma cultura de gestão e prevenção de riscos. Foi, aliás, ainda neste âmbito que iniciei o projeto de reengenharia do processo de ensaio e marcação nas Contrastarias, em parceria com o Kaizen Institute, que entra agora na fase de implementação das diversas oportunidades de melhoria identificadas. Estamos muito confiantes quanto à melhoria que daqui resulta, a vários níveis, para os nossos clientes.