Opinião

A força transformadora da integridade[1]

Eugénio Viassa Monteiro, professor da AESE-Business School*

Encontrei muitas pessoas que com a sua conduta profissional provaram que se pode atuar em moldes corretos e justos, quebrando tradições instaladas, em projetos que facilitam a vida dos cidadãos.

Mesmo antes de chegar a Delhi já tinha lido sobre o seu “Metro”: a limpeza, a preocupação em formar o povo a mover-se em ambiente limpo e cuidado, sem pontas de cigarro, sem cuspir onde apetece, sem ruídos de música, cedendo assentos reservados às pessoas idosas e necessitadas, etc.

E quando viajei nele, vi muito mais: a dupla segurança na plataforma de embarque e desembarque, o uso dos meios de pagamento eletrónico, apenas por aproximação do cartão magnético da registadora; frequentes chamadas de atenção para o correto comportamento dos utentes, etc. Tem hoje cerca de 400 kms de extensão, com ligação para os metros de Noida e de Gurgaon, duas cidades satélite de Delhi.

Ao findar a minha breve viagem, de cerca de 10 estações, fiquei com a convicção de que era o melhor meio de transporte para as grandes cidades da Índia: rápido, pontual, para multidões de pessoas, onde se viaja com conforto, na frescura do ar condicionado.

Depois, ao tentar saber a quem se devia a entrada dos conceitos de eficácia, boa educação e conforto, vi que no topo da organização do metro de Delhi estava o Eng. E. Sheedharan. Surpreendeu-me positivamente o fato de que tanto a 1.ª como a 2.ª fases do metro tivessem terminado cerca de 2,75 anos antes do prazo e dentro dos custos orçamentados, e tentei ver porque isso acontecia e quais eram os antecedentes profissionais de Shreedharan.

O Eng. Shreedharan
Formado em Engenharia Civil, na Índia, notabilizou-se, primeiro, quando trabalhando nos Railways, em dezembro de 1964, foi destacado para reconstruir a ponte Pamban Bridge, que liga a localidade de Rameswaram ao mainland Tamil Nadu, destruída por um tornado. Os Railways fixaram um prazo de seis meses; Shreedarhan reduziu-o para três meses e a ponte estava operacional em 46 dias! Ganhou, assim, experiência na gestão de projetos, com soluções inovadoras, sem comprometer a qualidade nem a segurança. Recebeu então o Railway Minister’s Award.

Em 1970, foi encarregue do projeto e do planeamento do Metro de Kolkota, dos Railways, o primeiro metro da Índia. Shreedharan fez o que se lhe pedia e, ao mesmo tempo, com a sua iniciativa, lançou as bases da moderna engenharia de infraestruturas, trabalhando nisso até ao ano 1975.

Trabalhou depois no Cochin Shipyard. A partir de 1979, ao ser nomeado seu Managing Director, o estaleiro lançou às águas o seu primeiro barco MV Rani Padmin.

Foi nomeado General Manager da Western Railways e ao reformar-se, em 1990 (aos 58 anos), foi convidado para ser o CMD-Chief Managing Director da Konkan Railways (K-R), a construir em regime BOT-Build, Operate and Transfer. Esta linha na parte Ocidental da Índia, de Mumbai até Kochi, atravessando Goa, situa-se na zona muito acidentada dos Gates e tem 93 túneis, num comprimento de 82 kms; mais de 150 pontes ao longo dos 760 kms de extensão da Konkan Railways. Completar essa complexa linha férrea, em sete anos, dentro dos prazos e orçamentos, foi considerado um feito notável.

Com o curriculum de vários sucessos, foi convidado para ser o MD-Managing Director do Delhi Metro Rail Corporation, pelo então Chief Minister, Sahib Singh Verma. Em 1997, todas as componentes do projeto estavam completadas, dentro dos prazos ou mesmo antes. A primeira fase do Metro (com três linhas) terminou em 2005, bem antes do prazo e dentro dos custos orçamentados.

Todos os que privaram com ele, reconhecem que “tinha a rara capacidade de isolar os projetos das pressões políticas e das influências, conseguindo compromissos para a execução rápida dos mesmos, antecipando-se aos prazos fixados”. Queria reformar-se em 2005, mas as suas responsabilidades foram mais uma vez ampliadas para completar a segunda fase do Metro. E saiu-se muito bem, tendo terminado esta 2.ª fase bem antes do prazo, em 2011!

Forte impacto teve e tem o Metro de Delhi, em toda a população indiana por ser um meio de transporte com todas as condições que o tornam indicado para as grandes cidades da Índia. E enquanto os trabalhos de ampliação do metro de Delhi continuavam, novos metros eram sucessivamente lançados, alguns dos quais já hoje parcialmente a funcionar e a ampliar a sua rede. Outros estão a arrancar.

O fenómeno do Metro de Delhi, com a rapidez de execução e os orçamentos cumpridos, criaram a certeza de que “sim, podemos” realizar obras de grande envergadura e elevados custos, sem cair nos intermináveis atrasos mal justificados com as expropriações, com forte encarecimento das obras, por intromissão de interesses particulares.

Tal só é possível com dirigentes competentes profissionalmente e íntegros. Cidade após cidade foi acalentando a ideia e o projeto do seu “metro”. Sheedharan foi consultor de vários dos Metros, que, entretanto, lançaram as suas obras, para lhes transmitir a sua experiência e marcar o ritmo do seu trabalho.

Hoje, as cidades com metro em funcionamento na Índia são:

Além disso, há outras 15 cidades que têm o seu metro em diferentes estádios de execução.

Impressiona como uma só pessoa pode alterar um panorama de ineficiências e corrupção. A competência e a determinação de proceder com inteireza e justiça têm força para se impor por si, com tremendo impacte na sociedade.

Em qualquer parte do mundo são os pobres quem mais sofre as consequências dos atrasos das obras de infraestruturas. Eles não dispõem de meios de mobilidade como merecem. Além disso, os atrasos injustificados desmobilizam os investidores pelo ambiente relaxado e corrupto que é visível, não se chegando a criar riqueza e o emprego desejados, tão necessários para os estratos sociais pobres que vivem do seu trabalho.

Bibliografia: – India’s Railway Man: A Biography of E. Sreedharan by Rajendra Aklekar; Wikipedia.
[1] A maior parte das ideias aqui expostas foram publicadas em inglês no diário O Herald, de Goa.

*Professor da AESE Business School (Portugal) e do I.I.M. Rohtak (Índia)

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